Rômulo Saraiva

Advogado especialista em Previdência Social, é professor, autor do livro Fraude nos Fundos de Pensão e mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP.

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Descrição de chapéu Folhajus inss

Xandão amoleceu o coração na revisão da vida toda

Moraes cede a pedido que não tem amparo legal de suspender processos sobre tema em todo Brasil

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Conhecido por seu ímpeto em proferir decisões às vezes esbanjando poder, o ministro Alexandre de Moraes desde que integrou o Supremo Tribunal Federal se envolveu em alguns casos polêmicos. Sua caneta tem assinado determinações de prisões efêmeras, multas, silenciado opiniões, afastado governadores e moldado a liberdade de expressão.

Na área previdenciária, surpreendeu o país em ser o fiel da balança na revisão da vida toda. Uma vez praticamente sacramentada, Xandão –apelido do ministro– amoleceu o coração e cedeu às artimanhas jurídicas do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) em procrastinar sua efetivação.

O ministro Alexandre de Moraes - Pedro Ladeira - 30.jun.2023/Folhapress

Depois de ter ficado no vácuo pelo INSS, quando determinou que a autarquia definisse em dez dias quando começaria a pagar a revisão da vida toda, Moraes além de ter ficado sem resposta sobre o início do calendário de pagamento também não tomou medida mais enérgica, contrariando seu estilo. E olha que o INSS tem se excedido em suas manifestações na instância superior, quando apresentou o argumento econômico com valores exageradamente inflados, que oscilaram em curto espaço de tempo de R$ 46,4 bilhões para R$ 360 bilhões, meio que subestimando o bom-senso e a inteligência alheia.

De toda estrutura da administração pública federal, se tem um órgão que é bom em delongar processos judiciais é o INSS. Afinal, quase metade de todos os processos na Justiça Federal são de natureza previdenciária. Proporcionalmente, o Instituto se depara com maior volume de cobranças, sendo mais frequentes nas evasivas.

Mesmo em casos apaziguados na Justiça, historicamente o INSS tem usado da criatividade para recorrer e adiar o pagamento. Na revisão da vida toda, não é diferente. O que surpreendeu foi o fato de o Xandão ter abrandado diante dessa situação.

Em março, Moraes reconheceu a relevância dos argumentos do INSS quanto às atuais dificuldades operacionais e técnicas para a implantação da revisão dos benefícios. Agora ele acatou o pedido do INSS para determinar a suspensão de todos os processos que versem sobre a matéria julgada no Tema 1102, até a data da publicação da ata de julgamento dos Embargos de Declaração opostos pela autarquia. O julgamento está previsto para a Sessão Virtual do Plenário de 11 a 21 de agosto de 2023.

O que adianta suspender os processos até o fim de agosto? Os problemas operacionais de décadas do INSS vão desaparecer e finalmente o caminho de pagar rapidamente a revisão da vida toda será achado?

Os embargos de declaração, sem efeito suspensivo, é o nome do recurso usado pelo INSS com o fim de aclarar alguns pontos, acaso o Judiciário entenda que a primeira decisão mereça aperfeiçoamento. Ocorre que este último pedido de suspensão não tem embasamento legal, pois a justificativa do INSS não tem previsão na norma processual. Portanto, Xandão foi benevolente com o Instituto em travar no país os demais processos de revisão da vida toda.

Cabe salientar que, uma vez superado os embargos de declaração, ainda se admite recurso no STF. Assim, nada impediria que o Instituto utilize outro recurso e resgate os mesmos argumentos de dificuldade operacional e novo pedido de suspensão processual.

O Judiciário precisa perceber que o INSS não está feliz em ter sido derrotado na revisão da vida toda nem tampouco animado em efetivá-la. Sutilmente, o que puder ser feito para adiar esta grande revisão será usado pelo Instituto.

Nas últimas grandes revisões previdenciárias que tiveram o aval do Supremo (revisão do teto e revisão do art. 29), foi necessária uma ação civil pública na Justiça para compelir que a autarquia aplicasse o direito e o pagamento.

Afinal, não é mentira que a estrutura operacional do INSS anda ruim. Pelo contrário, faz tempo que ela padece de grandes dificuldades. Mas não será a superveniente necessidade de aplicar a revisão da vida toda que vai resolver os problemas estruturais e históricos do INSS. Mesmo sendo obrigado a pagar a revisão da vida toda, o Instituto continuará com os antigos problemas estruturais.

Acostumados com a forma Alexandre de Moraes de resolver as coisas, com seu jeito polêmico e nada parcimonioso, os aposentados do país devem estranhar a versão paz e amor que arrebata Xandão em matéria de direito social. Lá no fundo, se esperava que Moraes pressionasse o INSS na mesma velocidade que ele faz para, por exemplo, determinar uma prisão ou determinar uma busca e apreensão.

Sem rompante e sem firmeza, Moraes cede a um pedido que não tem amparo legal de suspender as tramitações judiciais em todo o Brasil. Na revisão da vida toda, o Xandão virou Xandinho. Amoleceu o coração e terminou dando espaço para as firulas processuais da autarquia. Espera-se que tenham novos adiamentos. A propósito, há milhares de pessoas ávidas em sentir o gosto e as consequências financeiras do que o Supremo decidiu recentemente sobre o assunto.

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