Autor de ataque a escola de SP está assustado, diz advogada da família

Defensora diz que adolescente de 13 anos não tem consciência dos efeitos jurídicos de seus atos; ele está internado na Fundação Casa

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Assustado. É assim que a advogada Rafaela Dantas classifica o estado do adolescente de 13 anos que atacou uma escola de São Paulo e está internado em uma unidade da Fundação Casa no Complexo Brás, no centro da capital.

"Ele é uma criança e não entende exatamente os efeitos jurídicos de sua conduta. Ele não queria estar na Fundação Casa", afirma Dantas.

Na manhã da última segunda (27), o jovem entrou na escola estadual Thomazia Montoro, na Vila Sônia (zona oeste), onde cursava o 8º ano do ensino fundamental, e matou a facadas a professora Elisabeth Tenreiro, 71. Também feriu outras cinco pessoas, incluindo três professoras.

Adolescente esconde rosto com casado ao aparecer na porta de delegacia acompanhado por agentes
Adolescente que esfaqueou professoras e colegas na escola Thomazia Montoro deixa delegacia após depoimento na segunda (27), dia do crime - Rubens Cavallari - 27.mar.23/Folhapress

A advogada representa o adolescente junto à Vara da Infância e da Juventude e também os pais do menor de idade —um homem que trabalha como segurança e uma secretária. Em entrevista à Folha, ela defende uma investigação profunda a fim de identificar eventuais aliciadores que podem tê-lo incentivado e ajudado a planejar o ataque.

Dantas conta que o jovem sempre se refere ao bullying que vinha sofrendo.

O adolescente relata ser alvo frequente de deboches nas escolas por onde passa. É ridicularizado por ser reservado e também pelo porte físico, sendo chamado por colegas de "feio" e de "rato de esgoto", por exemplo.

O adolescente conviveu com esse tipo de ofensa, diz a advogada, tanto no colégio onde o ataque foi concretizado, para onde havia sido transferido poucos dias antes do crime, como na escola estadual José Roberto Pacheco, em Taboão da Serra (Grande SP), onde estudou até o início de março.

Antes do atentado, o estudante deixou uma carta para a família na qual conta que passou dois anos planejando o ataque. No bilhete, endereçado à mãe, ao irmão, à avó e a uma tia, ele afirma que bullying, tristeza e ódio o levaram a fazer "uma besteira". O jovem pede desculpas por decepcionar os parentes e conta que escondeu da família o que sentia, exibindo um sorriso em vez de se expressar.

Na avaliação da advogada da família, falta treinamento aos professores para lidar com episódios que envolvam questões emocionais da criança e do adolescente. "O tema bullying tem que ser abordado nas escolas. Os professores também precisam ser abraçados nesta causa", afirma Dantas.

A profissional preferiu não dar detalhes sobre a relação do adolescente com a família. Também não quis dizer se o estudante passava por algum tratamento psicológico ou psiquiátrico.

Sabe-se, contudo, que o jovem faltou a duas consultas psiquiátricas agendadas a pedido da escola de Taboão. O Conselho Tutelar afirmou ter sido acionado pela unidade em 28 de fevereiro deste ano.

No mesmo dia, uma funcionária da escola registrou um boletim de ocorrência contra o aluno. No documento, o adolescente é descrito como alguém que vinha apresentando comportamento suspeito nas redes sociais, "postando vídeos comprometedores, por exemplo, portando uma arma de fogo e simulando ataques violentos".

O boletim registrou, ainda, ameaças que o jovem fez contra outros estudantes. "O aluno encaminhou mensagens e fotos de armas aos demais alunos por WhatsApp, e alguns pais estão se sentindo acuados e amedrontados", diz outro trecho do registro policial.

Um aluno de 12 anos da escola José Roberto Pacheco relatou à Folha que era amigo do adolescente agressor. Contou que eles costumavam jogar games online juntos, até que o jovem de 13 anos começou a fazer ameaças e a dizer que mataria o amigo e a mãe dele. A partir daí, a amizade foi cortada.

Na semana anterior ao ataque, no dia 23, o adolescente agressor deu um soco no rosto de um garoto mais novo, de 11 anos, na escola. De acordo com a mãe do aluno agredido, o agressor afirmou que estava "com raiva e precisava desestressar". Esse episódio somou-se a outro, também na semana passada, em que o adolescente fez ofensas racistas a um colega da mesma turma, dando início a uma briga que precisou ser apartada pela professora Elisabeth, que viria a morrer no ataque. "Vai ter volta", teria dito o estudante a ela, segundo relatos.

Para a professora Ana Célia Rosa, 58, gravemente ferida pelo adolescente, qualquer um que estivesse ali em seu lugar seria atacado. "Ele estava com raiva do mundo", disse à Folha a docente de história, que leciona para o 9º ano —portanto, não era professora do agressor. "Acho que foi aleatório, mesmo. Quem ele pegasse, ele machucaria."

Atingida no braço, a professora Rita de Cássia Reis, 67, disse que o autor do ataque era muito quieto e sempre usava fone de ouvido na sala de aula. Ela disse que não sabia do histórico de ameaças do jovem, que era seu aluno, mas declarou à polícia que o aluno arranjava muita briga com colegas.

O delegado Marcus Vinicius Reis, titular do 34º DP (Vila Sônia), onde o caso é investigado, disse que o adolescente afirmou em depoimento que tentou comprar uma arma de fogo pela internet, mas não conseguiu. O crime foi cometido com uma faca, e ele contou que treinava um ataque do tipo com uma tesoura e um travesseiro, em casa.

O jovem usava uma máscara de caveira no momento do crime. A balaclava da caveira é símbolo de grupos supremacistas americanos, que a exibem na internet, e o mesmo tipo de máscara foi usado tanto pelos atiradores do massacre de Suzano (SP), em 2019, quanto pelo adolescente que atacou duas escolas em Aracruz (ES), em novembro de 2022 —nesse último caso o agressor tinha também uma suástica nazista no braço.

Além disso, o autor do ataque na escola Thomazia Montoro usava nas redes sociais o sobrenome de um dos atiradores de Suzano.

A internação provisória na Fundação Casa foi determinada pela Justiça na terça (28). Ele responde pelas acusações de homicídio qualificado consumado, três tentativas de homicídio, agressão e injúria racialpraticada dias antes contra um colega. O Ministério Público também pede a punição do jovem por atos infracionais supostamente cometidos enquanto ele estudava em outra unidade escolar. O caso está em segredo de Justiça.

Para a advogada Rafaela Dantas, a polícia precisa investigar outras possíveis responsabilidades por trás desse tipo de crime.

"A gente está vendo uma questão midiática, no sentido de que em outros locais acontece o mesmo modus operandi. É isso que tem que ser investigado, e é para isso que eu vou querer respostas, de quem poderia estar por trás de tudo isso."

Colaboraram Isabela Palhares, Isabella Menon, Tulio Kruse e Mariana Zylberkan

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.