Descrição de chapéu STF

STJ julga liberação de maconha medicinal e industrial, e entidade prevê Brasil como maior produtor

Relatora convocou audiência pública; tribunal deve julgar ainda em 2024 a liberação do plantio para esses fins

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Brasília

O STJ (Superior Tribunal de Justiça) deve julgar ainda neste ano se libera a plantação de maconha para fins exclusivamente medicinais e industriais.

A corte e instâncias inferiores da Justiça têm permitido de maneira isolada o cultivo da planta. Agora, a 1ª Seção do segundo tribunal mais importante do país decidirá se dá uma autorização geral para a produção de remédios e produtos à base de Cannabis.

Na foto, posa com plantas de cannabis em uma chácara nos arredores de Brasília
Um dos fundadores do Natiruts, Luís Maurício posa com plantas de maconha nos arredores de Brasília; ele é presidente da Associação Brasileira de Cannabis e Cânhamo Industrial - Pedro Ladeira/Folhapress

O processo em questão discute a liberação da planta com baixo teor de tetrahidrocanabinol, o THC, que é o princípio ativo com propriedades psicotrópicas.

Um dos principais porta-vozes da causa é o baixista e um dos fundadores da banda de reggae Natiruts, Luís Maurício. Ele é presidente da Associação Brasileira de Cannabis e Cânhamo Industrial e vai se dedicar integralmente à entidade após o último show do grupo, marcado para dezembro.

Estima-se que existam mais de mil produtos feitos à base de maconha. A montadora Kia, por exemplo, lançou recentemente um carro cujo painel foi feito com fibras do cânhamo.

Maurício cita um estudo da empresa Kaya Mind, que atua no setor, sobre o potencial do Brasil de se tornar o maior produtor de maconha industrial e medicinal do planeta, superando a China. A projeção é de que, caso esse mercado seja autorizado, o país possa movimentar R$ 26 bilhões por ano, com a geração de 328 mil empregos.

Um dos argumentos favoráveis à liberação desse mercado no Brasil envolve justamente o fato de a China, mesmo com uma política proibicionista de drogas, ter uma grande produção de cânhamo.

A relatora do processo no STJ é a ministra Regina Costa. Ela convocou uma audiência pública sobre o tema em abril deste ano com entidades e especialistas favoráveis e contrários à liberação.

A magistrada afirmou que a audiência era necessária por se tratar de tema com relevância jurídica, econômica e social. O processo será julgado pela Primeira Seção do STJ, composta por dez ministros.

Alguns integrantes da corte vêm dando decisões favoráveis ao plantio nos últimos anos. Em julho, por exemplo, o vice-presidente do tribunal, ministro Og Fernandes, no exercício da presidência, concedeu um salvo-conduto a um paciente com ansiedade e depressão para que pudesse plantar maconha sem o risco de sofrer uma sanção criminal.

Ele autorizou o cultivo doméstico da Cannabis sativa para extração de óleo medicinal após o TJ-MG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais) ter negado o pedido. O paciente alegou ao STJ que tem autorização da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para a importação do óleo, mas que o produto é muito caro, o que justifica a necessidade de cultivo caseiro.

Og Fernandes afirmou que a jurisprudência das duas turmas de direito penal do STJ determina que plantar maconha para fins medicinais é conduta atípica, ou seja, não se trata de crime por não haver uma regulamentação nesse sentido.

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Luís Maurício defende a liberação do plantio de cannabis para fins medicinais e industriais - Pedro Ladeira/Folhapress

Os desafios enfrentados pelas famílias para obter essas autorizações foi determinante para o envolvimento do músico Luís Maurício com a causa.

"Há uns anos comecei a me engajar pelo tratamento medicinal, comecei a ver a luta de muitas mães de filhos com epilepsia e que o medicamente que resolvia era o canabidiol", diz.

Ele afirma que, como presidente da associação, sua função é explicar à população as diferenças entre as finalidades da planta.

"É um trabalho educativo, para as pessoas saberem que o cânhamo é uma planta que não é psicoativa, tem apenas 0,3% de THC, mas é rica em CBD. Você pode extrair o óleo para fazer medicamentos e pode usar a fibra para inúmeras coisas, gerar receitas de várias formas", afirma.

Integrante do Ministério Público de Minas Gerais, André Estevão Ubaldino foi um dos que usou a tribuna do STJ na audiência pública para criticar a possibilidade de liberação.

Ele afirmou que não há evidências de que os benefícios da maconha superem os malefícios e disse ter conversado com os médicos Frederico Garcia, professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), e Ronaldo Laranjeira, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). "Contatei especialistas e perguntei se a preponderância de efeitos positivos sobre negativos já foi comprovada e me responderam que o consenso é no sentido contrário."

Disse ainda que, segundo engenheiros ambientais, não é possível controlar a área em que haverá plantação. "Não existe essa possibilidade porque, segundo profissionais, a propagação do plantio dá-se por força do vento, da água e da ação da fauna. Roedores e aves estenderão o plantio para muito além da área eventualmente autorizada".

Luís Maurício ressalta que diversas pessoas já conseguiram autorização para o plantio, mas que é necessária uma decisão mais ampla nesse sentido.

"Precisamos democratizar o uso desse remédio, fazer chegar para todo mundo, com a gente produzindo aqui, barateando o processo. Atualmente o acesso é elitizado, pois é necessário ter um advogado, buscar um habeas corpus, fazer um procedimento que não é acessível a todos. Ideal é ter uma autorização para cultivo dentro da agricultura familiar também", avalia.

Em junho, o STF (Supremo Tribunal Federal) concluiu a ação que tratou da descriminalização do porte de maconha para uso pessoal e fixou a quantidade de até 40 gramas ou seis plantas fêmeas para diferenciar usuários de traficantes. Essa definição é válida até que o Congresso encare o tema.

Os parâmetros devem servir de critério para as autoridades policiais, que também devem levar em conta outros fatores para decidir se uma pessoa é traficante.

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