'Fui resistente no início, mas o teatro virtual é riquíssimo', diz ator Celso Frateschi

Ator e diretor teve que fechar seu teatro em São Paulo, Ágora, e se adaptar aos espetáculos online

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São Paulo

Em depoimento à Folha, o ator e diretor Celso Frateschi, 69, fala sobre como lidou com o fechamento do seu teatro na região central de São Paulo e como se reinventou para seguir fazendo espetáculos virtuais. "O teatro tem 25 séculos, já passou por confusões maiores do que as atuais e sobreviveu", diz.

A pandemia mudou radicalmente a vida da gente, mas foi uma realidade com a qual tivemos de lidar, sem fazer de conta que ela não existe, como fazem os negacionistas.

A primeira mudança, muito difícil, foi a dos hábitos. Tenho a sorte de minha casa ser praticamente dentro do meu teatro, o Ágora. Então, já trabalhava em casa de certa forma.

Mas vários hábitos que adoro, como andar muito pela cidade, tive que deixar de lado. Essas possibilidades estão começando a voltar, com todos os protocolos. Mas, no início, fui rigoroso no isolamento, a gente não tinha noção da dimensão da pandemia.

Quando o lockdown começou, estávamos com duas peças em cartaz e uma terceira já programada para estrear. Tivemos de suspender, evidentemente. Naquele momento, achava impossível superar a falta presencial do público. Veio uma certa depressão, não só por mim, mas por todos que fazem teatro.

Logo percebemos que toda esta situação ainda iria muito longe. Não dava para ficar na expectativa da volta ao normal, não iria ocorrer tão cedo.

Daí a Sílvia, minha mulher, olhou para um quadro do [dramaturgo alemão] Bertolt Brecht que tenho em meu local de trabalho e me perguntou: 'O que Brecht faria?'. Ele enfrentou o nazismo, lidou com a realidade que lhe foi apresentada. Como ele faria teatro considerando que ter público na sala era inviável?

Juntamos um grupo de pessoas no Zoom para pensar e chegamos a um decálogo do que poderia permanecer do teatro na plataforma virtual.

A gente tinha uma peça que caberia como uma luva no teatro virtual, 'O Grande Inquisidor', baseada em um texto do Dostoiévski. É a narrativa de um ator, e dava para manter o público ativo mesmo no Zoom.

Juntamos um grupo de teatro e cinema. Optamos por uma plataforma na qual as pessoas também chegam a uma sala, podem se ver e trocar ideias.

O espetáculo é feito diretamente para a plateia, e convidamos sempre alguém para um bate-papo depois da peça. Não sei quando a gente vai voltar ao palco físico. Para mim, a experiência virtual está sendo riquíssima, de verdade. Eu era muito resistente no início.

Hoje, acho que a melhor versão de 'O Grande Inquisidor', um monólogo que eu já tinha encenado presencialmente, é a virtual. A câmara na altura da visão do público faz com que o espectador se sinta como o antagonista do ator (o inquisidor), ao mesmo tempo em que está em sua casa, no computador ou no celular.

Estamos partindo para uma nova experiência, um diálogo, não sei como vai funcionar o online na perspectiva de dois atores, mas não estamos com pressa.

O teatro tem 25 séculos, já passou por confusões maiores do que as atuais e sobreviveu. É uma necessidade humana.

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