O presidente Jair Bolsonaro excluiu o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e reduziu a participação da sociedade no Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (Conad).
Decreto presidencial publicado no DOU (Diário Oficial da União) nesta segunda-feira (22) altera a lista de representantes dos ministérios.
A composição do Conad era estabelecida por um decreto do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de 2006.
O conselho contava com participação de um jurista indicado pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), um médico, um psicólogo, um assistente social, um enfermeiro e um educador, todos indicados por seus conselhos federais. Todos esses postos foram cortados.
O mesmo aconteceu com o cientista indicado pela SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), com o estudante escolhido pela UNE (União Nacional dos Estudantes) e com os nomes da imprensa, antropólogo, do meio artístico e com os dois de organizações do terceiro setor.
Se o decreto anterior previa participação de alguns ministérios, agora participam os próprios ministros das pastas de Justiça e Cidadania.
Bolsonaro manteve a participação de representantes dos Ministérios da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (Secretaria Especial dos Diretos Humanos da Presidência da República), da Educação, da Defesa, das Relações Exteriores, da Saúde e da Economia.
O presidente também incluiu representante do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), além dos secretários Nacional de Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça e Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas do Ministério da Cidadania. Também há um representante de órgão estadual responsável pela política sobre drogas e outro do conselho estadual sobre drogas.
Além disso, o decreto proíbe a divulgação de discussões em curso sem a prévia anuência dos ministros da Justiça e da Cidadania.
O assunto entrou no foco do governo federal neste ano. Em junho, o presidente sancionou lei que altera pontos do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, que, entre outras coisas, autoriza a internação involuntária de dependentes químicos.
Em abril, Bolsonaro já havia publicado, por meio de decreto uma nova Política Nacional sobre Drogas, que prioriza a abstinência sobre a redução de danos, em substituição a texto de 2002 do governo Fernando Henrique Cardoso.
O presidente já fez uma série de mudanças na composição de conselhos federais, como o Conselho Nacional do Meio Ambiente e o Conselho Superior de Cinema.
Entidades excluídas do conselho reagem a decreto
A Comissão Especial de Segurança Pública da OAB Nacional se declarou preocupada com a exclusão dos representantes da sociedade civil e especialistas da discussão e elaboração de políticas públicas formuladas no âmbito do Conad.
"O tema é de grande complexidade e gravidade, com um número elevado de brasileiros que sofrem com as drogas, principalmente os jovens. Essa situação demanda um esforço que só poderá ter resultados com o envolvimento da sociedade civil, estudiosos e especialistas para o enfrentamento do problema, com o aprofundamento do debate sobre ações e políticas efetivas sobre drogas", diz o comunicado.
O Cofen (Conselho Federal de Enfermagem) repudiou a extinção da representação dos conselhos e da sociedade civil no Conad. Para o Cofen, os conselhos profissionais deveriam ser mantidos em observância ao Estado democrático de direito.
"A Constituição Federal de 1988 prevê a participação popular na gestão pública como pressuposto do sistema democrático. O que garante a indivíduos, grupos e associações o direito a representação política, informação e defesa de seus interesses, tornando possível a atuação na gestão dos bens e serviços públicos, sobretudo no que tange a um fenômeno complexo e multifacetado que é a matéria sobre drogas", diz a nota.
O Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) qualificou a medida de autoritária e antidemocrática e disse que ela representa um retrocesso na política sobre drogas no país.
"Impedir a participação do Serviço Social e de outras categorias profissionais da saúde dos debates do Conad é, sem dúvida alguma, uma tentativa de calar a opinião técnico-científica de profissionais que têm apontado caminhos alternativos para a questão das drogas no país", informa o conselho.
A UNE disse lamentar que "o governo de Bolsonaro tenha atacado mais um instrumento de democracia e participação social".
"Mesmo após ter sofrido uma derrota no Supremo Tribunal Federal ao tentar extinguir uma série de conselhos e fóruns consultivos que ligavam à sociedade civil às políticas públicas, o governo continua tentando aos poucos afastar os cidadãos desses espaços", diz a nota.
"Isso prejudica não só nossa democracia, mas também a possibilidade de um trabalho mais sério e qualificado acerca do tema."
Pelo lado do governo, o Ministério da Justiça se manifestou, afirmando que a nova estrutura moderniza a interlocução com a sociedade e com os órgãos públicos envolvidos nas políticas antidrogas. Segundo a pasta, a criação de um grupo consultivo, previsto no decreto, vai possibilitar a participação efetiva de seis especialistas da área.
O ministério também diz que a articulação com os estados se dará por uma comissão bipartite, que terá 27 representantes estaduais.
Em nota, a pasta também procurou minimizar a exclusão da participação de um médico e um jurista.
"Na presente proposta, dada a crescente intersetorialidade da política de drogas, não existe mais sentido em limitar o subsídio de seus processos decisórios a estas duas áreas ou a qualquer área", informou o Ministério da Justiça.
A assessoria do CFM (Conselho Federal de Medicina) informou que ainda está analisando o tema e que, por isso, não iria se manifestar.
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