Muitos mercados de produtos e serviços são caracterizados pela baixa competição no Brasil. Uma razão para isso está na imposição de barreiras e tarifas alfandegárias à importação de produtos que possam servir de substitutos aos fabricados internamente. No setor de serviços, sobretudo aqueles que não são comercializáveis com o exterior, um dos motivos para a baixa competição está no aparato regulatório brasileiro.
Tome como exemplo o setor de transporte rodoviário interestadual. O setor é regulado pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres). O transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros (TRIIP) enfrenta limitações ao aumento da competição por meio de uma série de súmulas e portarias da ANTT, mesmo após a Lei 12.996 de 2014 que abriu o setor.
Nas últimas semanas, tem-se assistido a diversas mudanças infralegais, projetos de decretos legislativos e liminares judiciais afetando diretamente o bem-estar dos consumidores. Ônibus de empresas de transporte privado têm sido apreendidos como se fossem piratas ou clandestinos, com seus passageiros sendo desembarcados no meio da estrada.
Empresas no setor podem operar de duas formas. Há o transporte público, altamente regulado, com uma série de requerimentos como número de viagens mínimas entre uma origem e um destino; saídas e chegadas apenas em terminais rodoviários, os quais devem contar com pontos físicos de venda; exigência de gratuidade para público elegível; requerimentos de capital etc. Exatamente por essas restrições de porte e custo fixo, são empresas grandes, com fatias relevantes de mercado.
A outra modalidade é o transporte privado, efetuado pelas empresas de fretamento, tipicamente bem menores do que as de transporte público. Independente da modalidade de transporte, público ou privado, as empresas passam por um processo de autorização para operação minucioso pela ANTT, com ênfase nos requerimentos de segurança rodoviária.
Um dos requisitos para operação dos ônibus fretados é o chamado ‘circuito fechado’, que obriga que cada viagem feita de uma origem para um destino só ocorra se os mesmos passageiros voltarem do destino para a origem naquele mesmo ônibus. Empresas que operam no transporte público não estão, obviamente, sujeitas a essa restrição.
As apreensões recentes são de ônibus de empresas autorizadas pela ANTT a fazer o transporte privado de passageiros em viagens em que a regra do ‘circuito fechado’ era violada. Tem-se punido essas empresas como se elas, previamente autorizadas e reguladas nos quesitos de segurança rodoviária, fossem de transporte clandestino. Algumas empresas têm perdido autorização de operar na sequência dessas apreensões.
Com a entrada de aplicativos que facilitam a formação de grupos de passageiros com as empresas de transporte privado, aumentou-se muito o número de viagens por essa modalidade. Uma razão foi a redução do custo da viagem via utilização de frota ociosa, algo que foi impulsionado pelo fracionamento do frete entre os passageiros do grupo de viagem.
Enquanto autarquias federais, congresso e judiciário decidem se consumidores terão suas opções de escolha ampliadas ou reduzidas, abandonamos a oportunidade de avançarmos numa agenda regulatória moderna. Aplicativos que fazem ‘match’ entre consumidores e prestadores de serviço, sejam eles empresas de transporte, restaurantes, motoristas ou entregadores, entraram de maneira definitiva nos grandes centros urbanos após a expansão da cobertura e da qualidade de internet móvel. Criar barreiras artificiais para proteger empresas incumbentes apenas adiará uma já urgente nova agenda regulatória.
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