Samuel Pessôa

Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP.

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Samuel Pessôa
Descrição de chapéu BNDES

Desenvolvimento, fenômeno microeconômico

Se os incentivos não estiverem corretos, a política não funcionará

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O evento econômico mais impactante no século 20 foi a Grande Depressão. Por anos a economia americana conviveu com taxas de desemprego maiores do que 20%.

Em 1936, Keynes revolucionou a economia. Criou um novo campo, a macroeconomia, e estabeleceu as políticas que tirariam as economias daquele equilíbrio ruim. Bastavam políticas fiscal e monetária expansionistas. Solução bem simples.

Como escreveu Krugman no prefácio da edição comemorativa aos 70 anos da publicação da Teoria Geral, a obra magna de Keynes, "Keynes estava certo sobre o problema de sua época: a economia mundial apesentava problema no seu alternador, e tudo o que era necessário fazer para a economia funcionar novamente era um conserto surpreendentemente simples".

Keynes se deparou com talvez o único problema complexo em ciência social que tinha uma solução simples.

Logo do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento) - Sergio Moraes - 8.jan.2019/Reuters

O sucesso do pensamento keynesiano foi tão avassalador que, ao longo de décadas, desde o pós-guerra até os anos 1980, a academia procurou soluções "keynesianas" –isto é, uma correção técnica e delimitada– para o problema do subdesenvolvimento.

O diagnóstico era que o subdesenvolvimento, assim como o equilíbrio de uma economia com desemprego aberto, era fruto de uma falha de mercado muito aguda, associada a um grave problema de coordenação. Em geral, algo faltava e o planejamento econômico tinha que prover este algo.

O primeiro candidato foi o capital físico. Por décadas o Banco Mundial calibrava seu programa de ajuda para o desenvolvimento das economias mais pobres a partir da quantidade de capital requerida para atingir uma meta de crescimento econômico. O banco ofertava o capital. A longa experiência é que o crescimento nunca vinha. Em geral virava corrupção e guerra.

Tentou-se com educação e o problema neste caso é que colocar criança na escola não é garantia de aprendizado, como sabemos muito bem. E assim sucessivamente. Algo faltava. Vamos ofertar. Ofertava-se e o resultado não aparecia. Esta história é bem contada por William Easterly em "O espetáculo do crescimento", de 2004.

A partir dos anos 1980, muito influenciada pelo novo institucionalismo, liderado pelo historiador Douglass North, a academia passou a enxergar o desenvolvimento essencialmente como um problema de governança, isto é, um problema de alinhamentos de incentivos.

Infelizmente, esse aprendizado não tem chegado por aqui. No ciclo petista passado, o diagnóstico foi de que subdesenvolvimento era falta de coisas. Não temos uma indústria naval? Tome BNDES e subsídio para construir uma indústria naval. Ninguém se pergunta os motivos de não termos uma indústria naval e o que fazer para termos uma indústria naval sustentável.

Aparentemente, o novo governo vai pelo mesmo caminho. As palavras mágicas passaram a ser os setores de transição energética e da indústria ligada à saúde, em função da experiência recente com a pandemia, entre outros itens.

Tudo sugere, portanto, que o diagnóstico é de que os erros do ciclo anterior foram essencialmente de foco. Priorizaram-se os setores errados. Não se pergunta se a governança das políticas adotadas estava correta.

Se os incentivos não estiverem corretos, independentemente de se priorizar este ou aquele setor, a política não funcionará. O sucesso da política depende de o foco estar correto e de o desenho microeconômico alinhar incentivos privados com os sociais.

Nada indica que houve esse aprendizado. Voltaremos a apertar os botões do ativismo desenvolvimentista e a desperdiçar escassos recursos públicos.

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