Tatiana Prazeres

Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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Eficaz para combater coronavírus, tecnologia pode levar a maior controle das pessoas

China usa drones e tecnologias de monitoramento para conter avanço da doença

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Um drone sobrevoa a cidade fantasma de Wuhan. Entre prédios altos e avenidas desertas, localiza um jovem na rua. O drone se aproxima. "Ei, você, como ousa sair de casa sem máscara? Pois coloque uma", diz a voz firme.

O aparelho então chega mais perto do rapaz e libera-lhe uma máscara, prontamente posta em uso. Guiado remotamente por um policial, o drone avança. Localiza um menino jogando futebol e diz: "Pequeno Messi, volte logo para casa". No vídeo divulgado pela rede chinesa CGTN, o drone segue patrulhando a cidade, reprimindo os pouquíssimos que desrespeitam as regras.

Homem com máscara cirúrgica usa equipamento para operar drone que sobrevoa sobre sua cabeça
Morador da província chinesa de Henan usa drone para borrifar desinfetante em meio à epidemia do coronavírus - AFP

Alguns drones são capazes não apenas de distribuir máscaras, mas também de medir a temperatura à distância. Num outro vídeo do jornal oficial People's Daily, um drone mede a febre de duas pessoas em uma varanda, agilizando o diagnóstico e evitando o contato delas com outros.

Tecnologia made in China, feita sob encomenda para a crise de proporções épicas. Nenhum país como a China deu um salto tecnológico desta altura tão rapidamente. Uma única empresa chinesa, a DJI, tem hoje mais de 70% do mercado mundial de drones, por exemplo.

Em pouco mais de 40 anos, a China reconstruiu universidades destruídas pela revolução cultural, investiu em inovação, abriu espaço para iniciativa privada e passou a ocupar posições de destaque em áreas como inteligência artificial, tecnologia eólica e 5G.

Não surpreende que o governo recorra a tecnologia e a empresas do ramo para combater o coronavírus. Alibaba e Tencent, gigantes da tecnologia digital, trabalham em aplicativos para ajudar autoridades a rastrear os deslocamentos e monitorar a saúde dos indivíduos. Em Hong Kong, pessoas obrigadas a cumprir quarentena em casa usam pulseiras eletrônicas para facilitar o controle das autoridades.

Num discurso recente, Xi Jinping defendeu que o sistema de prevenção e combate seja aperfeiçoado. Referiu-se explicitamente a tecnologias digitais como big data, inteligência artificial e computação na nuvem. Quer aplicá-las a áreas como monitoramento de epidemias, rastreamento da origem de agentes patogênicos, prevenção e tratamento de surtos e alocação de recursos públicos.

Muitos fora da China verão com desconfiança o emprego da tecnologia nesta crise, sobretudo em função de questões relacionadas à privacidade.

Por outro lado, vivendo o drama na pele, poucos na China questionariam a ideia de que a tecnologia deva ser empregada para ajudar a combater a crise.

Suspeito que, para a grande maioria das mais de 700 milhões de pessoas cujas vidas estão sendo perturbadas por restrições ao ir e vir, preocupações muito concretas com saúde, segurança e conveniência se sobrepõem a inquietações sobre privacidade.

Se a tecnologia acelerar a solução, se mitigar o drama humano, social e econômico, seria um grande desperdício abrir mão dela. Para os chineses, é apenas no pós-crise que poderão surgir dilemas reais. O coronavírus passará, e a tecnologia de controle da vida das pessoas ficará. Alguns mais atentos observam que sistemas de monitoramento instalados para a Olimpíada de Pequim em 2008 seguem em uso até hoje.

Por um motivo que ninguém contestará, o governo aperta agora os parafusos da máquina de controle e a dota de novas capacidades. A questão é o uso que se dará ao aparato quando as razões excepcionais de hoje deixarem de existir. Por ora, focados em resolver a crise, os chineses abraçam as novidades.

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