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Culpa por comer pode atrapalhar relação com a comida e resultados da dieta

Influenciadora sugeriu consumo de pepino com gelatina para diminuir desejo por doces

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Ribeirão Preto

A culpa em relação à ingestão de alimentos pode atrapalhar o emagrecimento. Associar o sentimento ruim à comida pode provocar ansiedade e comportamentos compulsivos, além de estimular a busca por medidas compensatórias ineficazes.

É o caso do pepino salpicado com gelatina em pó sem açúcar sugerido pela youtuber Kéfera Buchmann para substituir doces e não fugir da dieta. Sem nenhuma comprovação de que a combinação "exótica" de fato gere saciedade, a influencer afirmou em um vídeo em suas redes sociais que trata-se de uma "estratégia" para lidar com a compulsão alimentar.

Na fala, ela diz ainda que o conjunto inusitado tem "zero caloria, é superdoce e enche barriga".

Profissionais de saúde mental e nutrição, porém, defendem que táticas assim podem ser perigosas no dia a dia.

"A culpa ao alimentar-se pode gerar preocupação exacerbada nas refeições. Algumas pessoas podem achar que deve-se passar a diminuir a quantidade de alimentos ou a pular refeições na tentativa de se adequar a exemplos inadequados expostos na mídia", afirma o médico Fábio Salzano, vice-coordenador do Programa de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Kéfera sugere pepino com pó de gelatina para satisfazer desejo por doces
Kéfera sugere pepino com pó de gelatina para satisfazer desejo por doces - X (@tretanews)

O psiquiatra reforça que, muitas vezes, as pessoas seguem recomendações feitas por pessoas leigas, sem nenhuma formação adequada na área da saúde e da nutrição, e acabam se deixando levar por erros conceituais sobre o que de fato funciona para emagrecer.

"Os doces podem ser parte de um plano alimentar, mas a quantidade e frequência devem ser adaptadas pelo nutricionista para cada indivíduo, a não ser que haja alguma condição médica. Quando uma pessoa que não tem formação em nutrição ou medicina divulga maneiras de se alimentar, corre-se o risco de pessoas desavisadas tomarem essas opiniões como as únicas a serem realizadas no desejo de mudar hábitos alimentares", diz Salzano.

Sentir culpa por comer, portanto, atrapalha a relação geral com a comida, segundo a nutricionista Daniela Cierro, vice-presidente da Associação Brasileira de Nutrição (Asbran). "Não é normal sentir culpa ao comer, mas frequentemente observamos essa relação nos processos de emagrecimento."

A nutricionista conta que a associação da comida com algo negativo pode ser desencadeada por diversos fatores, desde escutar falas inadequadas sobre o corpo até ligar certos alimentos a alguma forma de punição.

"O alimento é fundamental à vida e está diretamente relacionado ao campo social, cultural e emocional. O ato de comer gera de forma individual significados que podem produzir boas memórias familiares, assim como sensações não prazerosas, que podem levar a sentimentos como a culpa", avalia Cierro.

Cierro diz que emoções negativas interferem de modo significativo na motivação e na vontade de comer, podendo o ato ser visto inclusive como um alívio de sofrimento.

Sobre a receita e a fala da youtuber, Cierro diz que o autodiagnóstico faz com que muita gente espalhe informações erradas sobre tratamentos de transtornos do tipo. "A compulsão alimentar, diagnosticada por um médico, precisa de um tratamento multidisciplinar."

A dica é estar atento a forma que interagimos com o que vai ao nosso prato. "A sugestão de comer um alimento ultraprocessado como a gelatina zero é um desserviço. Dissemina o conceito distorcido de que basta um alimento ter zero calorias para ser saudável", diz Cierro.

Antes de escolher o melhor alimento, portanto, a pessoa deve ler os ingredientes da embalagem, verificando se há corantes, aditivos alimentares e edulcorantes, que podem prejudicar mais a saúde que ajudar, segundo a Asbran.

Além disso, no caso do pepino com gelatina, o substituto pode ser um gatilho. "A combinação de sabores do pepino com a gelatina aponta para restrição e punição, o contrário do que precisamos estabelecer para que o indivíduo ressignifique a relação com a comida", afirma.

A base da alimentação deve focar em alimentos in natura e minimamente processados, conforme recomendado pelo Guia Alimentar para a População Brasileira, disponível gratuitamente no site do Ministério da Saúde.

"Alimentos processados e ultraprocessados, por serem palatáveis e práticos, se tornam a base da alimentação. No entanto, eles são ricos em sódio, gordura e açúcar, indo na contramão de uma alimentação saudável", pondera a nutri.

Na hora da dieta, o indivíduo que precisa emagrecer, manter o peso ou mudar os hábitos alimentares deve construir um estilo de alimentação saudável a partir de suas próprias preferências e focando também em ter uma boa hidratação e um sono de boa qualidade. "Conhecimento é libertador. Se você não gosta de alface, tudo bem, existem outras tantas opções, como rúcula, acelga, repolho, entre outros. Porém, afirmar que não gosta de salada porque não come alface é um ponto que precisa ser explorado, partindo para outros alimentos e molhos que acompanham esse prato", diz Cierro.

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