Descrição de chapéu Obituário Paulo Dollis Barbosa da Silva (1979 - 2024)

Mortes: Protegeu seus parentes indígenas e fez o Vale do Javari ser conhecido no mundo

Paulo Marubo também ajudou nas buscas por Bruno Pereira e Dom Phillips, mortos em 2022 na região

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São Paulo

Paulo Dollis Barbosa da Silva, conhecido como Paulo Marubo, costumava dizer que era preciso "falar como os mais velhos". Era sua tática para tentar atingir consenso entre os indígenas do Vale do Javari, região no extremo oeste do Amazonas onde convivem sete etnias e o maior número de povos isolados no mundo.

Quando ele foi escolhido como uma liderança, o movimento indígena na região vivia um momento de abandono. A Univaja (União dos Povos do Vale do Javari) estava praticamente abandonada, os líderes enfrentavam dificuldades no atendimento de saúde às aldeias e não havia diálogo entre várias etnias locais.

Paulo e outros líderes então transformaram a entidade numa referência nacional. Seus representantes participaram de reuniões na ONU (Organização das Nações Unidas) e de reportagens de jornais internacionais.

.Paulo Dollis Barbosa da Silva, o Paulo Marubo (1979 - 2023)
Paulo Dollis Barbosa da Silva, o Paulo Marubo (1979 - 2024) - Marcelo Camargo/Agência Brasil

Ainda criança, Paulo começou a aprender a maneira de "falar como os mais velhos" com seu pai, José Barbosa, um cacique importante da aldeia Maronal —principal comunidade dos marubos. Por volta dos 12 anos ele já ouvia as reuniões de lideranças e conversas do cacique com visitantes, prestando atenção no que se dizia.

Segundo Varin Mema, sua cunhada, uma dessas reuniões de lideranças está gravada no documentário "Marubo: Uma Tribo da Amazônia" (1991), mostrando um jovem Paulo quieto e observador. Durante muitos anos ele foi professor de escolas indígenas no Vale do Javari.

Décadas depois, demonstraria um dom para transformar adversidades em oportunidades. Logo que Jair Bolsonaro foi eleito presidente, em 2018, Paulo se reuniu com coordenadores da Univaja e demonstrou preocupação.

"Ele disse: 'nós vamos enfrentar um governo totalmente maluco e fora do modus operandi normal da política e estamos ferrados nos rincões da Amazônia'", conta Beto Marubo, integrante da Univaja e sobrinho de Paulo.

Uma das primeiras providências foi, então, abrir uma representação da Univaja em Brasília, com Beto como seu representante. A partir disso, a Univaja passou a fazer contato com jornalistas, ativistas e órgãos que poderiam olhar para as dificuldades do Vale do Javari com mais atenção.

Durante a pandemia de Covid-19, foi essa articulação que garantiu equipamentos de saúde àquela e a outras terras indígenas. Paulo é citado como fundamental também para vitórias dos movimentos indígenas no STF (Supremo Tribunal Federal), especialmente a ADPF 709, que obrigou o governo federal a tomar medidas para barrar invasões e monitorar constantemente a situação dos territórios indígenas.

Paulo participou das buscas ao indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips quando ambos desapareceram no Vale do Javari, em 2022. Eles foram assassinados por acusados de invadir o território indígena.

Paulo Marubo morreu no dia 3 de fevereiro, após complicações de um quadro de hepatite, doença que ele combatia havia décadas. Nos últimos meses de vida, após considerar que havia completado seu trabalho no movimento indígena, pensava em concorrer a vereador. Ele deixa oito filhos e 11 irmãos.

coluna.obituario@grupofolha.com.br

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