Tabata Amaral

Cientista política, astrofísica e deputada federal por São Paulo. Formada em Harvard, criou o Mapa Educação e é cofundadora do Movimento Acredito.

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Tabata Amaral

Coronavírus na Belíndia

A pandemia está expondo, de forma acelerada e gritante, o que significa ser a democracia mais desigual do mundo

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A pandemia do coronavírus, em tese, não discrimina por gênero, cor ou renda. Ao contrário, ela nos relembra que somos parte de uma comunidade de mais de 7 bilhões de pessoas, na qual todos estão conectados.

No entanto, apesar de o vírus ter chegado ao país por meio dos mais ricos, que podem viajar ao exterior, sabemos bem que os mais pobres são os que mais sofrerão com as consequências do coronavírus.

É uma questão estrutural. A nossa rede de proteção social é frágil, e as nossas desigualdades são profundas. Precisamos de soluções que mitiguem, com urgência e prioridade, os impactos da pandemia na vida e no bolso dos brasileiros mais vulneráveis. Porém, não é isso o que temos visto.

É sintomático constatar que a maioria das declarações oficiais e da cobertura da imprensa sobre o coronavírus parece desconsiderar a realidade do nosso povo. Demonstram, assim, um grande desconhecimento da carência e da falta de estrutura que marcam a vida de grande parte da nossa gente.

Lavar as mãos com sabonete líquido, usar álcool em gel, trabalhar remotamente e não sair de casa. Tudo isso é inviável e impensável para dezenas de milhões de brasileiros.

Para as 35 milhões de pessoas que não têm acesso à água tratada no nosso país, para os 13 milhões de brasileiros que moram em favelas, sem saneamento básico e sem infraestrutura urbana, para aqueles que passam várias horas por dia se deslocando de sua residência ao trabalho, ou ainda para autônomos e os nossos quase 40 milhões de trabalhadores informais, a exigência de “ficar em casa” é mais que uma afronta. É a esquizofrenia de um país que não enxerga as suas carências e suas mazelas.

Se não corrigirmos a rota imediatamente, não vai demorar para o vírus invadir os bairros periféricos e mostrar uma força destrutiva muito maior do que a que vimos na Europa. Eu, o deputado federal Felipe Rigoni e o senador Alessandro Vieira sugerimos, em carta ao presidente Jair Bolsonaro e aos seus ministros, algumas medidas emergenciais, como um benefício extraordinário universal no valor de R$ 500 mensais, a ser pago ao longo de quatro meses, para todas as famílias cadastradas no Cadastro Único para Programas Sociais do governo federal que tenham renda domiciliar per capita de até meio salário mínimo.

A medida impactaria um total de 22 milhões de famílias, 9 milhões das quais não recebem o Bolsa Família hoje. Também pedimos um auxílio maior para trabalhadores informais, de R$ 300 mensais, e uma expansão da oferta de crédito para microempreendedores.

Enquanto o presidente da República insiste em fazer piada com uma das maiores crises que já enfrentamos, precisamos pressionar os seus ministros por respostas mais rápidas e medidas mais profundas.

Falta um diploma de realidade no Planalto. A pandemia em breve vai escancarar o que de fato significa ser a democracia mais desigual do mundo.

O termo Belíndia foi cunhado muitos anos atrás, mas seguimos sendo um país no qual uma pequena parcela vive com um padrão de vida equivalente ao da Bélgica enquanto um grande contingente vive como os mais pobres da Índia.

A nossa luta deve ser para que não tenhamos que chegar a um caos social e econômico sem precedentes para só então tomarmos medidas mais agressivas. Mais do que nunca, chegou o momento de enfrentarmos as nossas desigualdades de frente.

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