Supertúnel de esgoto que se rompeu perto de obra do metrô vira 'caçula famoso'

Com 7,5 km, interceptor está longe de ser o maior em extensão na lista dos 28 da Grande SP

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São Paulo

Famoso desde que se rompeu durante a passagem do tatuzão da linha 6-laranja, na marginal Tietê, o interceptor ITi-7 é um supertúnel de 7.568 metros de extensão, alto e largo o suficiente para comportar uma pequena escavadeira, com folga. O que nem todos sabem é que estruturas gigantescas como essas são fundamentais para evitar que o esgoto chegue até os rios e estão espalhadas por toda Grande São Paulo.

Em alguns pontos, o ITi-7 chega a ter 3,4 m de largura por 4,25 m de altura —provavelmente, mais alto e largo do que o cômodo onde você lê esta matéria, caso esteja dentro de uma casa ou apartamento.

Novo e encorpado, com capacidade para deixar fluir grandes volumes, o interceptor que virou notícia nesta semana está longe de ser o maior em comprimento a cruzar os subterrâneos da Grande São Paulo. Entre os 28 em operação, o mais extenso é o IPi-6, localizado às margens do rio Pinheiros, com 19,5 km. Mais recente a ser entregue, em fevereiro de 2020, o "caçula" ITi-7 fica em um modesto 11º lugar no ranking.

Operários trabalham na construção o ITi-7, sob a pista da marginal Tietê, em 2018 - Lalo de Almeida - 25.set.18/Folhapress

Os interceptores compõem parte de uma densa trama que se desenha sob o asfalto da região metropolitana, longe dos olhos da população. Na prática, só chamam a atenção quando algo deu muito errado, como no caso da obra do metrô.

Como o próprio nome diz, eles interceptam os efluentes (como também é chamado o esgoto) que saíram das casas, depois que passaram pelas redes coletoras e por coletores-tronco. A função só será concluída quando entregarem todo esse líquido malcheiroso a outros interceptores ou aos emissários.

O ITi-7 se tornou realidade depois de muita escavação, a um ritmo de 1 metro a cada 12 horas de trabalho. Tudo isso a até 18 metros abaixo das pistas sentido Ayrton Senna da marginal Tietê.

Antes do acidente, o túnel levava o esgoto de 2,2 milhões de habitantes —cerca de 10% da população da região metropolitana— à maior estação de tratamento do país, em Barueri, na Grande São Paulo. Na margem oposta, há um "irmão mais velho", o ITi-3, para onde está sendo bombeada parte dos 170 milhões de litros que vazaram com o incidente.

Presidente do Instituto de Engenharia, Paulo Ferreira afirma que interceptores são fundamentais para evitar ainda mais a poluição nos rios. Também diz que são gigantescos numa cidade como São Paulo por causa do volume de dejetos que chegaria até os cursos d'água se não existissem, e ele cita justamente o ITi-7 como exemplo. "Ele coleta praticamente um lado inteiro da bacia hidrográfica, por isso é tão grande", explica.

De forma geral, vale lembrar que cerca de 80% da água consumida vira efluente. Segundo a própria Sabesp, 92% da área urbanizada da região metropolitana tem esgoto coletado em casa, mas só 83% do que é recolhido recebe tratamento.

O interceptor que agora está avariado recebe efluentes não apenas de bairros como Bela Vista, Consolação e República, da região central. Conectados a ele estão também o ITa-1 e o ITa-2, outros túneis da mesma categoria, instalados ao lado do rio Tamanduateí. Isso significa que esgoto até do Ipiranga, na zona sul, por exemplo, é levado para tratamento em Barueri, numa jornada de mais de 30 km.

Diferentemente do abastecimento de água, onde os tubos recebem forte pressão para vencerem desníveis, no esgoto tudo vai embora por gravidade (dos pontos mais altos dos bairros até os fundos de vales, onde estão rios e córregos). Por isso, esses túneis nunca operam plenamente cheios, tendo uma capacidade útil que pode chegar a 85% do volume, limitada pela velocidade do líquido, sendo o restante preenchido pelo ar.

Quando aprofundar a rede não é mais técnica ou economicamente viável, instala-se então uma estação elevatória, que, com bombas, joga os efluentes "um degrau acima", voltando depois a seguir o caminho natural por gravidade. "Sem as estações elevatórias, teríamos que escavar até o Japão", brinca o presidente do IE. O próprio esgoto do ITi-7 vai para uma estação elevatória, a Nova Piqueri, na rua Professora Suraia Aidar Menon, pouco mais de um quilômetro depois do local do acidente na obra do metrô.

Para não poluir ainda mais o rio Tietê, a Sabesp afirma que desviou o esgoto do ITi-7 para seu antecessor, o ITi-1, parcialmente desativado em 2020 e que, agora, volta a funcionar temporariamente desde o seu início. Embora menor que o sucessor —é retangular e tem 2,80 m por 1,80 m, na média—, a expectativa é de que dê conta da função no momento. "Eles devem ter jogado lá para ver o que acontece. Era lá ou no rio. Se optaram por jogar ali [no interceptor antigo], fizeram a coisa certa", diz Ferreira.

Segundo a Sabesp, a manutenção do ITi-1 foi continuada e ele tem plena capacidade de suportar o volume atual do ITi-7, que foi projetado para receber, no futuro, esgoto decorrente da verticalização da região. Por enquanto, não há previsão de quanto tempo será necessário para reparar o ITi-7.

Coordenador da divisão de saneamento do departamento de infraestrutura da Fiesp, João Jorge da Costa afirma que obras como o ITi-7 tem um dimensionado "bem folgado", por isso o túnel antigo, mesmo sendo menor, deve dar conta por enquanto. "Imagino que se o presidente da Sabesp falou que vão usar essa estrutura, então é porque funcionará", diz.

Costa explica que o caminho percorrido pelo ITi-1 é conhecido de muito tempo pelos especialistas em saneamento. "Tanto que a Marquês de São Vicente, por onde ele passa, era chamada de avenida do Emissário. Naquela época, a estação de tratamento ficava na Vila Leopoldina [zona oeste]. Antes da estação, era tudo lançado diretamente no rio", afirma. "É de quando a cidade parava ali no Bom Retiro [região central]", explica.

Segundo a Sabesp, o trecho final do ITi-1 já recebia esgoto do túnel avariado durante as obras do metrô, antes mesmo do incidente. Por outras tubulações, os efluentes desses dois interceptores ainda seguem para a margem direita do Tietê, retornam à margem esquerda já no limite com Osasco, na Grande São Paulo, e, só depois, continuam até Barueri.

Segundo Costa, antigamente, interceptores eram feitos até de alvenaria, o que provocava muita manutenção. Os materiais mudaram, a região metropolitana se expandiu e a rede teve que dar conta de coletar os rejeitos da maior parte dos 22 milhões de habitantes para serem tratados antes de virarem água novamente. "É uma grande estrutura, compatível com uma grande cidade", diz.

A Sabesp diz que, desde 1992, quando teve início o Projeto Tietê, a rede de coleta de esgoto que atendia 70% da área urbanizada da Grande São Paulo saltou para 92%, enquanto o tratamento dos esgotos foi de 24% para 83% do volume coletado.

"Em função de sua complexidade, o programa requer ações integradas, altos investimentos e continuidade, com resultados em termos ambientais como solução de longo prazo, por isso foi necessária sua estruturação em etapas", afirma, em nota.

Segundo a Sabesp, durante o Projeto Tietê foram executadas 1,8 milhão de ligações e instalados aproximadamente 4,8 mil km de interceptores, coletores tronco e redes coletoras para transportar o esgoto até as estações de tratamento, cuja capacidade instalada quase triplicou no período.

O órgão estadual diz que foram construídas as estações de tratamento ABC, Parque Novo Mundo e São Miguel e ampliação de Barueri. "Como resultado desses investimentos, hoje a vazão de esgoto tratada nas estações metropolitanas é mais de cinco vezes superior à época do início do projeto", explica.

A Sabesp afirma que a limpeza de rios depende também do descarte adequado do lixo por toda a sociedade e da coleta regular pelas prefeituras, bem como controle do uso e ocupação do solo.

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