Descrição de chapéu Chuvas no Sul DeltaFolha

Cidades do RS foram atingidas por chuva até dez vezes maior que a média histórica

Quase todas as estações do Inmet no estado registraram volume de água muito superior ao de anos passados

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São Paulo

Cidades do Rio Grande do Sul registraram nas últimas semanas um volume de chuva até dez vezes superior à média histórica. É o que aponta uma análise da Folha com dados do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) referentes ao período de 25 de abril a 14 de maio.

Das 45 estações pluviométricas com dados disponíveis no estado, 44 registraram aumento na comparação com o mesmo período de anos anteriores —a exceção foi o ponto de coleta localizado na cidade de Uruguaiana. Em 42 delas, as chuvas de 2024 equivalem ao dobro da média histórica ou mais.

Ponte afetada pelas inundações na estrada Mundo dos Vinhos, em Caxias do Sul, no estado do Rio Grande do Sul. O número de mortos pela tragédia climática que se registra há 13 dias aumentou para 136, com 125 desaparecidos e 339.925 evacuados, segundo o balanço divulgado no sábado pela Defesa Civil
Ponte afetada pelas inundações na estrada Mundo dos Vinhos, em Caxias do Sul, no estado do Rio Grande do Sul. O número de mortos pela tragédia climática que se registra há 13 dias aumentou para 136, com 125 desaparecidos e 339.925 evacuados, segundo o balanço divulgado no sábado pela Defesa Civil - Claudia Martini/Xinhua

O maior aumento foi o observado em Caxias do Sul, na Serra Gaúcha. A cidade registrou em média 45 milímetros por dia de 25 de abril a 14 de maio deste ano, o equivalente a 11 vezes o volume médio (4,09 mm) nos anos anteriores com dados disponíveis (de 1961 a 2023).

A média diária jamais havia superado a marca de 10 mm no município ao longo dessas seis décadas. O recorde anterior era de 9,44 mm, registrado no ano de 2022.

Além de Caxias, o ranking das cidades com as maiores disparidades em relação às próprias médias históricas é encabeçado por Bento Gonçalves (9,9 vezes), Santa Maria (8,2 vezes), Canela (8,1 vezes) e Soledade (7,9 vezes). O período com dados disponíveis varia entre as estações analisadas.

Todas essas cinco cidades estão na bacia hidrográfica dos rios que deságuam no lago Guaíba, e apenas Santa Maria não está localizada na Serra Gaúcha.

Em volume de chuvas neste ano, as maiores médias foram as registradas em Caxias (44,98 mm por dia), Bento Gonçalves (41,82 mm), Canela (41,56 mm), Serafina Correa (38,13 mm) e Soledade (37,4 mm).

Caxias registrou oito óbitos em decorrência das fortes chuvas nas últimas semanas, além de uma pessoa desaparecida.

Apesar do forte volume de chuva, o município não sofreu tanto com alagamentos quanto outras cidades, como Porto Alegre. Segundo a prefeitura, a parte urbana de Caxias possui uma estrutura de piscinão em áreas que costumavam alagar, por isso a água foi escoada com certa rapidez.

A gestão municipal calcula que, apesar do estrago em asfaltos e pontes, cerca de 70% dos danos das chuvas foram registrados em áreas rurais e encostas. Além disso, há risco de desmoronamento em alguns pontos. No bairro de Galópolis, por exemplo, 220 famílias tiveram que ser retiradas de suas casas por causa disso.

Além das questões estruturais, o que contribui para que a cidade não tenha sofrido tanto com as enchentes é o relevo. Por estar localizada em cima da serra, os rios são inclinado e, mesmo com aumento no nível da água, ela escoa com facilidade.

Josélia Pegorim, meteorologista do Climatempo, aponta ainda que as águas que caíram sobre as cidades serranas foram em parte para o solo, e o restante para regiões mais baixas. Os principais rios que cortam os vales do Jacuí e Taquari, por exemplo, nascem nas serras.

"Um vale, geograficamente é uma região abaixo de áreas altas, por onde passa um rio. Os rios nestes vales receberam não só a água que veio da Serra Gaúcha como a chuva forte que caiu no próprio local. Há muitas cidades que foram construídas nas áreas naturais de várzea, de alagação dos rios", diz ela.

Josélia também alerta para o futuro da região. "Não foi a primeira e nem será a última vez que os vales tiveram enchente grave. As cidades não podem ocupar a área natural de alagação do rio quando transborda."

Estael Sias, meteorologista do MetSul, explica que essa geografia explica a situação do lago Guaíba, que margeia Porto Alegre e subiu até 5,33 m no dia 5 de maio, o maior nível desde 1941. "Não choveu tanto nele, mas toda a chuva que acontece nas áreas do norte do estado desceram para os vales, entraram nos rios e agora vão desaguar no Guaíba".

"O relevo tem esse papel importante, não necessariamente a cheia de um rio é a chuva que acontece em cima, mas ao longo da nascente, dos afluentes. A serra, a inclinação, tem um papel importante nisso também."

O Guaíba tem registrado queda do nível da água esta semana e apesar de estar com o volume abaixo dos 5 metros, a situação ainda é problemática —ele é considerado em cota de alerta quando atinge 2,5 metros e de inundação com 3 metros.

Assim, a expectativa é que a inundação em Porto Alegre continue até o fim de maio. A Defesa Civil do Rio Grande do Sul divulgou na noite de quinta-feira (16) um alerta para a continuidade da elevação dos níveis da lagoa dos Patos, para onde a água do Guaíba escoa.

Em previsão atualizada, o IPH (Instituto de Pesquisas Hidráulicas) da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) indica cheia duradoura, com redução lenta dos níveis do Guaíba abaixo dos 5 metros.

METODOLOGIA

A reportagem analisou os dados das estações automáticas e convencionais do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) no Rio Grande do Sul. Foram consideradas as medições diárias de chuva de 25 de abril a 14 de maio para todos os anos disponíveis.

Para a análise, foram descartados os anos em que a respectiva estação apresentou mais de 5 dias ausentes no período ou 3 dias consecutivos ausentes (isto é, sem dados registrados por falha técnica ou desativação).

A análise também desconsiderou as estações que não tinham dados deste ano ou cujos dados de 2024 foram descartados na etapa anterior. Por fim, foram ignoradas ainda as estações que não tivessem pelo menos cinco anos de dados disponíveis após as etapas anteriores.

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