Sylvia Colombo

Historiadora e jornalista especializada em América Latina, foi correspondente da Folha em Londres e em Buenos Aires, onde vive.

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Diplomacia mal-educada de Javier Milei gera crise com Espanha

Estratégia de armar estardalhaço contra líderes de outros países já causou problemas diplomáticos com Colômbia e Brasil

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As palavras ofensivas de um ministro espanhol, Óscar Puente, em 3 de maio, dirigidas ao presidente argentino, Javier Milei, abriram uma crise diplomática —sem precedentes em tempos democráticos— entre a Argentina e o Reino da Espanha (nome formal do país, que Milei prefere usar para reforçar seu passado colonialista, alfinetando o governo de centro-esquerda do PSOE, o Partido Socialista Operário Espanhol).

Começou quando Puente sugeriu que o argentino havia aparecido num programa de televisão depois de ter "ingerido substâncias". Parece pontual e facilmente passável, porém, foram ditas pelo ministro de um governo que Milei odeia. O argentino afirma que o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, está levando a nação europeia à ruína ao permitir que ela se dissolva em seus separatismos porque seria um comunista.

O presidente da Argentina, Javier Milei, participa de cerimônia no Dia em Memória do Holocausto no Centro Cultural Kirchner, em Buenos Aires - Agustin Marcarian - 8.mai.2024/Reuters

O governo Sánchez se pronunciou dizendo que as palavras de Puente não representavam as do governo. Mas, àquela altura, já era tarde.

Milei já tinha fúria nos olhos, e o governo argentino lançou um comunicado, não redigido por sua chancelaria mas sim por funcionários de confiança do presidente. O tom nada diplomático era claro. E a emenda ficou pior que o soneto, pois sobraram impropérios à mulher de Sánchez, envolta num suposto caso de corrupção.

Se a ideia era amainar a crise, o efeito foi o contrário.

A celeuma não toca os brasileiros tão diretamente, mas vale lembrar que a Argentina é um dos países da região mais vinculados à sua antiga metrópole, e abriga mais de 400 mil espanhóis.

Esta é uma das tantas situações polvorosas em que Milei se mete e faz tremer os funcionários de sua chancelaria. Já ocorreu com a Colômbia, a China, o México, o Chile e outros.

Em alguns dos casos, a intriga é iniciada pelo ator de fora. Em outros, pelo próprio Milei.

De todo modo, nada disso é impensado. Milei e sua equipe agem da seguinte maneira: ao verem uma provocação a seu chefe de alguém relevante nas redes, armam um estardalhaço e potencializam a postagem, no que acaba virando um problema diplomático.

Só que a diplomacia de Milei não é a do protocolo e das formas. Ele a faz virtualmente, porque é ali que estão seu público e seu apoio —que em episódios como esses, só aumenta.

Quem até agora vinha amenizando os impropérios do ponto de vista institucional era a chanceler Diana Mondino. A estratégia era acalmar as situações dizendo que os desentendimentos entre os presidentes não afetariam as relações entre os países. Ela lidou assim com Gustavo Petro, que Milei chamou de "guerrilheiro assassino" devido ao passado dele na guerrilha do M-19, e com o brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, que o argentino descreveu como "corrupto".

Com os chineses, que Milei não quer nem ver, mas "permite que privados mantenham relação", a coisa vem sendo mais complicada. Mondino passou a ser a interlocutora deles, porém, começou com o pé errado, reunindo-se com uma comitiva de Taiwan antes de encontrar-se com uma de Pequim, episódio pelo qual teve de pedir desculpas.

Depois, veio a pior gafe. Ao inspecionar a base chinesa que há na Patagônia, e questionada se ali haveria militares daquele país, Mondino respondeu: "São chineses, são todos iguais".

Outro aspecto curioso da gestão Milei é que ele faz viagens muito incomuns como mandatário. Ele foi quatro vezes aos Estados Unidos, mas nenhuma para encontrar o presidente, Joe Biden, e sim o bilionário Elon Musk e o influenciador de direita Ben Shapiro.

Ainda neste mês, na Espanha, não verá Sánchez, mas estará ao lado de Santiago Abascal no festival Viva, do partido de ultradireita Vox, para lançar candidaturas do partido às eleições da União Europeia.

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