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Mutirão tira da fila pacientes que esperam até cinco anos por bariátrica

Cinquenta pessoas obesas passaram por videolaparoscopia, técnica menos invasiva e dolorosa que as cirurgias abertas, que são de praxe no SUS

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São Paulo

Em dois dias, 50 pessoas obesas saíram da fila da bariátrica para a mesa de cirurgia no SUS. Elas foram operadas por médicos voluntários com técnica minimamente invasiva, com pequenos cortes na barriga, ao invés da cirurgia aberta que é praticada no sistema público de saúde.

"É menos dor, menos remédio, menos internação e o leito gira mais rápido com a videolaparoscopia", diz Luiz Vicente Berti, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica e um dos voluntários no mutirão.

Apesar de o procedimento por vídeo ser oferecido pelo SUS desde 2017, 93% das cirurgias bariátricas no Brasil ainda são feitas com cortes de até 20 cm no abdômen do paciente.

homem obeso usa regata azul e está sentado em cama, ele segura sua muleta, atrás há uma parede rosa
Joacyr Alves, 58, fará cirurgia bariátrica em abril e está mais calmo com procedimento por videolaparoscopia - Karime Xavier / Folhapress

"O SUS autoriza, mas paga a mesma coisa [nas duas técnicas]", diz o médico. "Fica um saldo em torno de R$ 1.500 por cirurgia, mas na ponta do lápis dá no mesmo, porque o paciente sai mais rápido do hospital, o que gera menos custo para o sistema."

Os pequenos cortes, menores que 1 cm, para introdução da câmera e das pinças que vão reduzir o tamanho do estômago, tornam a recuperação acelerada e menos dolorosa. Condição essencial para a perda de peso que virá a seguir.

Essa é a esperança de Joacyr Alves, 58, de Caieiras (SP). Ele está a poucos dias de fazer bariátrica na Santa Casa de São Paulo. "Quero voltar a trabalhar logo e fiquei muito mais calmo em saber que minha cirurgia será por vídeo."

homem está sentado em cadeira em cozinha, ele segura suas muletas olhando para o lado, há móveis de cozinha do outro lado
Morador de Caieiras (SP), Joacyr Alves, 58, utiliza ambulâncias municipais para cobrir trajeto de 37km até Santa Casa de São Paulo - Karime Xavier / Folhapress

Na fila desde fevereiro de 2020, estava com exames vencidos e não pôde operar no mutirão, em março. A data ficou acertada para 14 de abril.

"Além dos 145 kg, tenho certa idade, tive três infartos e tenho problema no joelho", conta ele. "O sobrepeso incomoda de tudo que é jeito."

Em novembro de 2021, mais de 5.000 pessoas aguardavam na fila da bariátrica só em São Paulo, segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde. Na pandemia, houve redução de 82% no número de cirurgias deste tipo realizadas pelo SUS em todo o país –de 12.568, em 2019, para 2.296 em 2021.

"Para entrar na fila são pelo menos dois anos, mais dois ou três para operar", diz Vicente Berti.

O mutirão aconteceu nos dias 3 e 4 de março em hospitais de São Paulo, Curitiba, Bahia e Recife com apoio de uma empresa que doou 500 equipamentos e emprestou dez torres de vídeo. É nelas que profissionais de saúde observam o que está sendo manipulado no interior do abdômen.

mulher com roupa cirúrgica manuseia equipamento em sala com computadores e monitores, há uma mesa à sua frente com instrumentos cirúrgicos
Instrumentos utilizados em cirurgia bariátrica por videolaparoscopia, técnica minimamente invasiva - Divulgação/Medtronic

"Tudo no ambiente cirúrgico é sofisticado", diz Felipe Barreiro, vice-presidente da Medtronic no Brasil, líder global em tecnologia na saúde, que cedeu os equipamentos. "Quisemos beneficiar pessoas sem acesso às melhores técnicas, pois sabemos que a dependência do SUS é alta e os recursos são limitados."

Os 50 pacientes selecionados passaram por avaliação dos médicos especialistas, que priorizaram aqueles com saúde mais vulnerável por conta da obesidade.

O sobrepeso incomoda de tudo que é jeito.

Joacyr Alves, 58

Paciente à espera da cirurgia bariátrica

Joacyr, que chegou a pesar 165 kg, não anda longas distâncias e tem dores no quadril. "Não tem mais cartilagem, está batendo osso com osso, mas me pediram para fazer a bariátrica primeiro", diz ele.

O sofrimento físico se soma à dor emocional de acompanhar pouco o desempenho da filha, de 16 anos, que é atleta de judô.

"Às vezes não vou para o torneio porque não consigo subir no ônibus e no ginásio não tem acomodação."

Para fazer todos os exames, passar por psicólogo e endocrinologista em São Paulo, a 37 km de sua casa, Joacyr pega carona nas ambulâncias municipais.

"Saio na primeira, às 5h, seja qual for a hora da consulta. Houve dias em que cheguei em casa às 20h."

Com o mutirão, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica quer mostrar que a videolaparoscopia é mais segura para todo o sistema de saúde.

"Foi através da pressão popular que a bariátrica chegou ao SUS", diz Vicente Berti. "Nem é mais ético indicar a cirurgia aberta e a maior fonte de cobrança é a população, que pode questionar e exigir seus direitos."

Nem é mais ético indicar a cirurgia aberta

Vicente Berti

Vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica

O assunto foi debatido em audiência pública na Câmara dos Deputados, em novembro de 2021.

"Vivemos um momento de restrição orçamentária", disse Aline Lopes, representante da coordenação de atenção especializada em saúde do Ministério da Saúde, na ocasião.

"Esse movimento é precedido de uma análise econômica de impacto orçamentário, tanto do valor necessário para cobrir quanto da viabilidade financeira."

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