Oscar Vilhena Vieira

Professor da FGV Direito SP, mestre em direito pela Universidade Columbia (EUA) e doutor em ciência política pela USP. Autor de "Constituição e sua Reserva de Justiça" (Martins Fontes, 2023)

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Oscar Vilhena Vieira
Descrição de chapéu Folhajus STF drogas

Supremocracia desafiada

Tensão entre Legislativo e STF não parte só de ressentidos com golpe frustrado contra a democracia

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Temos testemunhado uma crescente tensão entre o Poder Legislativo e o Supremo Tribunal Federal. Essa tensão não decorre, no entanto, apenas do ressentimento de alguns inimigos da democracia, contra um tribunal que frustrou suas expectativas de rasgar o pacto constitucional de 1988, em 8 de janeiro de 2023.

Há também um movimento bastante intenso por parte de um grupo mais amplo de parlamentares desconfortáveis com o controle exercido pelo Supremo sobre a conduta da classe política, assim como em decorrência do que reputam ser avanços indevidos do tribunal sobre as esferas de competência reservadas ao legislador.

Até o presidente Lula, aliado da hora do Supremo, resolveu dar conselhos ao Supremo, afirmando que o tribunal não deveria se meter em tudo, em reação à decisão do STF de despenalizar o porte de maconha para consumo próprio.

Ministro usa toga preta, camisa branca, gravata azul e está ao centro da foto
O ministro Alexandre de Moraes durante sessão do STF - Pedro Ladeira-12.jun.2024/Folhapress

A reação do Legislativo ao modelo supremocrático que foi paulatinamente se consolidando ao longo dos anos, em grande medida por delegação e incapacidade do sistema político de resolver problemas de sua competência, tem sido a propositura de uma série de iniciativas legislativas voltadas a restringir as competências do Supremo, a limitar o poder e restringir os mandatos dos ministros, assim como medidas legislativas voltadas a neutralizar decisões do Supremo, contrárias a interesses grupos parlamentares, especialmente os mais conservadores.

A aprovação de lei reestabelecendo o marco temporal, no mesmo dia em que o Supremo declarou a tese inconstitucional, e a aprovação, pelo Senado, de PEC voltada à criminalização do consumo de drogas, buscando preventivamente esvaziar a decisão tomada pelo tribunal nesta última semana, são exemplos claros desse tipo de retaliação.

Esse cabo de guerra não é incomum em circunstâncias onde prevalece uma grande distância entre o que pensam os membros do Legislativo e os que ocupam a cúpula do Judiciário. No caso brasileiro, no entanto, há que se ponderar que a maioria conservadora que passou a dominar o Legislativo está distante não apenas do pensamento médio dos membros do Supremo, mas também das diretrizes adotadas pela Constituição de 1988.

O dilema colocado ao Supremo nessas circunstâncias é como reagir a essas retaliações oriundas de um parlamento insatisfeito com a Corte e com a própria Constituição?

Uma primeira alternativa é dar um passo para atrás e buscar minimizar a zona de conflito, flexibilizando a defesa de direitos de cunho "progressista" e se eximindo de controlar atos ilegais perpetrados por membros da classe política.

Uma segunda tentação, que parece estar ocorrendo no caso do marco temporal, é transformar a Corte Constitucional, que tem por missão maior garantir direitos de minorias vulneráveis, em uma câmara de negociação.

Em ambas as hipóteses o risco é fragilizar a Constituição, transformando-a em um documento facultativo, que pode ser moldado por aqueles que têm mais poder.

Uma terceira alternativa, que certamente contribuiria para reestabelecer um equilíbrio mais saudável e pertinente entre os Poderes, parece, no entanto, sofrer resistências internas, pois exigiria uma capacidade de autocontenção e especialmente de contenção das prerrogativas individuais dos ministros.

A estratégia seria fortalecer a colegialidade, qualificar o processo de deliberação, ampliar a consistência e coerência na aplicação da lei, estabelecer posturas interpretativas que reduzissem a discricionariedade judicial, gerando precedentes capazes de orientar e estabilizar as expectativas dos jurisdicionados.

Também seria indispensável nesse processo que o Supremo adotasse regras de conduta voltadas a fortalecer a sua imparcialidade.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.