Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu Eleições 2022 PIB

Lua de mel do presidente vai ser curta

Não está escrito que 2023 vai ser ano de crise, mas é preciso correr com governo novo

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Deixar o conserto do telhado para a época de chuva é metáfora velha também em economia. Mas ainda serve para apresentar o problema que vai cair na mão do próximo governo.

O tempo está fechando, embora não se saiba quanta água vá cair, aqui e no mundo. Nem é preciso dizer que vivemos em uma casa com paredes sob risco de desabamento, apenas remendadas desde 2015.

O ex-presidente Lula participa de evento do PT em Brasília (DF); o presidente Jair Bolsonaro participa do Dia do Soldado na Concha Acústica do Exército, em Brasília (DF) - Pedro Ladeira e Gabriela Biló/Folhapress

Supondo-se que Lula da Silva (PT) venha a ser eleito, terá pouco tempo para escrever nesta "carta branca" que supostamente estaria recebendo. Teria uns quatro meses para arrumar uma equipe econômica, acertar os termos de serviço, elaborar planos e alinhavar a política que possa dar sustentação prática a esses programas. Não é simples. Ainda mais se chover muito.

Embora tenha sido alegria de pobre, a economia brasileira rendeu muito mais do que o esperado em 2022. É possível que a baixa na atividade econômica seja notável apenas neste trimestre final do ano. Mas, embora previsões econômicas costumem ser vexaminosamente erradas, o tempo agora nublou de fato, não apenas no palpite. Os juros estão salgados no Brasil e assim vão ficar pelo menos até a metade de 2023. A economia mundial vai andar devagar.

O financiamento de casa, carro e tudo mais ficou bem mais caro nos bancos, de um ano para cá. A taxa de inadimplência sobe devagar, para níveis ainda normais, mas sobe. A parte da renda total das famílias dedicada a pagamento de dívidas sobe também. Levantar capital para qualquer negócio custa mais.

Sim, o salário médio está para voltar a crescer, em termos reais e anuais (até agora, vinha apenas despiorando), embora ainda seja 3% menor do que o de 2019. O número de pessoas empregadas cresceu de modo surpreendente em 2022. Tanto que se duvida que possa continuar nesse ritmo, muito maior do que o do PIB, desde o início da epidemia.

A taxa de investimento (quanto da renda do país é dedicada a expandir produção, instalações produtivas e moradias) continua em nível relativamente alto, 18,6% do PIB até julho (nas contas do Ibre/FGV). Não resolve nosso problema, mas é maior do que a média de 16,5% desde 2015 ou de 18%, desde 2000. Além do mais, há possibilidades de investimento em saneamento, energia, telecomunicações e transporte. Com alguma inteligência e rapidez, é possível incentivar o dinheiro privado a se mexer.

A confiança de comércio, serviços e construção está no campo positivo; a da indústria, por ali. O consumidor faz anos é pessimista, mas vinha se animando. Até setembro não havia sinal de derrocada. Ao contrário.

Mas o crédito mais caro vai jogar alguma água nesses chopes. Preços mais moderados de commodities que exportamos, também. Não está escrito que 2023 será ruim, mas a coisa complicou.

Passada a eleição, qualquer governo terá de lidar com esse Orçamento federal que não prevê dinheiro nem para a promessa básica da campanha —o Auxílio de R$ 600, entre muitos problemas críticos. A turma do dinheiro quase aceitou que 2023 será um ano de "licença para gastar" —o déficit público vai aumentar. Mas, se houver lambança e nenhum programa crível para 2024-26, o caldo engrossa rápido.

Supondo-se que agora apareçam menos empregos, com salários ainda baixos, o ambiente não será propício para uma "lua de mel" duradoura também com o povo, embora esperanças políticas possam aumentar a tolerância (vide o 2003-04 de Lula 1). Não convém testar a paciência dos donos do dinheiro e a do povo ao mesmo tempo.

Tempo é problema. Embora se possa encontrar na praça e no Congresso muito plano de mudança quase pronto, os candidatos a assumir esta ruína não têm programa ou equipe para tocar o barco.

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