Solange Srour

Diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management.

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Descrição de chapéu América Latina copom juros

O Fed irá nos salvar?

Não se espera que a redução nos juros nos EUA dê um 'anabolizante' para os emergentes adiarem seus ajustes

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A perspectiva de um pouso suave nos EUA —que parece imune às expectativas de manutenção de uma política monetária restritiva— tem impulsionado diversos ativos de risco pelo mundo. Até pouco tempo atrás, esse cenário também era favorável aos países emergentes, ainda que impondo restrições à queda de juros em curso em várias dessas economias.

No entanto, nos últimos dois meses, começamos a ver uma forte deterioração dos ativos financeiros brasileiros, movimento que também foi visto em alguns países nos quais a incerteza quanto aos rumos da economia aumentou. Desde a mudança da meta de resultado primário dos próximos anos e do resultado dividido do Copom (Comitê de Política Monetária), o real apresentou uma desvalorização expressiva, a saída de capital estrangeiro da B3 ultrapassou R$ 10 bilhões e as expectativas de inflação de 2025 e 2026 descolaram mais ainda da meta. As taxas pagas pelos títulos soberanos subiram cerca de 1,2 ponto percentual nos títulos prefixados e 0,4 ponto nos indexados à inflação.

Jerome Powell, presidente do Fed, fala à imprensa após a reunião do Comitê de Política Monetária - Brendan Smialowski/AFP

Há algum tempo, venho destacando neste espaço os fatores que podem nos afetar negativamente, como a perda de credibilidade do arcabouço fiscal, o crescimento acentuado das despesas obrigatórias, o aumento da intervenção estatal em empresas públicas e privadas, a insegurança jurídica crescente e até a deterioração da confiança no Banco Central.

Nas últimas semanas, os resultados de duas eleições, no México e na Índia, evidenciaram como o humor dos investidores está bem suscetível às perspectivas de reformas e da estabilidade macroeconômica no mundo de juros altos, o que deveria servir como mais um alerta para ajustar nossos fundamentos e gerar menos ruídos localmente.

No México, a eleição de Claudia Sheinbaum era esperada, mas a ampla vitória de seu partido nas duas Casas do Congresso foi surpreendente. Essa estrutura fez crescer o risco de a nova presidente conseguir mudar a Constituição e promulgar reformas que marcariam a ruptura com o que Andrés Manuel López Obrador —atual presidente e seu padrinho político— considera como "marco neoliberal". Entre as mudanças que foram testadas recentemente (sem apoio suficiente no Legislativo), destacam-se as reformas do sistema judicial (ministros da Suprema Corte seriam eleitos por voto popular), do Instituto Nacional Eleitoral e dos reguladores autônomos.

A presidenta eleita do México, Claudia Sheinbaum - Francisco Cañedo/Xinhua

Na Índia, o atual primeiro-ministro, Narendra Modi, ganhou um terceiro mandato, mas seu partido perdeu a maioria no Parlamento. A maior preocupação agora é com a capacidade de o governo, que vinha reforçando o ambiente de negócios e atraindo inúmeros investidores em busca de diversificação, continuar endereçando reformas sem enveredar no expansionismo fiscal, o que dependerá da coalizão a ser montada.

Será que, quando o Fed começar a reduzir os juros, o apetite ao risco dos investidores ganhará um "anabolizante" e os emergentes poderão empurrar seus ajustes para a frente?

Se a flexibilização monetária na Europa servir de exemplo para os EUA, não teremos um grande alívio. O Banco Central Europeu adotou uma postura bastante cautelosa, sem deixar claro o tamanho do ciclo de flexibilização e enfatizando que as próximas decisões dependerão dos dados. Vale lembrar que a inflação tem se mostrado mais resiliente por lá e que o resultado das eleições para o Parlamento Europeu adicionou mais incerteza para a região, podendo afetar a moeda por um período prolongado.

O Fed tem mantido os juros altos, mesmo com a força da economia, porque a inflação ainda não inspira confiança de que a meta será cumprida. Ainda que o ciclo se inicie neste ano, a proximidade das eleições presidenciais e as incertezas fiscais e inflacionárias (que incluem potenciais aumentos de tarifas e riscos geopolíticos) limitam a capacidade do banco central dos EUA de sinalizar seus próximos passos com clareza.

O caminho para restaurar a confiança em nossa economia não é novo e já foi identificado pela Fazenda e pelo Planejamento. O problema é a política permitir. As recentes derrotas no Congresso expõem a fragilidade da articulação do governo, e as eleições municipais podem intensificar a pressão para manter a economia aquecida a qualquer custo.

Com o fim do chamado "presidencialismo de coalizão" e com parlamentares protegidos por suas emendas impositivas, distribuir ministérios não será uma bala de prata. Vai ser preciso muita compreensão do cenário econômico e habilidade política para encampar o ajuste necessário com 2026 se aproximando.

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