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A cadeia de valor do negócio de impacto social

Não dá para escolher fornecedores que têm trabalhadores em situação de escravidão ou que não gerenciam resíduos por um menor preço

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Marcus Nakagawa

Professor e coordenador do Centro ESPM de Desenvolvimento Socioambiental, autor premiado com o Jabuti 2019, palestrante e idealizador da Abraps e do Dias Mais Sustentáveis.

Tenho conversado e debatido sobre as questões do ESG e da sustentabilidade empresarial que, cada vez mais, estão inseridas nas grandes empresas.

A temática abrange a boa gestão dos públicos de relacionamento, ou stakeholders, que neste caso são fornecedores, colaboradores, acionistas, distribuidores, consumidores, enfim, todos aqueles que influenciam ou podem ser influenciados pela empresa.

Aliás, a palavra “influenciador” está na moda. Tempos atrás chamávamos estes de formadores de opinião e sempre se buscava convivência para uma boa imagem e reputação, uma relação em que todos ganham.

Esta gestão de stakeholders ganhou relevância no Fórum Econômico Mundial, ano passado, com a terminologia "economia dos stakeholders", em que as empresas precisam gerar valor não somente para acionistas ou consumidores, mas para todos os públicos de contato da companhia.

Em 2011, Porter e Kramer cunharam a expressão "criação de valor compartilhado", afirmando que o “princípio do valor compartilhado envolve a geração de valor econômico de forma a criar também valor para a sociedade com o enfrentamento de suas necessidades e desafios”. Os autores também dizem que “é preciso reconectar o sucesso da empresa ao progresso social”.

Muito bacana, não é? Pensar na empresa não somente como um vetor que gera valor econômico para o acionista, mas para todos.

Na verdade, se pegarmos a história da administração, veremos que lá no início as empresas eram criadas para gerar soluções para a sociedade. Precisamos descobrir em que momento a verdadeira “missão” acabou se desvirtuando.

Os negócios de impacto social vêm para focar nestas necessidades da sociedade que não estão sendo atendidas. Segundo o Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), esses empreendimentos têm a missão explícita de gerar benefícios sociais e/ou ambientais ao mesmo tempo em que proveem resultado financeiro positivo e de forma sustentável.

Estes negócios buscam atuar nos grandes desafios do país e do mundo, como a fome, desigualdade, educação, saúde, moradia, entre outros.

Gosto de falar, nas minhas aulas, que estes negócios nascem para resolver algum dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da ONU, este grande sonho comum da humanidade. Tá, mas o que tem a ver a cadeia de valor com isso?

Tem tudo a ver, pois não adianta um negócio de impacto social ou ambiental ter um superproduto ou serviço que está melhorando a vida de muitas pessoas ou regenerando o meio ambiente, se sua cadeia de valor está impactando negativamente o mundo.

Ou seja, você, empreendedor social, melhora o mundo e as pessoas, enquanto sua cadeia de fornecedores e distribuidores está sujando, maltratando ou ferindo.

Obviamente estou exagerando, mas você sabe quem, efetivamente, é o seu fornecedor? E o fornecedor do seu fornecedor? E o seu distribuidor? E para qual ponto de venda está indo seu produto mais socialmente inclusivo ou ambientalmente correto?

No momento da tomada de decisão de quais parceiros e fornecedores da cadeia de valor serão necessários e que tipos de serviços, materiais, produtos ou insumos estes oferecerão, será necessário buscar e selecionar parceiros que sigam a mesma filosofia do negócio de impacto.

Não dá para escolher uma empresa que parece ter trabalhadores em situação análoga à escravidão ou, ainda, que não gerencia seus resíduos, não paga impostos ou que não segue as leis do estado só por um menor preço.

Todos já vimos notícias de empresas que foram “canceladas” pelos consumidores com problemas assim. A situação será ainda mais grave se isso acontecer com algum negócio de impacto social ou ambiental.

Esses são alguns dos indicadores de ESG que são cobrados, auditados e controlados nas organizações multinacionais que têm capital aberto na bolsa de valores, por exemplo.

A gestão dos fornecedores, distribuidores e toda a cadeia de valor é fundamental para que o negócio de impacto possa cumprir sua missão plenamente. Num mundo ideal, devemos buscar empresas fornecedoras que também sejam de impacto social.

Nos sites das redes de empresas como o Sistema B, a plataforma Pipe Social ou os vencedores do Prêmio Empreendedor Social, por exemplo, é possível encontrar uma lista com várias empresas e organizações com vertente mais social ou ambiental, que têm o “tal” do propósito.

Quem sabe você, que já tem um negócio de impacto, ou está pensando em empreender, encontre uma boa parceria de negócio nestas redes.

Para ajudar um pouco mais, no livro "Negócios de impacto socioambiental do Brasil: como empreender, financiar e apoiar”, que tem download gratuito, eu e a minha querida orientadora e amiga, Sylmara Dias, fizemos um capítulo específico sobre o desenvolvimento da cadeia de valor, com todos os conceitos e alguns exemplos sobre a temática.

Precisamos fortalecer ainda mais a rede de contatos e stakeholders de empresas de impacto social e ambiental. Desenhar um sistema produtivo com regeneração para um desenvolvimento sustentável.

Mais que isso: incluir estes negócios nas cadeias das grandes empresas e influenciar todas as outras médias e pequenas. Enfim, ajudar no ESG das empresas por meio de parcerias e fornecimentos de produtos e serviços mais inclusivos, sustentáveis e diversos.

A teia do impacto socioambiental precisa começar a expandir e conectar todos os tipos e tamanhos de organizações e empresas. Com isso, um dia, não precisaremos mais separar as temáticas em ESG, negócios sociais, responsabilidade social corporativa, ONGs, investimento social privado, sustentabilidade organizacional, filantropia, finanças sociais, terceiro setor etc.

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