Rômulo Saraiva

Advogado especialista em Previdência Social, é professor, autor do livro Fraude nos Fundos de Pensão e mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP.

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Rômulo Saraiva
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O funcionário do INSS pensa que você é o inimigo dele

É preciso ter cuidado para que essa má vontade não gere prejuízo

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Recife

Dentro da mesma agência da Previdência Social, existem realidades díspares no atendimento ao segurado. O mesmo ambiente comporta oscilações de tratamento por parte do servidor público que podem variar entre o céu e o inferno. Não há padronização na gestão de atendimento ao cliente nas mais de 1.500 agências do INSS espalhadas pelo país. Ou mesmo zelo da administração pública em demitir os desidiosos.

Apesar da quantidade significativa de servidores vocacionados ao cargo público que ostentam, existem outros que muitas vezes tratam o segurado como espécie de inimigo ou impostor, achando que ele está ali para provocar prejuízo aos cofres públicos, ainda que no seu exercício regular do direito.

É preciso ter cuidado para que essa má vontade não gere prejuízo. Os médicos, assistentes sociais, técnicos ou analistas do seguro social estão investidos de um cargo público federal que goza de boa reputação. E a maioria faz por merecer. Afinal, seus atos administrativos possuem fé pública. Via de regra, a palavra deles vale mais e tem credibilidade. Não é por outra razão que muitos segurados acreditam piamente nas informações prestadas oficialmente, dispensando a segunda opinião, por mais arriscado que isso seja.

Com uma demanda de atendimentos formada por pessoas dos mais variáveis perfis, principalmente analfabetos ou letrados sem conhecimento previdenciário, a insatisfação pessoal e/ou profissional do servidor público —marcada por seu descontentamento— pode influenciar negativamente o segurado, que tem razão, em se sentir desmotivado para seguir em frente. Nem sempre a orientação institucional reflete a viabilidade do direito, tendo em vista que muitas posições administrativas são antagônicas ao que pensa o Poder Judiciário.

Prédio da Previdência Social em Brasília
Prédio da Previdência Social em Brasília - Antonio Molina - 4.jan.2022/Folhapress

Além desse dualismo de posicionamentos, não se pode negar a má vontade enraizada no dia a dia de alguns servidores no atendimento ao grande público. É paradoxal, pois o servidor está ali justamente para servir. Não é culpa do segurado se faltam condições adequadas de trabalho, política salarial razoável ou mesmo a contratação de mais capital humano para absorver tanto trabalho.

Na impossibilidade de separar essa realidade de quem está do outro lado do balcão, com o trabalhador que precisa de um atendimento didático, preciso e objetivo, percebe-se o malgrado de alguns servidores na execução desse mister. Criar dificuldade ou burocratizar o atendimento. Tratar com indiferença achando que o segurado não tem o menor direito, circunstância que ele praticamente se assemelha a um juiz proferindo uma sentença sumária, sem chance de recurso, caso o segurado de fato acredite nele e se conforme com a decisão. A falta de paciência na orientação também é outro problema, seja para orientar quais documentos devem ser juntados ou explicar a melhor hora para se aposentar.

Embora a Previdência Social compartilhe raciocínio semelhante à lógica de um seguro de automóvel, no qual é preciso pagar antes para estar protegido na hipótese de sinistro, o trabalhador também precisa de requisitos, como ter carência, estar vinculado ao sistema e contribuindo para poder receber algum benefício. A Previdência é um seguro social, com prévia fonte de custeio. O fato é que, existindo ou não direito, é obrigação do servidor público atender com presteza e urbanidade o público em geral, além de dever ser leal e agir com legalidade na sua tarefa.

A lei n. 8.027/90 dispõe sobre normas de conduta dos servidores públicos civis da União. Caso o segurado se sinta ofendido no atendimento recebido, pode registrar denúncia ou reclamações na Ouvidoria Previdenciária (no site falabr.cgu.gov.br), como também realizar sugestões, elogios, denúncias ou outras solicitações sobre os serviços prestados.

É possível, a depender da gravidade do acontecimento, instaurar um processo administrativo disciplinar (PAD) para apurar infrações funcionais e aplicar penalidades cabíveis aos agentes públicos. Fique atento para não sofrer mau atendimento ou, pior, deixar que isso atrapalhe de você receber o que tem direito.

O que dizem os representantes dos servidores

Procurada, a diretoria colegiada da Fenasps (Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social) afirmou que o INSS passa por "desmonte intenso nos últimos anos, com insuficiência de servidores, redução de orçamento para manutenção das agências, alterações na forma de atendimento com a ampliação de plataformas digitais, alterações nos processos de trabalho e imposição de metas abusivas de produtividade aos servidores".

"A falta de servidores nas unidades é um fator crucial, nos últimos anos o INSS perdeu cerca de 23 mil servidores, principalmente com aposentadorias, atualmente contam com cerca de 19.500 servidores, ou seja, houve redução de mais de 50% do quantitativo", informa a nota da entidade, que defende a realização de concurso público e atendimento presencial nas agências, especialmente para a população que não tem acesso a tecnologias.

"É evidente que com esse quadro de insuficiência de servidores, é impossível atender toda a população que busca as unidades do INSS, resultando na maior fila virtual da história do INSS de benefícios aguardando análise, atualmente mais de 2 milhões de trabalhadores (as) aguardam a análise de seus benefícios, além da restrição do atendimento à população."

A ANMP (Associação Nacional de Médicos Peritos) afirmou que não se pode rotular a grande maioria dos servidores públicos federais vinculados à Previdência a partir de experiências pontuais.

"A quase totalidade dos servidores é vocacionada para o exercício de suas funções, fato comprovado pela persistência em se manter no cargo mesmo diante do sucateamento dos seus locais de trabalho, por exemplo", afirma.

Segundo a entidade, ao avaliar queixas pontuais, é possível verificar que cidadãos insatisfeitos com o atendimento são os que tiveram seus benefícios indeferidos. "Para que o direito de milhões seja garantido, é necessário que o controle do gasto ocorra a partir da avaliação criteriosa de todos, dentre os quais vários terão suas expectativas frustradas."

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