Tatiana Prazeres

Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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Descrição de chapéu China Ásia tecnologia

Experiência da China responderá, afinal, quão difícil é regular algoritmos

Resto do mundo pode não querer tomar a direção dos chineses, mas tampouco pode ignorar experimento recém-iniciado por Pequim

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Há mais de 1 bilhão de usuários de internet na China. E eles passam cada vez mais tempo conectados —28,5 horas por semana em média, aumento de 2,3 horas em relação a 2020. Com a digitalização da sociedade e da economia, aumenta também o controle sobre a atuação das empresas de tecnologia do país.

No contexto do festival regulatório que atinge o big tech chinês, a última novidade a entrar em vigor, em março, foi a regulamentação sobre recomendações baseadas em algoritmos.

Fachada da sede da empresa Alibaba em Hangzhou
Fachada da sede da empresa Alibaba em Hangzhou - Noel Celis - 5.fev.20/AFP

As novas regras atingem em cheio plataformas digitais que promovem conteúdos, fazem buscas e filtragens, alimentam os usuários com vídeos, notícias e ofertas ou que propõem preço variável em função das circunstâncias.

Elas não poderão mais manter a receita do bolo em segredo, precisarão explicar como seus algoritmos fazem essas recomendações aos usuários. É justamente essa tecnologia que está na base do sucesso de gigantes chineses como Alibaba, TikTok e Didi (além dos não chineses conhecidos mundo afora).

Com a regulação sobre algoritmos, a China sai à frente no que é um desafio global para coibir software que alimente o vício no uso do serviço, compras compulsivas pela internet, práticas inadequadas para crianças, perfis falsos, fake news, além de comportamentos abusivos de empresas que detêm fatias muito grandes do mercado.

A nova legislação requer, por exemplo, que o usuário possa facilmente desligar recomendações feitas por algoritmos e, nesse caso, deixe de receber publicidade ou conteúdo personalizado. Ao mesmo tempo, ela permite que, em nome da harmonia social, Pequim promova certos conteúdos ao disciplinar algoritmos. E limite outros.

Em grande medida, o dilema chinês é compartilhado por outros países. Por um lado, há o desejo de impor limites a uma indústria que se tornou grande demais, estratégica demais e que, até agora, encontrou poucas restrições à sua atuação.

Por outro, há a preocupação em não inibir a inovação, os investimentos e a geração de valor num setor tão crucial para a economia e para a sociedade. Na União Europeia e nos EUA, o debate sobre regulamentação de inteligência artificial e responsabilização por algoritmos ocorre há vários anos, com propostas concretas ainda em discussão.

Para a China, está em jogo também a batalha pela liderança da economia digital. O país pretende ser líder mundial em inteligência artificial até 2030. Para atingir o objetivo, não pode errar a mão em matéria de regulação sobre algoritmos. Além dessa legislação, Pequim adotou recentemente regras sobre privacidade e proteção de dados pessoais.

Num movimento ousado, ao mesmo tempo que disputa a corrida, a China aperta os parafusos do ambiente regulatório que vinha catapultando seu setor de tecnologia digital.

Abundância de dados e um ambiente regulatório frouxo sempre foram vistos como vantagens chinesas no desenvolvimento de inteligência artificial —e ambos os pilares são afetados pelas novidades.

Resta acompanhar a implementação das regras e seus impactos no mercado. Os usuários chineses vão mesmo optar por desligar as recomendações personalizadas se isso levar a uma experiência online pior? Que impacto as mudanças terão no faturamento e no valor de mercado das big tech chinesas? Esses resultados serão suficientes para fazê-las repensar seus modelos de negócio?

O resto do mundo pode não querer tomar a direção dos chineses em matéria de regulação de algoritmos, especialmente pela sua dimensão de controle político-social. Mas tampouco pode se dar ao luxo de ignorar o experimento recém-iniciado por Pequim.

Por seu caráter pioneiro, a experiência influenciará o debate global sobre o assunto e ajudará a responder, afinal, quão difícil é regular algoritmos.

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