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Entenda os riscos da soroterapia, que promete crescimento capilar e até emagrecimento

Suplementação endovenosa de vitaminas tem indicação médica para pacientes com problemas no aparelho gastrointestinal

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São Paulo

Em uma clínica com mesinhas, bolo e chá, uma médica anuncia nas redes sociais que está fazendo o procedimento de soroterapia para repor os nutrientes perdidos no Carnaval. Com uma espécie de cardápio nas mãos, ela escolhe a opção de soro fisiológico que promete imunidade.

Celebridades e influenciadores fazem parte do time que promove na internet a terapia. De Hailey Bieber à Jojo Todynho —que no Instagram, contou que a soroterapia a auxiliou no emagrecimento—, todos aparecem em clínicas injetando a solução na veia.

Mulher branca com roupão sorrindo enquanto recebe soro na veia.
Paciente recebendo vitaminas por soro intravenoso - Viacheslav Yakobchuk/Adobe Stock

As promessas são muitas, além do suposto auxílio com imunidade e reposição de vitaminas e minerais, quem divulga a soroterapia diz que o procedimento pode ajudar ainda no crescimento capilar, na perda de peso e até na eliminação de gordura localizada.

Nutróloga e diretora da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia), Marcella Garcez diz que não existe comprovação de que receber soro intravenoso ajuda a emagrecer ou estimula o crescimento do cabelo, e que o próprio nome "soroterapia" é errado. "Dá a falsa impressão para a população leiga de que você vai injetar alguma coisa, quase que um elixir milagroso por via endovenosa", diz.

Em contato com quatro clínicas que fornecem a soroterapia na cidade de São Paulo, os preços encontrados por sessão custam, em média, R$ 270. Alguns dos estabelecimentos procurados, no entanto, cobram a primeira consulta para um médico receitar o tratamento e o valor começa em R$ 900.

Para agendar uma sessão, duas clínicas disseram que seria necessário levar um exame de sangue dos últimos seis meses, sem maiores especificações. Um único estabelecimento diz que é necessário, além do exame, a entrega de um pedido médico.

"O paciente precisa passar por uma avaliação com exames para diagnosticar a necessidade dessa pessoa, porque essa prescrição precisa ser individualizada", diz Garcez.

O protocolo, outro termo utilizado por médicos para divulgar o tratamento em redes sociais, no entanto, oferece riscos para a saúde quando utilizado sem necessidade.

Mais invasiva, a terapia intravenosa tende a agir numa velocidade maior no organismo. "Por isso, tratamentos do tipo são mais invasivos. E quanto mais invasivo, mais rápido o efeito colateral pode acontecer", informa a nutróloga.

Geralmente, as complicações acontecem em decorrência da má pratica do procedimento. "É importante que seja feito em uma clínica ou laboratório próprio para a terapia e com profissionais capacitados da área médica para que, em momentos como esse, o paciente seja atendido rapidamente", diz Garcez.

As possíveis complicações se estendem à pele do paciente que procura o tratamento, podendo gerar irritação, machucados e até necrose.

O tratamento com vitaminas de forma intravenoso funciona como uma suplementação, ou seja, como qualquer outro medicamento. "Pode ter efeitos colaterais como náuseas, tontura, arritmia cardíaca, anafilaxia [reação alérgica grave] e até risco de morte", explica Garcez.

Pode ter efeitos colaterais como náuseas, tontura, arritmia cardíaca, anafilaxia [reação alérgica grave] e até risco de morte

Marcella Garcez

nutróloga e diretora da Abran

No entanto, a soroterapia é eficaz e indicada para pacientes com problemas no aparelho gastrointestinal, como quem passou por cirurgia bariátrica, atletas de alto rendimento, portadores de doenças inflamatórias intestinais e até algumas grávidas.

Médica endocrinologista da SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia), Lorena Lima diz que a vantagem da administração de medicamentos pela veia é a garantia de que alguém com algum tipo de deficiência no intestino receba o nutriente. "Quando alguém não consegue absorver bem vitaminas, por exemplo, aí sim é indicado o tratamento venoso", diz.

Ela explica que pode ser indicado, em média, de 10 a 15 sessões do procedimento para os pacientes que necessitem do tratamento endovenoso.

Pessoas em quimioterapia ou com algum transtorno alimentar são alguns dos exemplos de quem pode se beneficiar com a soroterapia, assim como aqueles que não têm a quantidade adequada de nutrientes ou proteínas, como é o caso de idosos que não conseguem tomar medicamentos via oral.

O CFM (Conselho Federal de Medicina), inclusive, reconhece a soroterapia como um tratamento que corrige determinadas deficiências ou excessos de substâncias.

"É estabelecido que é eficaz quando necessário, mas o melhor caminho é na correção nutricional e com melhores hábitos", diz Helena Carneiro Leão, conselheira federal do CFM.

Entender o motivo da deficiência nutricional e corrigi-la com uma alimentação balanceada é a melhor opção, segundo Lorena Lima. "É preciso uma mudança de hábito, alimentar porque a vitamina não fica para sempre no corpo. Você toma, mas uma hora precisa repor de novo, e a suplementação intravenosa tem um pico mais rápido, mas não deve ser feita com frequência."

Ela explica que hoje a alimentação de parte das pessoas não contém a suplementação vitamínica necessária. "Tem gente que se sente bem com a soroterapia porque se alimenta muito mal, aí acha que funciona."

De acordo com a endocrinologista, algumas pessoas se sentem melhor só de se hidratarem com o soro intravenoso. "Com os hábitos de hoje, às vezes só de se hidratar a pessoa já sente uma disposição maior e acha que é da soroterapia."

A via oral para a suplementação nutricional é a mais eficaz porque o corpo tende a bloquear o excesso vitamínico em casos de intoxicação, segundo a Lima. Pelo intestino, o corpo absorve melhor o que precisa, com menor risco de intoxicação. "O soro para desintoxicar não é necessário. Temos o fígado para isso."

O Conselho Federal de Medicina informou que o tratamento deve ter indicação e ser acompanhado por um médico. As fiscalizações, segundo o órgão, são realizadas pelos conselhos regionais de medicina a partir da resolução 2056/13, que estabelece critérios para os funcionamentos de serviços médicos de qualquer natureza.

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