Tatiana Prazeres

Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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É bem possível que China prefira reeleição de Trump a vitória de Biden

Pequim se beneficia da incapacidade de atual presidente valorizar seus aliados

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A China fará tudo o que puder para que eu não seja reeleito, disse o presidente Donald Trump nesta semana. Via Twitter, já havia concluído que Joe Biden era o candidato dos sonhos dos chineses.

A discussão sobre a China desponta como tema central das eleições americanas e ajudará a definir seus rumos. Trump e Biden disputarão quem será mais duro em relação a Pequim.

O tema já era importante no pré-pandemia. Agora, tornou-se vital. A economia americana está saindo dos trilhos depois de anos de bonança e, com isso, atribuir responsabilidade à China (ignorando a sua própria) será a linha de Trump.

Se a plataforma eleitoral do presidente era a economia, são péssimas notícias a queda de 4,8% do PIB nesse primeiro trimestre e o desemprego de 30 milhões de americanos. O apetite em atacar a China só aumenta com a economia em queda-livre.

Donald Trump com o líder chinês, Xi Jinping, durante encontro do G20 em Osaka - Kevin Lamarque -29.jun.2019/Reuters

É fato que a resistência à China nos EUA vinha crescendo nos últimos anos. Em todo o espectro político americano, explorar o sentimento anti-China parece irresistível. A retórica agressiva em relação à China durante a campanha influenciará os próximos anos da política externa americana.

Mesmo sabendo que, qualquer que seja o resultado das eleições, haverá tempos difíceis pela frente, quem a China preferiria ver na Casa Branca?

Pois é bem possível que os chineses prefiram Trump, por mais contraintuitivo que pareça.

Donald Trump é um presidente transacional —não é um principista. Pragmática, a China lida bem com alguém interessado no toma-lá-dá-cá. Sente-se confortável em sentar-se à mesa para discutir redução de tarifas de um lado e compra de toneladas de soja de outro.

As agendas de Trump e do pré-candidato Joe Biden teriam elementos comuns, especialmente nas áreas de segurança, comércio e tecnologia. Biden, no entanto, daria ênfase maior a temas que não são do interesse pessoal de Donald Trump, como direitos humanos, Xinjiang e Hong Kong —um menu que está longe de ser o favorito de Pequim.

Além disso, Biden poderia reconstruir alianças que Trump, como ninguém, soube destruir. Trump alijou aliados históricos. Comprou briga com seus vizinhos mexicanos e canadenses, distanciou-se dos europeus, estremeceu a Otan.

Num de seus primeiros atos como presidente, Trump retirou os EUA da Parceria Transpacífica, com outros 11 países, perdendo a oportunidade de ocupar espaço e fortalecer seus vínculos na Ásia. A China acelerou esforços e pretende em breve concluir outro acordo comercial na região, com cerca de 15 países.

Pequim se beneficia da incapacidade de Trump valorizar seus aliados. Biden pode ser capaz de reparar alianças e estabelecer novas parecerias. Pode buscar reunir forças inclusive para isolar a China —como Trump nunca nem tentou fazer.

Com Biden, talvez pudesse haver espaço para a cooperação em temas de interesse global, como mudanças climáticas. Mas os chineses certamente não nutrem ilusões em relação a um engajamento construtivo no plano bilateral.

A China sabe que a deterioração das relações com os EUA —já em curso antes da pandemia— agrava-se com ela. Estamos no pior momento do relacionamento bilateral em 40 anos, desde que os EUA reconheceram a China sob comando do Partido Comunista. Mas o fundo do poço talvez não tenha chegado.

A verdade é que os chineses conhecem Donald Trump, aprenderam a conviver com seu estilo mercurial, sabem o que lhe interessa, o que o move. Não é o mesmo em relação a Biden.

Apesar dos pesares, para a China em relação a Trump, pode ser que valha a lógica do ruim com ele, pior sem ele.​

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