Ricardo Araújo Pereira

Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

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Ricardo Araújo Pereira

Jogadores de futebol que empobrecem a ditadura saudita são ativistas

Se a África do Sul descobrir petróleo, até pode reativar o apartheid e ainda sonhar com um campeonato cheio de estrelas

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Há uns anos, uma marca de equipamento esportivo fez um comercial em que alguns dos melhores e mais famosos futebolistas do mundo iam jogar uma partida no inferno.

Uns demônios monstruosos queriam destruir o futebol, e pensavam que um bom método para atingir esse objetivo era matando aqueles jogadores.

Primeiro, os demônios cometeram faltas assassinas, mas, depois, os jogadores, valendo-se de seu talento, conseguiram derrotar o mal.

Na última jogada, um dos jogadores chuta com tanta força que a bola perfura o peito do demônio goleiro, e ele explode.

Hoje, a marca podia fazer um comercial ligeiramente diferente. Alguns dos melhores e mais famosos jogadores do mundo iam jogar uma partida no inferno. Aí, o chefe dos demônios monstruosos diria: "Se eu vos pagar 200 milhões de euros por ano, vocês passariam a jogar aqui?" E alguns dos melhores e mais famosos jogadores do mundo diriam que sim.

Seria um comercial bastante mais curto e ligeiramente menos inspirador. Na Arábia Saudita, discriminam as mulheres, executam os homossexuais, cortam os jornalistas à julienne, os imigrantes trabalham em regime de semi-escravatura, entre outros costumes encantadores.

No desenho de Luiza Pannunzio, um homem branco com vestimentas sauditas segura uma camiseta de time de futebol amarela com mangas azuis e mostra nas costas o nome Ronaldo e número 7. No pé direito ele segura uma bola de futebol no chão. Ao lado dessa figura há a pergunta "QUANTO VALE O SHOW?".
Ilustração de Luiza Pannunzio para coluna de Ricardo Araújo Pereira de 15 de julho de 2023 - Luiza Pannunzio

É, sem dúvida nenhuma, o inferno. Mas os jogadores procuram, e encontram, o paraíso fiscal. Compreende-se: depois de toda uma carreira a contar os tostões, para ver se o salário chegava até ao fim do mês, deve fazer bem poder finalmente ganhar umas justas centenas de milhões isentas de impostos.

Deve ser por isso que os jogadores que vão para a Arábia não sentem estar a contribuir para o regime iníquo que oprime o povo saudita. Quem não paga um euro de impostos, de fato, não contribui para nada.

Na verdade, os jogadores são ativistas, já que vão empobrecer a ditadura saudita confiscando-lhe milhões e milhões de euros.

Fica claro que, se a África do Sul descobrir petróleo, até pode reativar o apartheid e mesmo assim sonhar com um campeonato competitivo e cheio de estrelas.

Um facínora sem poços de petróleo é um facínora; um facínora com poços de petróleo é um estadista que procura desenvolver o país e criar uma das melhores ligas do mundo.

Ao contrário do álcool, o petróleo é um líquido que não precisa de ser ingerido para fazer as pessoas alucinarem.

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