De acordo com Jesus Cristo, é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus.
Quem já tentou fazer um camelo passar pelo buraco de uma agulha tem a noção exata da dificuldade da tarefa, sobretudo se usou o mesmo método que se aplica às linhas, e que consiste em umedecer-lhes a ponta. Umedecer a cabeça de um camelo exige alguma coragem, muita salivação e um bom elixir oral.
Cirilo de Alexandria acreditava que as palavras do Messias tinham sido mal reproduzidas. Em grego, o vocábulo que designa camelo (kamelos) é muito parecido com o que designa corda (kamilos), e quem registrou as declarações do Senhor pode ter feito confusão (já se sabe como são os jornalistas).
Uma vez que uma corda também não passa facilmente pelo buraco de uma agulha, os ricos foram forçados a engendrar uma estratégia para entrar no reino dos céus, a saber: não possuir quaisquer bens em seu nome. O rico moderno tem menos bens em seu nome do que são Francisco de Assis. A questão, portanto, não é tanto a de saber para onde vão os ricos quando desaparecem. O que deve ocupar os teólogos é descobrir para onde vão os bens deles quando desaparecem.
Os bens de Gérard Depardieu, ao que parece, foram para a Rússia. Sempre que Depardieu aparece nas notícias, recordo-me que o mundo tem zoado de mim. Todos os dias faz piruetas impossíveis, sem outra justificação que não seja obrigar-me a dizer, como um octogenário, "no meu tempo isto não era assim".
A última dessas cabriolas foi esta: neste momento, o regime político que as pessoas ricas preferem é o da Rússia. No meu tempo isto não era assim. Gérard Depardieu, francês, ator, milionário e reputado bêbado urinador no chão de aviões, pediu a cidadania russa para pagar menos impostos. E obteve-a porque, ao passo que no meu tempo a Rússia achava que o Ocidente era demasiado capitalista, agora acha que não o é suficientemente.
No meu tempo, os russos queriam sair para o Ocidente. Agora, os ocidentais querem entrar na Rússia. Alguém substituiu a cortina de ferro por aquela cortina que, nos aviões, separa o pé-rapado da primeira classe. E foi rapidíssimo. A nova casa de Depardieu é na Sibéria. O que antigamente era um inferno, agora é um paraíso. Fiscal.
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