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Metade das mulheres diz que já sofreu violência doméstica no Brasil

18% só se identificam como vítimas após serem apresentadas a situações específicas, aponta Mapa Nacional da Violência de Gênero divulgado na ONU

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Nova York

Praticamente metade das mulheres afirma que já sofreu violência doméstica e familiar no Brasil, de acordo com os dados do Mapa Nacional da Violência de Gênero divulgados nesta quinta-feira (14). Segundo o levantamento, 30% das entrevistadas dizem já terem sido alvos do crime; outras 18% se identificam como vítimas, mas só após serem apresentadas a situações específicas descritas como de violência.

O projeto, lançado em novembro do ano passado, é uma parceria entre o Observatório da Mulher Contra a Violência (OMV), o DataSenado, o Instituto Avon e a organização Gênero e Número. A atualização foi divulgada durante evento da Rede Brasil do Pacto Global da ONU, durante a 68ª Sessão da Comissão da Situação da Mulher das Nações Unidas, em Nova York.

Cartaz contra o feminicídio
Manifestação na avenida Paulista no Dia Internacional das Mulheres - Bruno Santos - 8.mar.2024/Folhapress

Daniela Grelin, diretora-executiva do Instituto Avon, explica que a pergunta é feita primeiro questionando quem sofreu violência doméstica nos últimos 12 meses. Nesse caso, 30% das entrevistadas respondem que sim. Em um segundo momento, quando o entrevistador descreve certas situações de violência —
se ela teve seus recursos financeiros retidos, por exemplo—, parte daquelas que haviam afirmado não terem sofrido violência se identificam como vítimas. Esse é o caso de 18% das respondentes, evidenciando o problema da subnotificação.

A pesquisa entrevistou por telefone mais de 21,7 mil brasileiras de 16 anos ou mais entre os dias 21 de agosto e 25 de setembro do ano passado. O levantamento aponta que um número maior de mulheres responde ter sido vítima de violência doméstica nos estados da região Norte. Enquanto nacionalmente esse percentual é de 48%, no Amazonas ele sobe para 57%, no Amapá, para 56%, em Rondônia, para 55%, e, no Acre, para 54%.

No Sudeste, Rio de Janeiro e Minas Gerais também têm níveis superiores à média nacional, ambos com 53%.

"Esse recorte por estado é inédito e muito importante, porque a violência doméstica tem contornos regionais, ela é experimentada no território", afirma Grelin à Folha.

A pesquisa também questionou mulheres sobre seu nível de conhecimento sobre a Lei Maria da Penha, a principal lei federal brasileira contra a violência doméstica. Segundo o levantamento, apenas 20% das entrevistadas se consideram bem informadas sobre a legislação.

"O conhecimento da lei é menor em estados onde a incidência é maior", resume Grelin. "Estamos falando principalmente de estados da Amazônia Legal, onde mulheres que ficam no interior são pouco assistidas por equipamentos públicos que entregam uma rede de proteção à mulher vítima de violência, onde elas são pouco alcançadas por campanhas de prevenção, onde impera o desamparo e a banalização da violência."

Quase 3 em cada 10 entrevistadas afirmam já terem solicitado medidas protetivas, um dos instrumentos previstos na lei. O percentual é maior no Rio Grande do Sul, onde 41% das vítimas de violência afirmam ter requisitado uma medida protetiva para sua segurança.

No caso do Rio de Janeiro, a presidente do Instituto Avon diz que há meses tenta fechar um acordo técnico com o estado para disponibilizar um programa que oferece acolhimento temporário a mulheres vítimas de violência que aguardam uma decisão da Justiça. Segundo ela, o programa, em parceria com a rede de hotéis Accor, existe em 20 estados.

A hipótese dela é que o Rio é um estado marcado de tal forma pela violência urbana e pela truculência da polícia que a segurança pública acaba vista com desconfiança.

Falando sobre o cenário brasileiro, ela aponta que a subnotificação da violência é consequência também do que chama de "desamparo aprendido". "A mulher vai no SUS e tem dificuldade de acessar seus direitos, vê seu filho sendo desrespeitado pela polícia na rua... Essa mulher tentou tantas vezes acessar seus direitos e foi negligenciada, revitimizada, que ela deixa de acreditar."

Nesse sentido, ela critica o fato de o Governo de São Paulo ter congelado a verba para combate a violência contra a mulher e aponta falta de recursos com esse objetivo em outros estados e nos investimentos filantrópicos do setor privado. "Há um subfinanciamento. A mulher é preterida nas políticas públicas, principalmente estaduais", diz.

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