Rômulo Saraiva

Advogado especialista em Previdência Social, é professor, autor do livro Fraude nos Fundos de Pensão e mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP.

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Julgamento do fator previdenciário completa 25 anos no STF

É inconcebível que uma corte leve esse tempo para julgar um caso dessa magnitude

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No segundo mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, foi criada em 1999 a regra do fator previdenciário. A lei 9.876, de 26 de novembro, foi preparada para desestimular aposentadoria precoce, já que até então não se levava em conta o requisito etário como variável ou condicionante da aposentadoria por tempo de contribuição. Um mês após ser publicada no Diário Oficial da União, não tardou para ser protocolado no Supremo Tribunal Federal pedido de inconstitucionalidade da regra. De lá para cá, diversos presidentes da República governaram o país. Este ano completa 25 anos que o caso ainda aguarda uma solução em definitivo pela corte. O relator do caso, ministro Nunes Marques, incluiu o caso para ser julgado.

A fórmula matemática foi por gerações o terror de muitos aposentados. Ou melhor, ainda é, pois milhares deles tiveram referida regra cristalizada no cálculo de seus benefícios, principalmente aqueles que completaram mais de dez anos na condição de aposentado e agora terão que conviver com o fator previdenciário até o fim dos seus dias, pois não podem mais reclamar na Justiça a exclusão desse cálculo como redutor de renda.

A regra é maquiavélica, pois parte da premissa de que quanto mais tempo for a longevidade do aposentado menor será a renda a ser paga pelo Instituto Nacional do Seguro Social. Seria uma espécie de punição ou de castigo pelo simples fato de o aposentado viver mais. Como o INSS não possui uma bola de cristal para saber quando cada um vai morrer, o caminho encontrado para estabelecer a longevidade foi a expectativa de vida do IBGE, método que até hoje é controverso e falho.

São vários os motivos da falibilidade do método do IBGE. O primeiro deles é que a expectativa de vida do homem é diferente da expectativa da mulher. O homem costuma morrer mais cedo. Mas para o INSS isso é irrelevante. Na norma contestada, a expectativa de vida do homem e da mulher é somada e dividida por dois. Simples assim. Quem se prejudica são os homens, pois eles costumam viver menos, mas têm o cálculo da longevidade elevado ao serem atrelados à realidade das mulheres. Em segundo lugar, o IBGE demora a realizar o censo da população brasileira e assim alimentar os dados estatísticos, o que torna as tábuas de mortalidade defasadas e inconsistentes.

A esse respeito, o próprio IBGE já veio a público admitir que a metodologia adota por ele não conseguiu registrar todos os óbitos do primeiro ano da pandemia de Covid-19 e o impacto dessas mortes na expectativa de vida dos brasileiros. Em outras palavras, os aposentados estão fadados a terem suas rendas reduzidas, mesmo existindo indícios de que a metodologia do IBGE tem várias falhas.

Alheio a tudo isso, os ministros do STF vêm entendendo que a norma deve continuar a ser aplicada aos aposentados, pois esta não seria inconstitucional. Já são 25 anos que esse caso vem se arrastando nas prateleiras virtuais do Supremo. A tramitação do caso sofre períodos de hibernação, logo depois de a corte analisar o caso e haver interposição de algum recurso, quando o processo volta a ficar parado por longa temporada.

Mesmo que atualmente a maioria dos ministros se retratassem no entendimento dominante que vem sendo aplicado, e o caso se revertesse radicalmente a favor dos aposentados, eventual decisão positiva agora teria um alcance muito pequeno. Milhares de segurados que tiveram suas rendas achatadas em até 50%, ou mais, em virtude do fator previdenciário não poderiam ter acesso agora à eventual decisão positiva do STF, pelo fato de já terem morrido ou escoado o prazo de dez anos da revisão previdenciária.

Quem se aposentou nos últimos dez anos com a regra do fator previdenciário é quem poderia reclamar algo. Já quem se aposentou de 1999 a 2014, nada mais pode fazer. Em se tratando de direito fundamental, é inconcebível que uma corte constitucional leve 25 anos para julgar um caso dessa magnitude de forma definitiva. Embora tenham existido recursos, há hiatos temporais de processo totalmente inativo no Supremo.

Como dizia o jurista e polímata brasileiro Rui Barbosa, a "justiça tardia nada mais é do que injustiça institucionalizada". Neste caso do julgamento do fator previdenciário, se o STF julgasse o caso de forma favorável aos aposentados, seria uma decisão que seria comemorada por alguns. Tantos outros só iriam se contentar em perceber que tiveram um cálculo estatístico do IBGE usado de forma equivocada em sua aposentadoria e nada mais poderiam fazer a respeito. Só lamentar a demora do STF.

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