Aras vai ao STF contra indulto de Bolsonaro a condenados por massacre do Carandiru

PGR pede que a corte suspenda imediatamente a eficácia da norma

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Brasília

O procurador-geral da República, Augusto Aras, acionou o Supremo Tribunal Federal nesta terça-feira (27) contra o decreto de Jair Bolsonaro (PL) que concedeu indulto a condenados, incluindo os policiais militares do massacre de Carandiru, em São Paulo.

Aras pede que a corte suspenda imediatamente a eficácia de trecho da norma, "como forma de evitar o esvaziamento das dezenas de condenações do caso", afirmou a PGR, em nota.

O ministro Luiz Fux foi sorteado para ser o relator, mas em razão do recesso do Judiciário o pedido da Procuradoria foi enviado à Presidência da corte para que o pedido de liminar (decisão urgente) seja deliberado pela ministro Rosa Weber, responsável pelo plantão.

Publicado na sexta (23) no Diário Oficial da União, o último indulto natalino assinado pelo atual mandatário tem um artigo inédito para contemplar o perdão a todos os PMs condenados pelo massacre ocorrido em 1992 e que matou mais de 100 detentos.

O decreto não cita nominalmente os policiais, mas o texto descreve circunstâncias que se encaixam à situação dos 74 condenados pelo assassinato dos presos.

Homenagem aos mortos no massacre do Carandiru feita em 2013 na frente da Faculdade de Direito da USP - Nelson Almeida - 8.abr.13/ AFP

O caso completou 30 anos em outubro deste ano e homicídio qualificado foi incluído no rol de crimes hediondos somente em 1994, dois anos depois do massacre.

Mais de trezentos agentes de PM de São Paulo foram enviados para conter uma rebelião no Pavilhão 9 da Casa de Detenção, no Complexo do Carandiru.

"O indulto natalino conferido pelo presidente da República aos agentes estatais envolvidos no caso do Massacre do Carandiru representa reiteração do Estado brasileiro no descumprimento da obrigação assumida internacionalmente de processar e punir, de forma séria e eficaz, os responsáveis pelos crimes de lesa-humanidade cometidos na Casa de Detenção em 02.10.1992", afirma Aras.

Para ele, o artigo 6º do decreto assinado por Bolsonaro viola a Constituição Federal ao beneficiar agentes de segurança condenados por crimes que não eram considerados hediondos no momento em que foram cometidos, caso do massacre em SP.

O chefe do Ministério Público Federal diz que essa aferição que deve ser feita não no momento da prática do crime, mas sim na data da edição do decreto.

"O decreto presidencial que concede o indulto natalino não pode alcançar os crimes que, no momento da sua edição, são definidos como hediondos, pouco importando se, na data do cometimento do crime, este não se qualificava pela nota de hediondez", afirma Aras.

No sábado (24), o procurador-geral de Justiça de SP, Mario Sarrubbo, havia enviado uma representação no MPF pedindo para que o órgão acionasse o Supremo.

Embora reconheça que o indulto é um ato político e que a Constituição confere ao presidente a liberdade para sua concessão, o PGR lembra que o decreto presidencial está sujeito às limitações impostas por tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja signatário.

De acordo com a Procuradoria, o Brasil ratificou a Convenção Americana de Direitos Humanos e está sob a jurisdição da CIDH (Corte Interamericana de Direitos Humanos).

No caso do massacre do Carandiru, a CIDH declarou o país responsável por graves violações a direitos humanos, expedindo uma série de recomendações a autoridades brasileiras.

Aras ente que conceder o benefício aos envolvidos no caso significa impunidade e afronta às decisões de órgãos de monitoramento e de controle internacionais relativos a direitos humanos, o que pode gerar a responsabilização do Brasil perante cortes internacionais.

"Indultar graves violações de direitos humanos consubstanciadas em crimes de lesa-humanidade significa ignorar direitos inerentes ao ser humano, como os direitos à vida e à integridade física", diz.

No dia em que o indulto foi publicado, Eliezer Pereira Martins, advogado que defende os policiais, disse não duvidar da abrangência do indulto. Ele afirmou ainda que pediria o trancamento da ação criminal contra os PMs com base no decreto.

"Não há o que comemorar. Meus clientes também são vítimas da política de Estado da época. Estão felizes, porquanto isso apenas os poupa das penas privativas de liberdade no final da vida, mas ainda sofrerão com os efeitos mantidos", afirmou o defensor.

Os policiais militares foram condenados a penas entre 48 a 624 anos, referentes a 77 assassinatos com armas de fogo.

O indulto presidencial não é a única possibilidade de perdão para os policiais envolvidos no massacre. A Câmara dos Deputados analisa um projeto que pode ter o mesmo efeito. O texto foi aprovado na Comissão de Segurança em agosto deste ano.

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