Solange Srour

Diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management.

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Descrição de chapéu juros inflação

Quão sustentável é a melhora do fiscal?

Supor que a retomada da economia e a inflação aliviam o problema fiscal é contraproducente

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O cenário fiscal deste ano parece estar melhor do que se imaginava. De um lado, a recuperação mais forte da economia gera maior arrecadação e melhora as estimativas para o déficit primário deste ano. De outro, a alta da inflação, principalmente o elevadíssimo valor do IGP-M, tem aumentado a projeção do deflator do PIB, reduzindo as projeções para a relação dívida/PIB.

De fato, fechar este ano com um déficit primário menor diminui o ajuste fiscal necessário para atingirmos a sustentabilidade fiscal. No entanto, duas perguntas são relevantes: quanto dessa recuperação pode ser extrapolada para os anos seguintes? Quão dependentes estamos do crescimento da receita, dado o contínuo aumento de despesas obrigatórias em relação ao PIB?

A melhora da arrecadação está relacionada à maior mobilidade e à alta do preço das exportações e de alguns itens com alta carga tributária. Há muita incerteza sobre quanto dessa recuperação persistirá: os impactos da terceira onda, o risco de restrições no fornecimento de energia elétrica e a alta da inflação e dos juros, além da insegurança política e eleitoral.

Do lado do gasto, há pouco para comemorar. O teto de gastos tem sido mantido à custa de uma queda significativa das despesas discricionárias. Estas caíram, entre 2016 e o último dado de abril, de 2,3% do PIB para 1,3% do PIB.

Já a despesa obrigatória continua crescendo acima da inflação. Entre 2017 e 2019, esta cresceu a um ritmo de 1,2% em termos reais. Antes do teto, entre 2010 e 2016, essa taxa era de 5,3%! Após dois anos da reforma da Previdência, a discussão da administrativa no Congresso começa a dar sinais de que sua eventual aprovação pode ser pior do que seu adiamento.

As despesas com benefícios sociais (principalmente BPC, abono salarial e seguro-desemprego) permanecem intocáveis. O salário mínimo que reajusta tais despesas tem sido contido pelo atual governo, mas até quando isso será possível?

Para piorar, a pandemia escancarou o fato de que o país não consegue fazer política fiscal contracíclica: uma vez iniciada, é muito difícil interrompê-la. É verdade que a segunda rodada do auxílio emergencial foi bem menor do que a primeira. No entanto, não faltam pressões políticas pelo simples aumento do gasto social sem uma revisão da eficácia dos programas já existentes.

Em relação à discussão sobre o deflator do PIB, está claro que uma menor relação dívida/PIB acarreta uma melhor perspectiva de sustentabilidade. Um ponto de partida mais favorável sempre faz diferença. Mas dá frio na espinha saber que estamos fazendo ajuste via inflação, imposto regressivo e punitivo aos poupadores que aceitam financiar o governo.

É comum haver discussões sobre a suposta capacidade do Banco Central de aliviar os indicadores fiscais. Recentemente foram criados os depósitos voluntários, em substituição às operações compromissadas, o que diminuirá a dívida bruta. No entanto, a dívida líquida ficará inalterada, e os depósitos voluntários devem também ser remunerados pela taxa Selic, ou seja, não haverá melhora fiscal.

A possibilidade de compras de títulos públicos é outra situação que pode ser falaciosa. Se o BC atuar dessa forma em momentos de estresse, será porque o risco-país subiu, uma forma de repressão financeira que impede que os juros reflitam o prêmio demandado pelos investidores.

Mesmo que a dívida encerre este ano próxima a 80% do PIB, ainda será excessivamente alta e suscetível ao risco de descontrole em cenários menos favoráveis. Sua gradativa redução irá requerer um esforço fiscal que, a depender dos parâmetros de juros e crescimento do PIB, se iniciaria entre 2,5% e 3,0% do PIB.

Supor que a recuperação da economia e a alta da inflação aliviam o problema fiscal, para além do curtíssimo prazo, é contraproducente. É nesse ambiente que a economia política da gestão fiscal prospera em incentivar a expansão da despesa e do déficit. A discussão de 2022, depois de nove anos consecutivos de déficit primário, será sobre o afrouxamento das regras fiscais, em vez do reforço do teto de gastos.

Sob o argumento de que a situação fiscal hoje não é tão ruim assim, colocaremos de lado a urgência da redução do crescimento das despesas obrigatórias —condição necessária, mas não suficiente, para que o país finalmente cresça de forma mais sustentável.

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