Descrição de chapéu Obituário Fernando George Monteiro Naylor (1953 - 2024)

Mortes: Neurologista tocou gaita com Buddy Guy e B. B. King

Doctor Feelgood, como era conhecido no meio musical, também foi faixa preta de jiu-jítsu

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São Paulo

No intervalo de uma gravação em Chicago (EUA), ele avisou que gostaria de conhecer a Maxwell Street, a lendária rua da música urbana negra americana, onde se ouve blues na calçada.

Alertado para não ir, ele ignorou o conselho, chegou lá e na primeira encarada desconfiada, tirou seu cartão de visitas do bolso e começou a tocar. Nem bem terminou os primeiros acordes e o gaitista brasileiro era convidado a passar o dia ali.

Músico calvo segura gaita e um microfone em foto preto e branco
Fernando George Monteiro Naylor (1953 - 2024) - Leitor

Médico de formação e músico de vocação, o neurologista Fernando George Monteiro Naylor, o Doctor Feelgood, como ficou conhecido no meio musical, é apontado como um dos principais gaitistas de blues de sua geração no país.

Se apresentou com gente consagrada do Brasil e lá fora. Não tinha vergonha de pedir para subir ao palco, mesmo que o show fosse de algum popstar internacional.

Foi assim que tocou com Buddy Guy, no Legends, o bar do consagrado guitarrista e cantor americano, em Chicago, para onde viajava com frequência e se sentia enturmado.

Arrancou aplausos de 2.000 pessoas no antigo Palace, em São Paulo, quando pediu e foi atendido para dar uma canja ao lado do também guitarrista americano Albert Collins (1932-1993), segundo lembra a mulher Maria Thereza Martins Meirelles.

Nascido no Leblon, na zona sul do Rio de Janeiro, e filho de neurologista, Naylor e o irmão seguiram a carreira do pai. Mudou-se para São Paulo com a mulher —que conheceu numa vernissage— e os três filhos, quando passou em primeiro lugar em um concurso no Hospital das Clínicas.

"O Fernando era muito pragmático, corria atrás de tudo que queria e se destacava em tudo que fazia", afirma Maria Thereza.

Como médico, fez sólida carreira. É apontado como um dos maiores especialistas brasileiros em doença de PAF, a polineuropatia amiloidótica familiar.

Ultimamente trabalhava no hospital São Paulo, na zona sul da capital paulista, e sempre tinha uma gaita escondida no bolso do jaleco. "Ele dizia que, de repente, o paciente poderia gostar de blues", brinca a filha Marina Meirelles.

Homem de hábitos simples, gostava de artes marciais e era faixa preta de jiu-jítsu.

Mas o bluseiro tinha na música o seu hobby. Comum era ouvi-lo tocar em casa "Hoochie Coochie Man", o clássico de Muddy Waters (1913-1983).

Qualquer congresso médico era pretexto para comprar gaitas, microfones e amplificadores importados —e, claro, para procurar algum lugar diferente para tocar.

"Quando acabava uma gravação, eu ia jantar e descansar, porque precisava criar material para o dia seguinte, enquanto ele ia a todos os bares da cidade, tocando com todo mundo", conta o guitarrista Andre Christovam, um dos grandes parceiros do gaitista e que recentemente publicou um vídeo dos dois na gravação do disco "The 2120 Session", em 1991.

"Nesta noite vou levitar na cama, se você olhar para o lado e eu não estiver deitado, é porque estou levitando", afirmou à mulher, em referência à emoção após tocar com B.B.King (1925-2015) pela primeira vez.

Doctor Feelgood morreu no último dia 16 de março, aos 70 anos, vítima de infarto. Deixou a mulher Maria Thereza, os filhos Marina, Marcelo e Daniela e quatro netos.

coluna.obituario@grupofolha.com.br

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