Descrição de chapéu Rio de Janeiro - Estado

Dois adolescentes são apreendidos no Rio por suspeita de estupro virtual no Discord

Polícia não informou se as famílias já indicaram advogados; plataforma diz combater ameaças à segurança infantil

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Rio de Janeiro

Dois adolescentes, de 14 e 17 anos, foram apreendidos nesta terça-feira (27) suspeitos de participarem de grupos de pornografia infantil no aplicativo Discord. As apreensões foram feitas pela Polícia Civil do Rio de Janeiro, na capital e em Volta Redonda, no sul fluminense.

De acordo com a corporação, os adolescentes são suspeitos de três crimes: associação criminosa; induzimento, instigação ou auxílio a suicídio; e estupro virtual. A polícia ainda não informou se as famílias dos jovens já indicaram advogados.

O estupro virtual se enquadra no artigo 213 do Código Penal, que tipifica o crime de estupro. O delito cometido virtualmente passou a ser entendido como tal a partir da mudança da lei, em 2009, que definiu estupro como ação de "constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso", não mais restringindo o crime à "conjunção carnal". A legislação não faz distinção entre o crime cometido de forma física ou virtual.

As investigações apontaram que o adolescente de 17 anos, que foi apreendido na zona oeste do Rio, é um dos principais líderes de um desses grupos do Discord. Segundo a Polícia Civil, líderes são aqueles que chantageiam meninas e que impõem desafios a outros participantes, como sacrificar animais.

Ícone do aplicativo Discord - AFP

Plataforma para conversas em texto, voz e vídeo, o Discord tem sido utilizado por grupos que incitam exploração sexual, pedofilia, automutilação, racismo, apologia do nazismo, maus-tratos de animais e incitação a assassinatos.

Procurado, o Discord disse que não comenta casos específicos. Em nota, a empresa afirmou que tem uma "política de zero tolerância para atividades que sejam potencialmente prejudiciais à sociedade". "Com nossos esforços para combater ameaças à segurança infantil, nós proativamente removemos cerca de 98% das comunidades que encontramos com materiais de abuso infantil no Brasil ao longo dos últimos seis meses", diz a nota.

Na segunda (26), um jovem de 19 anos foi preso temporariamente após se apresentar a uma unidade policial na zona norte de São Paulo. Segundo a SSP (Secretaria da Segurança Pública), ele é suspeito de envolvimento em crimes cometidos no Discord. Detalhes sobre o caso não foram divulgados.

A Polícia Civil do Rio afirma que, desde abril, mais de dez pessoas foram presas/apreendidas pela Polícia Federal e Polícia Civil dos estados no âmbito da operação Dark Room. No Rio, a DCAV (Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima) é quem está à frente do inquérito.

Segundo as investigações, três servidores da plataforma eram utilizados por um mesmo grupo de jovens e adolescentes de várias regiões do país para cometerem atos de extrema violência contra animais e adolescentes. Eles também divulgavam conteúdo com pedofilia, zoofilia e faziam apologia de racismo, nazismo e misoginia.

A Polícia Civil afirma que os agentes obtiveram vídeos publicados na plataforma em que animais são mutilados e sacrificados em desafios. Segundo a corporação, tais práticas eram exigidas para que demais membros ganhassem cargos, o que se traduzia em permissões dentro do grupo, por exemplo.

A maioria das ações era transmitida ao vivo em chamadas de vídeo dentro do Discord.

As investigações também mostraram que adolescentes eram chantageadas e constrangidas a praticarem atos sexuais em transmissões ao vivo. Elas também eram xingadas, humilhadas e obrigadas a se automutilar. Segundo a polícia, as vítimas chegaram a fazer cortes com navalha nos braços, pernas, seios e genitália.

As cenas eram gravadas, e os líderes do grupo ameaçavam compartilhar os vídeos em grupos no Telegram e outros aplicativos de mensagem. Essas ameaças serviam para chantagear as vítimas, mas, segundo a polícia, essa não era a úncia forma de fazê-lo.

Integrantes dos grupos conseguiam informações pessoais das vítimas em sites de banco de dados e consulta de crédito. A prática, de acordo com a Polícia Civil, é conhecida como "DOX". A partir dessas informações, os agressores começavam uma série de chantagens, afirmando que tinham fotos comprometedoras das adolescentes e que as enviariam para os pais delas caso não atendessem às ordens que davam.

De acordo com o promotor de Justiça Danilo Pugliesi, do Ministério Público de São Paulo, embora os grupos reúnam diferentes tipos de discursos de ódio, o que une os usuários é principalmente a misoginia. "Há um discurso de que a mulher é a causadora de todo o mal. Nos grupos, há os jovens afirmam ter dificuldades [com mulheres] em decorrência do empoderamento delas", afirma Pugliesi.

O uso do Discord por criminosos foi revelado em maio pelo Fantástico, da TV Globo, e confirmado pela Folha. Neste domingo (25), nova reportagem do programa revelou casos de usuários brasileiros da plataforma que violentaram e humilharam meninas menores de idade em transmissões ao vivo.

No fim de 2002, a Folha acessou grupos no Discord com milhares de participantes, sendo que o maior contava com mais de 3.000 —500 online no momento do acesso. No grupo eram compartilhadas cenas de extrema violência, exibidas em transmissões ao vivo.

O uso da plataforma por grupos de criminosos é investigado pelo Ministério Público de ao menos três estados —São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.

O Discord surgiu em 2015 e se popularizou para bate-papo durante games online, em grupos que misturam usuários adultos com menores de 18 anos.

Colaborou Isabella Menon, de São Paulo

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