Suzana Herculano-Houzel

Bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA).

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Suzana Herculano-Houzel

Onde está a diferença entre cérebros conservadores e liberais

Apesar de enxergarem as mesmas coisas, eles entendem 'músicas' diferentes

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Adoro quando a neurociência desaponta o pessoal que quer respostas fáceis. Biologia ou ambiente? Os dois. Dá para aprender línguas durante o sono, dormindo de fones de ouvido? Não, lamento, você tem que agir para encontrar sentido no que ouve. Implante de memória, à la Matrix? Sorry, também não, memórias são circuitos esculpidos no cérebro pelo uso, então sem uso, nada feito. Temos uma parte no cérebro que cuida da imaginação? Não, imaginar é reativar padrões no cérebro na ausência dos sentidos, então, quanto maior seu leque de experiências, mais elementos você terá à disposição da sua imaginação.

Não há respostas fáceis quando a questão é por que somos assim ou assado. Sim, a biologia de cada um é um ponto de partida importante, como a planta baixa de uma casa que define onde há portas e janelas. Mas o que se passa entre as paredes não está na casa e, sim, no uso que se faz dela. "Nós somos o que repetidamente fazemos", diria meu pai, parafraseando Aristóteles.

Fico feliz, portanto, ao me deparar com um estudo sobre os cérebros de conservadores e liberais norte-americanos e seus padrões de atividade quando confrontados com vídeos polêmicos sobre imigração.

Muro incompleto construído entre a fronteira dos Estados Unidos e do México
Muro incompleto construído entre a fronteira dos Estados Unidos e do México - Patrick T. Fallon/AFP

Em tempos de partidarismo acirrado, onde representantes eleitos penduram o cérebro no cabide da entrada e votam apenas de acordo com a sua legenda, a facilidade tecnológica de colocar voluntários dentro de uma máquina de ressonância magnética e acompanhar sua atividade cerebral, enquanto liberais e conservadores assistem a discursos e propagandas com os quais eles concordam ou discordam, é um convite ao estudo comparativo da natureza partidária humana.

Assim procederam quatro pesquisadores de vertentes diferentes —um neurocientista, um sociólogo, dois psicólogos—, na expectativa de encontrar diferenças nas regiões do cérebro que processam motivação ou sinais dos sentidos conforme a inclinação partidária do freguês.

Mas o resultado é muito mais interessante do que os pesquisadores esperavam. Há diferença detectável entre o cérebro de liberais e conservadores, como era de se esperar, já que o comportamento é obra do cérebro —mas a diferença não está em uma área cerebral maior ou mais ativa em uns do que outros.

Uma técnica matemática que permite estimar o grau de semelhança entre variações de atividade no cérebro de cada voluntário que assistia aos vídeos provocadores, como quem compara músicas, mostrou que conservadores são semelhantes entre si, assim como liberais são semelhantes entre si, enquanto um grupo é diferente do outro, no padrão de atividade de uma mesma parte do cérebro: o córtex pré-frontal dorsolateral, que cria narrativas e dá preferência a isso sobre aquilo.

Conservadores e liberais escutam as mesmas notas, mas ouvem em seus cérebros músicas completamente diferentes.

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