Silvana Krause

É professora e pesquisadora de pós-graduação em ciência política na UFRGS; ex-bolsista da Fundação Konrad Adenauer

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Silvana Krause
Descrição de chapéu Eleições 2018

O gelo da política e a fúria do eleitor

As maiores legendas foram alimentar-se nas corporações e no Estado

O tempo de “fast e delivery politics” (política rápida e de pronta entrega) trará surpresas? Ou vem aquilo que já se provou? A pergunta tem respostas múltiplas, a depender do paladar do eleitor à procura de seu candidato e das ofertas que estão sendo apresentadas.

A porteira de entrada à aventura política parece estar fechada. A antipolítica e a “business politics” (política de negócios), ao que tudo indica, não alcançaram as metas desejadas. É tudo “flash” e se desintegra.

Aquilo que valeu na eleição municipal de 2016, quando os empreendedores da política lograram sucesso em importantes capitais, parece não estar dando certo para a presidencial. Os resultados das convenções partidárias demonstram que as numerosas opções do cardápio não trazem iniciantes da política com chances de sucesso eleitoral.

O eleitor brasileiro foi seduzido para investir em novos experimentos de candidaturas outsiders. O aborto destes ensaios redundou em um cenário em que todos os principais candidatos competitivos têm alto índice de rejeição.

Da parte do eleitor, não haveria receio em ser infiel, pois é poligâmico e a tradição do seu voto não é por identidades partidárias. Também há pouca punição, dado que ele esquece em quem votou. Aliás, a poligamia do eleitor corresponde à poligamia do político.

O que então explica o cenário de apartheid entre o eleitor, as opções ofertadas e o estrangulamento de candidaturas outsiders? O fator Lula, com o imbróglio jurídico, deve ser considerado para entender parte do descolamento.

Recente pesquisa de intenção de voto estimulada (XP Investimentos —13 a 15/8) aponta que, com sua ausência na disputa, há 24% de não voto (branco/nulo/nenhum). Com sua presença, diminui para 13%. No entanto, é preciso descortinar outra variável para o entendimento do que estamos presenciando.

Se por um lado, 2% do eleitorado confia muito nos partidos (Datafolha junho/18), por outro, não há dúvidas sobre a capacidade de metamorfose e sobrevivência das legendas consolidadas. Há longa data, elas foram buscar outra freguesia para sobreviver ao terremoto de um eleitor que se apresenta multifacetado, “traidor” e com demandas inconciliáveis.

As maiores legendas foram alimentar-se nas corporações e no Estado. A proibição de empresas financiarem ensejou personalidades milionárias investidoras em candidaturas. Por sua vez, o padrão dos pequenos partidos é abrigar-se no manto das legendas-mães —são coadjuvantes em um sistema cartelizado.

Não é preciso ir longe para diagnosticar a dinâmica de funcionamento de baixa competição nas ofertas. O efeito do novo fundo eleitoral reforça isto. A estratégia de alianças do PSDB garantiu quase a metade do bolo.

Somando as fatias de PT e MDB, sobram apenas 22% para os dez competidores restantes. O tempo de propaganda eleitoral segue o mesmo padrão. Em um ambiente hostil, o Estado é garantia, e o peso dos votos não é a única fonte para fazer parte do cartel.

Na hipótese de um semioutsider, uma pequena legenda vencer a eleição, o que pode acontecer? O cenário partidário cartelizado tende a permanecer. Os partidos consolidados irão orbitar na sustentação do novo governo ou na liderança da oposição.

O eleito terá de formar governo. O presidencialismo de coalizão contribuiu para congelar o sistema partidário no Brasil? Na Itália a Operação Mãos Limpas descongelou o sistema partidário, porém Berlusconi não limpou o país. Aqui, nem o jato da Lava Jato descongelou o gelo da política. O resultado será melhor?

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