Transparência pública

Maria Vitória Ramos e Bruno Morassutti, cofundadores da Fiquem Sabendo, abordam transparência e acesso à informação pública

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Transparência pública

Como os cidadãos podem participar do combate à corrupção

Quatro histórias ilustram o potencial dos portais da transparência na luta pela integridade dos cofres públicos

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A corrupção, tema que dominou a discussão política no país na última década, tem como pressuposto o uso abusivo da assimetria de informações entre Estado e sociedade civil. Num Estado opaco, instituições são facilmente capturadas e o acesso a direitos e garantias é frequentemente objeto de negociatas por agentes públicos interessados em criar dificuldades para vender facilidades. Privilégios injustificáveis são concedidos ao alvedrio da opinião pública.

Sozinhos, o Ministério Público e os órgãos de controle jamais serão capazes de identificar e combater todos os casos de pequenas e grandes corrupções em todos os cantos do país. Além da imprensa, é preciso envolver os cidadãos nessa batalha. Para isso, governo aberto e fácil acesso a informações públicas são essenciais.

Fila de eleitores no Complexo do Alemão, no Rio, no pleito de 2020 - Ricardo Moraes - 15.nov.20/Reuters

Nenhum caso ilustra melhor essa necessidade do que o da então estudante Débora Sögur Hous. Em busca de informações sobre a própria bolsa de estudos no Portal da Transparência do governo federal, a universitária percebeu inconsistências em diversos pagamentos. Aos 25 anos, a jovem desvendou um esquema de corrupção de mais de R$ 7 milhões que resultou, em 2017, na prisão de 29 pessoas.

Ou então a história de Matheus Azevedo, servidor de serviços gerais de uma cidade com 3.000 habitantes no interior do Paraná. Consultando gastos no Portal da Transparência da Câmara Municipal de Ourizona, descobriu que alguns vereadores da cidade estavam triplicando seus salários com diárias de viagens. No podcast da Rádio Novelo ele conta como, com ajuda da cunhada, produziu um dossiê sobre a "farra das diárias" que chegou ao Ministério Público. Os gastos dos vereadores com diárias reduziram drasticamente.

O jornalismo também bebe dessa fonte. Para ficar em dois exemplos: a partir do Portal da Transparência e das informações da agenda oficial das autoridades, reportagens desta Folha revelaram em 2022 que a vice-líder em licitações da estatal federal Codevasf vinha utilizando laranjas para participar de concorrências públicas. A apuração foi citada na investigação da Polícia Federal e, mais recentemente, chegou ao ministro das Comunicações, Juscelino Filho.

Já em janeiro de 2023, reportagem do portal Vocativo mostrou como medicamentos adquiridos com recursos públicos para o tratamento de malária de indígenas yanomami estavam sendo desviados e vendidos por garimpeiros, em um esquema de irregularidades que já tinham sido identificadas pelo Ministério Público Federal. O MPF, inclusive, publicou recomendação aberta sobre o assunto.

Informações disponíveis publicamente apontavam que algo de errado devia mesmo estar acontecendo: pelos portais de transparência, a unidade de saúde indígena para a Terra Indígena Yanomami era uma das que mais recebiam dinheiro do governo e gastava altas somas para comprar remédios em 2021 e 2022. Enquanto isso, reportagens jornalísticas e o próprio Ministério da Saúde revelavam a falta de medicamentos nos postos para os yanomami. Se os recursos necessários estavam chegando, onde estavam os remédios?

Para permitir que a sociedade continue participando ativamente da fiscalização dos recursos públicos, o governo precisa agora avançar em pautas estruturais sobre as relações público-privadas. No início deste ano, a Receita Federal começou a divulgar no Portal da Transparência do governo federal os primeiros dados referentes às renúncias fiscais —até agora R$ 215 bilhões. Mas ainda faltam muitos programas, como o ProAgro, e a abertura da caixa-preta das renúncias fiscais com beneficiários desconhecidos.

Nessa linha, também é essencial a divulgação dos beneficiários finais de pessoas jurídicas registradas no Brasil, conforme recomendado internacionalmente, e segundo os critérios do "Padrão de Dados de Propriedade Beneficiária" (BODS na sigla em inglês), estabelecidos pela organização global Open Ownership.

Agora é a sua vez, querido leitor! Que tal fuçar o Portal da Transparência do seu município e participar da construção coletiva de um Brasil menos corrupto?

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