Pacientes esperam meses por cirurgia em hospital na zona norte de SP

Segundo relatos, unidade diz não ter condições de realizar procedimentos, mas não transfere os casos

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São Paulo

A rotina de Marinalva Santos, 33, transformou-se há cerca de 45 dias, quando o marido, Miraildo, 57, foi atropelado por uma moto enquanto tirava o lixo em 1º de outubro. Do Jardim Elisa Maria, onde moram, os socorristas levaram Miraildo ao Hospital Geral de Taipas, administrado pelo governo de São Paulo, também na zona norte da capital.

"Deram medicação para dor, porque gritava, e foi encaminhado para o ortopedista. Mas quando chamou no painel, às 3h42, não tinha um profissional no hospital", conta Marinalva. Já no segundo dia, um profissional analisou o caso e solicitou exames, que indicaram a necessidade de cirurgia na bacia.

O problema, diz Marinalva, é que o atendimento tem sido difícil, e os profissionais se recusam a classificar como urgente o caso do marido. Ela precisa ir quase que diariamente ao hospital para solicitar exames e pedir informações sobre o caso.

foto mostra profissional de saúde vista através do vidro de uma porta
Foto mostra atendimento em hospital durante a pandemia de Covid-19 - Adriano Vizoni - 2.abr.2022/Folhapress

"Fui conversar com o doutor de plantão, ele disse que não ia repassar o caso, que o analista [de radiografia] já havia dito que era cirurgia de bacia. Mas a pessoa fica lá e vai chegar uma fase em que não vai fazer cirurgia, porque regenera. O que é isso?", diz ela, que questiona o prolongamento da internação e a falta de previsão para cirurgia.

Com a mandíbula solta por causa do acidente, Miraildo também precisou da pressão da esposa para que o hospital fizesse uma tomografia e identificasse o problema.

A secretaria paulista de Saúde afirma, em nota, que fez a cirurgia da mandíbula de Miraildo e que ele aguarda uma vaga em unidade de referência em quadril.

Rodrigo Yha, 25, recebeu uma justificativa semelhante do hospital em 27 de outubro. Ele chegou à unidade após um carro atingir a moto em que ele levava a namorada, na Vila Basileia.

"Em vez de mandar para um hospital mais perto, como Cachoeirinha, mandaram para longe, de Taipas. Minha bacia foi deslocada e a tíbia quebrou. Esperei agonizando por umas quatro horas, com a bacia deslocada", diz ele.

O Hospital Geral de Vila Nova Cachoeirinha fica a 3 km de carro da Vila Basileia. Já o de Taipas, entre 10 e 12 km, de acordo com a rota escolhida.

Após os cuidados iniciais para colocar a bacia no lugar, Rodrigo conta que fizeram tala na perna e disseram para aguardar pela cirurgia.

A dez dias de completar um mês de internação, ele diz que os médicos aparecem para verificar a situação dos pacientes e dizem esperar por atualizações do sistema Cross (Central de Regulação de Ofertas e Serviços de Saúde). A informação foi confirmada pela pasta de Saúde do governo estadual.

"E é isso. Tem um paciente aqui que está há cinco meses esperando para operar o fêmur. De tão frustrado que está com a situação, não quer falar com ninguém", afirma.

O motorista de caminhão Francisco Pereira, 56, sofreu um acidente de moto a caminho do trabalho, ainda perto de casa, na Vila Rosa, zona norte da capital. Ele espera há oito meses pela cirurgia.

O acidente quebrou dois ossos de uma das canelas, e ele foi internado em 11 de março no hospital de Taipas.

"Fiquei uma semana internado, colocaram os fixadores e fui transferido em um grupo de 12 [pacientes] para o Pari [Hospital Nossa Senhora do Pari]. Só que eu e mais um fomos mandados de volta, porque disseram que meu caso era complicado".

Os fixadores externos, usados para ajudar a fixar os ossos durante o tratamento, causavam sangramentos constantes na perna de Francisco e dores que não eram aliviadas com analgésicos comuns. "Fiquei três meses com isso, inchava, escorria muito sangue, não conseguia comer e dormir, perdi quase dez quilos", afirma.

"Pedi para o médico tirar, tiraram e disseram que estava alinhado. Só que não está. Nessa faz 7 ou 8 meses. Já cansei de pedir transferência para o Cachoeirinha, que tem condição, mas eles não liberam", diz Francisco.

O motorista então buscou informações e chegou a ir ao Nossa Senhora do Pari, mas ouviu que é preciso seguir a recomendação do hospital.

Ele chegou a considerar pagar pela cirurgia, mas desistiu pelo custo. "Não é menos de R$ 30 mil, e isso eu não tenho condição".

O hospital de Taipas fica a 14 km de carro da casa de Francisco, cujo acesso é feito por degraus. Na época da primeira alta, ele precisou ser carregado em uma cadeira por amigos para chegar e sair de casa.

Entre não conseguir a cirurgia e nem a transferência, ele segue buscando informações. "Dia 28 agora eu tenho uma consulta, mas pelo jeito não vai ter vaga. Já vou preparado para isso". S secretaria de Saúde paulista confirmou o agendamento.

A pasta não respondeu se faltam recursos humanos e materiais para a realização de cirurgias na unidade e nem se a demora nas cirurgias alegadas pelos pacientes pode representar risco à saúde.

Erramos: o texto foi alterado

Diferentemente do publicado em versão anterior deste texto, o sobrenome de Marinalva é Santos, não Lima. 

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