Suzana Herculano-Houzel

Bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA).

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Suzana Herculano-Houzel
Descrição de chapéu Coronavírus

É preciso chegar a um acordo sobre quem sai de casa, como e quando

O cérebro responde à sensação de poder e também à de falta de controle

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Minha filha, que mora com os avós no Rio de Janeiro, me liga angustiada, pedindo ajuda. Eu posso, por favor, explicar mais uma vez aos meus pais que eles não podem sair de casa? Que ela já é adulta, tem carteira de motorista e está disposta a fazer tudo por eles para que não se arrisquem fora de casa?

De fato, não precisa. Mas, dadas as circunstâncias, é preciso chegar a um acordo sobre quem sai de casa, como, e quando, e isso requer pesar todos os riscos, de um lado e de outro —e vantagens, também. Explico a ela, então, a importância de se sentir no controle da própria vida para manter as respostas de estresse do cérebro em xeque. Ser filha da Neurocientista de Plantão tem dessas coisas.

Os livros didáticos sempre começam a falar das funções do cérebro começando pelos sentidos, aos quais o cérebro "responde com ações". Eu prefiro ver o conjunto como uma alça infinita, um circuito fechado sem princípio, meio ou fim, e no qual o cérebro é sempre agente também, com sua atividade intrínseca mesmo na falta de estimulação externa.

Meu colega Gyorgy Buzsáki, neurocientista da New York University, vai mais longe, e propõe que tudo começa de dentro, com ações organizadas pelo cérebro, cujas consequências ele monitora.

A vantagem da visão dele é que põe o cérebro como agente no controle, e não como observador passivo, ainda que reativo. Primeiro, fazemos; vemos se o resultado foi o esperado, ou no mínimo adequado, surpreendente, errado ou inócuo; e então ajustamos a próxima ação de acordo. No processo, estamos sempre no controle.

Talvez por isso assistir a ações se desenrolando à revelia seja tão estressante. Para o cérebro, tudo vai bem enquanto estamos no controle dos acontecimentos, a começar por nossas próprias ações. Controle é poder, e perder o controle só traz consequências nefastas: sensação de impotência, ansiedade, angústia, agitação, ou inação aprendida, prima da depressão.

Pondero então com minha filha que ela tem o poder de delegar aos avós o controle sobre quando eles querem sair de casa, quem quer dirigir, e qual caminho fazer a qual supermercado —desde que eles concordem em querer ficar esperando dentro do carro, para que eu possa vê-los de novo, ao vivo. Conhecendo meu pai, tentar contê-lo em casa só vai deixa-lo irritado e ameaçando sair de casa quando der na telha, o que seria muito pior.

Por sorte, temos todos bastantes neurônios pré-frontais, que nos permitem avaliar a situação e mudar nossa narrativa. Dadas as circunstâncias, então: o que você quer escolher fazer hoje?

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