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Turma do STJ decide que consentimento inicial para sexo não afasta estupro

Ministros entendem que lei não prevê forma específica de negativa e que liberdade sexual envolve possibilidade de interromper relação; cabe recurso

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Brasília

A 6ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu que, para o reconhecimento do crime de estupro, basta qualquer manifestação da vítima não atendida pelo agressor, a qualquer momento do ato sexual.

Segundo a decisão, mesmo que tenha havido consentimento no início e que a negativa posterior não seja enérgica ou drástica, fica configurada a violência. Isso porque a legislação não prevê uma forma específica para que seja caracterizada a relação sexual não consensual.

Assim, não é exigido da vítima, nesses casos, uma postura particular no sentido de interromper o ato sexual.

Fachada do Prédio sede do STJ (superior Tribunal de Justiça), em Brasília - Pedro Ladeira - 18.ago.2023/Folhapress/Folhapress

O entendimento foi adotado por maioria de votos na sessão da última terça-feira (13). O colegiado reformou a decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e restabeleceu a sentença que condenou um homem a seis anos de reclusão por estupro. O caso corre sob sigilo pela natureza do crime.

A segunda instância absolveu o homem por entender que, embora a mulher tivesse se recusado a seguir no ato sexual, não ficou comprovado que essa discordância se deu de forma enfática o suficiente a ponto de ser percebida pelo réu.

O ministro Sebastião Reis Junior disse, no julgamento, que o dispositivo do Código Penal que tipifica o delito de estupro não exige determinado comportamento ou forma de resistência da vítima.

"Exige sim, implicitamente, o dissenso, o que restou comprovado nos autos", afirmou.

No caso concreto, ainda cabe recurso contra a decisão do STJ.

No voto, o ministro disse que, no crime de estupro, o constrangimento pode se dar por violência ou grave ameaça. No caso em discussão, a vítima declarou ter dito ao réu que não desejava seguir na relação íntima, mas, mesmo após ouvir o "não", ele continuou mediante força física.

De acordo com o ministro, a concordância e o desejo inicial têm que durar durante toda a relação, já que a liberdade sexual pressupõe a possibilidade de interromper o sexo.

"O consentimento anteriormente dado não significa que a outra pessoa pode obrigá-la à continuidade do ato sexual. Se um dos parceiros decide interromper a relação sexual e o outro, com violência ou grave ameaça, obriga a desistente a continuar, haverá a configuração do estupro", afirmou.

Da mesma forma, o crime também está configurado mesmo se a vítima, após a resistência inicial, se submeteu ao ato, apenas aguardando que terminasse. Reis Junior disse que não é incomum que a vítima fique passiva depois de perceber que não será capaz de impedir o ato.

Conforme processo, a mulher do caso em questão percebeu que não teria força para impedir o ato e apenas esperou "que a violência chegasse logo ao fim".

O ministro rebateu ainda outro argumento do tribunal local, segundo o qual após o crime, a vítima teria trocado mensagens com o agressor, o que descaracterizaria o estupro. Para o magistrado, a visão tem "viés desatualizado e machista da situação".

Sebastião Reis Junior entende que o contato pode indicar que a vítima buscou mecanismos para diminuir o "peso errôneo da culpa", ou mesmo para sobreviver física e mentalmente à violência à qual foi exposta.

"Se tal pensamento fosse a solução certeira para o caso, não se caracterizaria o delito de estupro quando mulheres são subjugadas, dentro do lar, por seus maridos e companheiros à violência sexual, porque, mesmo dissentindo claramente do ato, submetem-se de maneira passiva aos desejos sexuais do consorte por inúmeros e inimagináveis motivos, como dependência financeira, emocional, forma de criação, pela cultura patriarcal enraizada em nossa sociedade, que vê o homem como uma figura que deve ser servida, temida e obedecida a todo instante pela mulher", disse o ministro.

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