Descrição de chapéu CPI da Covid

Alvo da CPI da Covid, contrato da vacina Covaxin rende multa de R$ 15,6 mi

Ministério da Saúde aplicou punição por 'inexecução total' do negócio de R$ 1,6 bilhão para entrega do imunizante indiano

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Brasília

O Ministério da Saúde aplicou multa de R$ 15,6 milhões (US$ 3 milhões) pelo descumprimento de contrato de entrega de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin contra a Covid.

A pasta publicou nesta sexta-feira (17), no Diário Oficial da União, uma notificação à farmacêutica indiana Bharat Biotec, representada no contrato pela Precisa Medicamentos, sobre a multa, além da proibição de as empresas penalizadas entrarem em licitações da União por três anos.

Frasco da vacina Covaxin
Frasco da vacina Covaxin - Indranil Mukherjee/AFP

Na publicação desta sexta, a Saúde afirma que não conseguiu notificar, pelos Correios, os responsáveis pelo contrato e dá cinco dias para contestar a penalidade.

Procurado, o ministério disse que "a notificação da aplicação da penalidade é direcionada à contratada, por meio de sua representante". A Bharat anunciou em julho de 2021 que rompeu o acordo com a Precisa.

A compra da Covaxin por R$ 1,6 bilhão foi marcada por açodamento e pressão da cúpula da gestão de Eduardo Pazuello, ministro de Jair Bolsonaro (PL), para liberar a importação das doses, atropelando ritos sanitários, no momento em que o governo desdenhava de ofertas como a da Pfizer.

Procurada, a Precisa Medicamentos não se manifestou sobre a multa. A empresa afirmou, em 2021, que jamais praticou qualquer ilegalidade.

O negócio foi cancelado após o avanço das apurações da CPI da Covid. O governo chegou a reservar a verba, mas não desembolsou o valor da vacina, que jamais foi entregue.

A multa milionária se deve à "inexecução total do objeto do Contrato n° 29/2021", afirma a notificação da Saúde.

A existência de denúncias de irregularidades em torno da compra da Covaxin foi revelada pela Folha com a divulgação do depoimento sigiloso de Luis Ricardo Miranda, servidor do Ministério da Saúde, ao MPF (Ministério Público Federal).

No depoimento, o servidor relatou pressão "atípica" para liberar a importação da vacina.

A crise chegou ao Palácio do Planalto após o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), irmão do funcionário da Saúde, afirmar que o então presidente havia sido alertado por eles sobre as suspeitas de irregularidades. Bolsonaro teria respondido, segundo o parlamentar, que iria acionar a Polícia Federal, o que não ocorreu na ocasião.

O Ministério da Saúde manteve o contrato com a Covaxin mesmo sob alertas da área técnica da pasta, como sobre o prazo de validade dos lotes. A Precisa Medicamentos ainda tentou receber o pagamento antecipado de US$ 45 milhões por um lote do imunizante, o que não estava previsto no contrato.

A ministra Rosa Weber, do STF (Supremo Tribunal Federal), atendeu a PGR (Procuradoria-Geral da República) e arquivou, em abril de 2022, o inquérito sobre suposto crime de prevaricação de Bolsonaro na compra da Covaxin.

Nessa apuração, a Polícia Federal concluiu que não foi identificado crime, porque não havia dever funcional do presidente da República de "comunicar eventuais irregularidades de que tenha tido conhecimento" a órgão de investigação.

Outro ponto irregular na transação foi a garantia dada pela Precisa ao governo. Tratava-se de uma "carta de fiança" fidejussória (pessoal, não emitida por um banco ou uma seguradora), que era irregular, por não estar prevista no contrato.

A emissora da carta era a FIB Bank Garantias, que não é um banco e que já teve garantia negada na Justiça por falta de segurança jurídica. O ministério chegou a prever a dispensa de garantia para a compra da Covaxin.

A discussão sobre a compra da Covaxin também levou o líder do governo Bolsonaro na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), a prestar depoimento à CPI. O parlamentar negou à comissão ter atuado para favorecer a empresa.

Segundo o deputado Luís Miranda, foi o ex-presidente Bolsonaro que ligou Barros às supostas irregularidades ao saber das suspeitas que cercavam a compra da vacina. "Esse pessoal, meu irmão, tá foda. Não consigo resolver esse negócio. Mais uma desse cara [Barros], não aguento mais", teria dito Bolsonaro ao receber o parlamentar, relatou Miranda relatou à Folha.

Barros era ministro da Saúde em 2017, quando a pasta firmou contrato de R$ 20 milhões para compra de medicamentos de doenças raras, nunca entregues, com a empresa Global Gestão em Saúde —sócia da Precisa Medicamentos, que representava a Covaxin no Brasil.

O ex-líder de Bolsonaro, a Global e servidores da Saúde respondem a uma ação de improbidade por causa dos medicamentos não entregues. O MPF (Ministério Público Federal) aponta que houve favorecimento à empresa.

A CPI considerou que houve semelhanças no caso da Global e da Precisa Medicamentos.

"O esquema Precisa-Covaxin apresenta as mesmas características: benefício a uma empresa intermediária (que tem a Global em seu quadro societário), uso de documentos falsos no processo de compra, tentativa de recebimento de pagamento antecipado, invoice com informações erradas, conflito com as regas regulatórias da Anvisa, e o nome de Ricardo Barros, conforme informou o Deputado Luís Miranda na CPI", afirma o relatório final da comissão de inquérito.

Questionada se a multa também é resultado de possíveis irregularidades no contrato, a Saúde disse que "o referido processo sancionatório foi instaurado exclusivamente em decorrência da inexecução total do objeto por parte da empresa contratada, no bojo do processo de execução."

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