Descrição de chapéu Obituário Jorge Serpa (1923 - 2019)

Morre aos 96 anos Jorge Serpa, lobista e amigo de Roberto Marinho

Advogado tinha bom trânsito com diversos personagens da política

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Rio de Janeiro

"Eu não aconselho ninguém: converso com amigos. Eu não conspiro", disse o advogado Jorge Serpa em entrevista ao Jornal do Brasil, em 1987.

No último dia 21, Serpa morreu aos 96 anos no Rio de Janeiro. Nascido em Fortaleza, formou-se em direito na PUC-Rio.

Amigo de Roberto Marinho, o advogado tinha bom trânsito com diversos personagens da política —José Sarney, Fernando Henrique Cardoso, Juscelino Kubitschek. Ele era apontado pela imprensa como o principal lobista do país.

Eminência parda na política brasileira, Serpa preferia os bastidores. "Como se fosse um agente secreto, marca encontro com seus amigos em restaurantes. Chega sempre de táxi. Na saída jamais indica sua direção. Dizem que ele mora em três hotéis diferentes", escreveu o jornalista Ancelmo Gois em 1987.

Jorge Serpa, em uma aparição pública
Jorge Serpa, em uma aparição pública - Reprodução

Segundo o texto, Serpa foi um dos principais conselheiros políticos do ex-presidente João Goulart, com quem encontrava-se secretamente na Granja do Torto. Ele teria, inclusive, escrito alguns discursos para Jango. Posteriormente, o advogado afirmou ter sido vítima de tortura durante a ditadura militar.

Coluna do jornalista Gilberto Dimenstein em edição da Folha de julho de 1989 aponta outros discursos que tiveram o dedo do advogado.

"Serpa foi um dos conselheiros, por exemplo, no discurso feito por Collor quando formalizou sua candidatura pelo PRN, mostrando convicções liberais. São ideias, aliás, que aparecem no discurso de Mário Covas, que pregou o choque de capitalismo, por onde transitou discretamente Jorge Serpa", escreveu.

Quando precisava ir a Brasília apagar incêndios, Serpa, que tinha medo de aviões, era levado por taxistas. Em novembro de 1989, a Folha relatava que Marinho havia acionado o advogado para contornar a crise no relacionamento com o então presidente José Sarney —o encontro foi batizado de "Operação Serpa". Os dois estavam rompidos desde que Silvio Santos, dono da concorrência, havia lançado candidatura.

Procurado pela reportagem, o ex-presidente disse por email que foi apresentado a Serpa por Marinho. "E ele logo apropriou-se do encargo de dizer-se seu interlocutor e portador de suas mensagens", escreveu.

Quando o conheceu, afirmou Sarney, o advogado já carregava a fama de ser um dos homens mais bem informados e relacionados do país. De acordo com ele, Serpa era um "conversador brilhante e culto", um "homem plural com uma inteligência aberta a reflexões sobre o mundo e as ideologias".

"Dele guardo a imagem de um homem inteligente, realmente muito bem relacionado e conhecedor dos poderes no Brasil."

O advogado também é citado no primeiro dos quatro volumes do livro "Diários da Presidência", do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Sobre ele, FHC escreveu: "Esteve aqui o Jorge Serpa, como sempre trazendo ideias bastante grandiosas sobre a questão relativa à reorganização da economia mundial. O Serpa sempre tem essas ideias grandiosas, eventualmente vem uma ou outra coisa menor na qual está interessado. E quando está defendendo de uma maneira que seja de seu interesse, ele diz, como me disse hoje, que era advogado de um grupo que quer comprar a Serra da Mesa, que parece que o Banco Central ou o BNDES vai vender".

Em 1987, o então deputado federal Fernando Lyra disse que Serpa tinha a função de "vaso comunicante" e que o considerava uma espécie de termômetro do que estava acontecendo no país e no mundo.

"Eu gosto de conversar com ele porque é uma forma de ter posição sobre setores importantes do empresariado. Ele dialoga com todo mundo", afirmou ao Jornal do Brasil.

Serpa deixou sua mulher, Vicentina Novelli Serpa, três filhas, três netos e um bisneto. Em texto enviado à reportagem, as filhas referem-se ao pai como um homem de grandes valores, apaixonado pelos estudos, e se dizem gratas por terem convivido com ele.

"Sempre direcionou sua sabedoria para ajudar o seu país. Nunca o vimos cultivar raiva ou rancor de nada que lhe aconteceu. Admirava a vida e cultivava o humor", escreveram.

O corpo do advogado foi enterrado no dia 22 de janeiro. Segundo o colunista Elio Gaspari, menos de dez pessoas se despediram daquele que circulava entre tantos.


coluna.obituario@grupofolha.com.br

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