Descrição de chapéu Independência, 200

Espetáculo une d. Pedro 1º a Zumbi e Maria da Penha para reviver grito dado há 200 anos

Encenação no Ipiranga trouxe ator Caco Ciocler como o proclamador da Independência e homenageou expoentes da história do Brasil

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São Paulo

Um dom Pedro 1º desorientado, quase jocoso e que mal consegue dar o grito do Ipiranga. Assim surgiu o primeiro imperador brasileiro na interpretação de Caco Ciocler em espetáculo realizado na tarde desta quarta (7) no parque da Independência, em São Paulo.

A montagem "Vozes da Independência" tomou como ponto de partida o episódio do grito do Ipiranga, ocorrido há 200 anos, para apresentar expoentes da história do Brasil, como Anita Malfatti, Anita Garibaldi, Antônio Conselheiro, Bárbara de Alencar e Chico Mendes.

"Tá tudo embaçado", diz o monarca, que, titubeante, não entende o propósito dos personagens que aparecem diante dele na montagem dirigida por Paula Klein e Sarah Lessa.

Fantasiado com farda de dom Pedro 1º, Caco Ciocler levanta um chapéu em aceno ao Monumento da Independência
O ator Caco Ciocler interpreta dom Pedro 1º em encenação sobre os 200 anos da Independência, em São Paulo - Zanone Fraissat/Folhapress

No início do espetáculo, promovido pela Secretaria Municipal de Cultura, o imperador tenta dar o grito que se tornou famoso. Ensaia: "Independência…", vai outra vez, mas não sabe como concluí-lo. Por fim, sem grande convicção, anuncia: "Independência ou Morte!".

A grande ironia é que esse retrato bem pouco convencional de dom Pedro 1º foi apresentado aos pés do Monumento à Independência, que guarda os restos mortais do monarca desde 1972, quando a Independência completou 150 anos.

A vinda do coração em formol para o Brasil, uma iniciativa do governo federal, foi tema de várias piadas ao longo do espetáculo. "Meu coração vai, enfim, encontrar meu corpo", afirmou o personagem.

Tão ou mais importante que o imperador ao longo da encenação era Machado de Assis, responsável pela ligação entre os demais personagens. "Trouxemos alguns convidados que durante muito tempo ficaram fora da celebração", afirmou o escritor vivido por Heraldo Firmino.

Um desses "convidados" é Zumbi dos Palmares (Rogério Brito), entre os mais aplaudidos. "Quando se conhece a liberdade, não se acostuma com a escravidão –seja da mente, seja do corpo", diz ele.

Ao longo da montagem, o mote "Independência ou Morte" foi desconstruído de diversas maneiras. "Tantos gritos de independência abafados, mas ainda assim nós celebramos", diz Machado.

Outra personagem de destaque foi Maria da Penha (Georgette Fadel), mulher que deu origem ao nome da lei contra violência doméstica. Fadel cantou "Maria da Vila Matilde", música eternizada na voz de Elza Soares ("Eu quero ver você pular, você correr / Na frente dos vizinhos / 'Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim").

"A lei Maria da Penha é a verdadeira independência das mulheres brasileiras", afirmou a personagem, também aplaudida.

Outra figura bem recebida pelo público foi Chaguinhas (Jairo Pereira). Às vésperas da Independência, em 1822, o cabo participou de um levante militar devido a salários atrasados em Santos (SP). Com o fracasso do motim, ele foi sentenciado à morte.

Chaguinhas foi, então, levado ao Campo da Forca, onde hoje fica a praça da Liberdade, na região central de São Paulo. Quando seria enforcado, a corda teria arrebentado, sem matá-lo. Nova execução foi ordenada e, pela segunda vez, a corda arrebentou. Na terceira tentativa, o cabo foi morto.

Há quem acredite que Chaguinhas tenha feito um milagre. "Nosso maior milagre é continuar amando o Brasil que não nos ama de volta", diz o personagem.

Tudo acabou em Carnaval. A escola de samba Imperador do Ipiranga levou sua ala das baianas, suas passistas e sua bateria para o parque e cantou seu samba-enredo de 2004 ("Meu canto levanta poeira / O samba é a minha bandeira") e outras músicas.

A essa altura, grande parte do parque da Independência estava tomado pela multidão. Ao menos neste 7 de Setembro, todos puderam ver dom Pedro 1º e Zumbi dançando lado a lado.

Museu do Ipiranga

Pela manhã, o Museu do Ipiranga abriu para a visita de alguns convidados, de estudantes de escolas públicas e dos operários que trabalharam nas obras de reforma e ampliação, com suas famílias.

Entre esses convidados estava João de Orléans e Bragança, tataraneto do primeiro imperador do Brasil, que comentou a vinda do coração de dom Pedro 1º para o Brasil. É algo "mórbido e triste", disse.

O coração esteve exposto no Palácio do Itamaraty, em Brasília, onde foi recebido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) com honrarias de chefe de Estado. "Isso é um uso eleitoral da memória de dom Pedro 1º, não um ato cívico", opina Orléans e Bragança.

Orléans e Bragança esteve com os netos na visita ao museu e reforçou a importância da reabertura pelas reflexões que o espaço traz. "Gostei muito das mesas multissensoriais", diz.

Como era de esperar, as crianças e os adolescentes também se interessaram pelos aparatos tecnológicos que acompanham as obras do museu, mas também elogiaram as peças antigas.

"Adorei a estátua do dom Pedro 1º na escadaria. Aprendi sobre ele na escola", disse Nicolas Reis, 12, estudante da Emef (Escola Municipal Ensino Fundamental) Aclamado, que fica no bairro Jardim da Conquista (zona leste da capital paulista).

Também apreciou a antiga máquina de costura na exposição "casas e coisas". No salão nobre, além de "Independência ou morte", o quadro do Pedro Américo, Nicolas gostou dos painéis explicativos sobre a obra, situados diante do quadro.

Amigo de Nicolas, Yago Aparecido, também de 12 anos, contou que a visita deles ao museu foi decidida de última hora. "A gente iria numa banda para o desfile do 7 de setembro, mas acabamos vindo pra cá."

Gabriel Levino Assunção, 10, estava fascinado com os tijolos antigos. Ele estava no museu com sua turma da Emef Josefa Nicacio Araújo, no Itaim Paulista (zona leste de SP).

Tijolos e outros objetos da época da construção, no fim do século 19, integram o eixo "Para entender o museu". Gabriel, que mal tinha começado a visita, disse: "Tenho vontade de voltar".

Isabelle Cristina, também de 10 anos, da mesma escola, acompanhava as dezenas de fotos do museu em construção.

Marilucia Ferreira da Silva, diretora da escola de Isabelle e Gabriel, contou que houve uma mobilização da equipe do colégio para preparar os alunos para a visita.

"Promovemos debates sobre a história do Brasil e apresentamos vídeos sobre o tema para eles, além de outras atividades, disse a diretora. "Vieram com muita expectativa", disse.

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