Zeca Camargo

Jornalista e apresentador, autor de “A Fantástica Volta ao Mundo”.

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Turistas em Paris: um estudo de caso

Capital francesa é, para um turistólogo,o que Galápagos foi para Darwin

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Estou em Paris, aproveitando o privilégio de poder ver de perto um pouco dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos. Talvez uns dos mais incríveis de toda história, dado o cenário das competições, mas não quero parecer que estou me exibindo —uma pena que o texto escrito não carregue a ironia sutil da última frase.

O que pretendo dividir hoje com você é menos a euforia (e em vários casos, a decepção) com as disputas por medalhas do que uma oportunidade exemplar de refletir sobre nossa atividade favorita. Que é, claro, a de viajar.

A Torre Eiffel com os anéis olímpicos
A Torre Eiffel com os anéis olímpicos - Eloisa Lopez/Reuters

Dificilmente você encontra em outro acontecimento mundial uma oportunidade tão preciosa de observar de perto essa espécie humana tão peculiar. Sei que sempre quando viajamos temos boas chances de encontrar "colegas de vocação" fazendo o mesmo que nós: turistando!

Mas numa temporada olímpica você tem na mesma cidade, durante alguns dias, a chance de ver milhares, ou ainda, milhões de estrangeiros circulando com o mesmo propósito que você: a aventura de estar em outro país.

Uma Copa do Mundo, outro grande evento esportivo mundial, talvez tenha um poder similar, mas ela se desenrola em várias cidades —e o número de países envolvidos, ou seja, de torcedores potenciais de cada país participante, é sem dúvida menor.

Nos Jogos Olímpicos, no entanto, o universo de turistas é literalmente o mundo todo. E, a julgar pelo que vejo nas ruas de Paris, todas as nacionalidades estão de fato aqui representadas.

Para quem, como eu, gosta de encontrar pessoas viajando por onde vai, Paris por agora é, para um turistólogo, o que Galápagos foi para Darwin e sua teoria da evolução.

Ou ainda, a cidade parece uma espécie de "Onde está o Wally?" do mundo bizarro, para usar uma citação do incomparável "Seinfeld": você acha um turista em cada esquina. Correção: 40 em cada esquina.

E são todos muito parecidos. As cores que vestem, como você pode imaginar, são às vezes distintas, representando suas bandeiras nacionais. Mas de resto, eles são muito parecidos.

Ou talvez eu devesse dizer: "somos muito parecidos". É, acho melhor usar a primeira pessoa do plural!
Andamos sempre um pouco perdidos, mesmo com um GPS na palma da mão. Falamos alto demais ou baixo demais, dependendo da nossa cultura de origem (não preciso nem falar em qual categoria nós brasileiros nos encaixamos né?).

Erramos nas escolhas dos pratos, mesmo quando nos esforçamos em comer algo típico do lugar por onde passamos. Pagamos mais caro do que os locais por serviços básicos.

Desconfiamos dos motoristas de táxi e flertamos com a ideia de que todos os garçons e garçonetes fazem parte de uma conspiração contra nós. Duvidamos das placas e fingimos que entendemos sinais que absolutamente não conhecemos.

Carregamos sacolas demais, copos e garrafas descartáveis demais, usamos sempre roupas demais porque duvidamos da previsão do tempo de um lugar que até há pouco desconhecíamos. Suamos muito -mesmo no inverno.

Nos saudamos cansados, mas incansáveis ao mesmo tempo. Compartilhamos um olhar ora curioso ora cheio de desdém, como quem diz: "vim até aqui para isso?".

Resumindo, somos perambulantes imperfeitos, criaturas muitas vezes mais exóticas do que os, para nós, exóticos habitantes do nosso destino. Que no caso, são os franceses.

Que curiosamente, porque também competem nos Jogos Olímpicos, ainda que como anfitriões, a meu ver parecem turistas. Ou, como queríamos demonstrar, somos muito parecidos…

E estamos todos aqui, numa Paris excepcionalmente mais bela, para celebrar justamente isso: as nossas semelhanças! A única lição que aprendemos numa viagem que vale realmente a pena levar de volta para casa.

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