Descrição de chapéu Coronavírus

SP acusa Bolsonaro de querer 'passar uma borracha na Coronavac'

Nota técnica da Saúde que excluiu vacina do esquema da 3ª dose é política, diz João Gabbardo

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São Paulo

O governo de Jair Bolsonaro quer "passar a borracha na Coronavac" para tentar retirar a primeira vacina contra Covid-19 usada no Brasil de olho na eleição presidencial de 2022.

A acusação é feita pelo coordenador-executivo do Centro de Contingência da Covid-19 em São Paulo, João Gabbardo, a partir da decisão federal de excluir o imunizante de origem chinesa formulado no Instituto Butantan do esquema de terceira dose para idosos e imunossuprimidos.​

Lote de insumo para fabricação da Coronavac é descarregado de avião em Guarulhos (SP)
Lote de insumo para fabricação da Coronavac é descarregado de avião em Guarulhos (SP) - 26.jun.2021 - Governo de São Paulo

O imunizante trazido ao país por João Doria (PSDB-SP), governador paulista que quer disputar a Presidência, é visto como seu maior ativo eleitoral.

"A redação da nota sobre a dose de reforço é política, não técnica", afirmou Gabbardo, que foi secretário-executivo do Ministério da Saúde na gestão de Luiz Henrique Mandetta, defenestrado por discordar de Bolsonaro do manejo da crise sanitária em 2020.

Ele aponta para o fato de que o texto da Nota Técnica 27/2021 diz que "houve a demonstração da amplificação da resposta imune após a terceira dose" da Coronavac, assim como das outras três vacinas usadas no Brasil: Pfizer, AstraZeneca/Fiocruz e Janssen.

Depois de listar os benefícios das vacinas, na conclusão da secretária de Enfrentamento à Covid-19, Rosana Melo, a Coronavac é descartada para ser aplicada em pessoas com mais de 70 anos ou imunossuprimidas. A preferência é para a vacina da Pfizer ou, se não houver disponibilidade, para as outras duas do mercado.

"Os estudos do Butantan são abundantes acerca do benefício. E as pessoas esquecem que a Coronavac garantiu sozinha a imunização de grupos vulneráveis, trabalhadores de saúde e idosos, na fase inicial da campanha de vacinação", afirma.

Na nota, um ponto afirma que o esquema no qual são usadas ou vacinas de RNA mensageiro (Pfizer) ou de vetor viral (AstraZeneca e Janssen) como reforço para a Coronavac provocariam um aumento da imunidade mais expressivo. Só a conclusão é de um "estudo em modelo animal".

"Parece brincadeira", disse o coordenador-executivo. Além disso, o próprio governo federal patrocina um estudo justamente para saber como funcionam as diferentes vacinas em pessoas que se imunizaram com a Coronavac, que não está pronto.

A Folha procurou o Ministério da Saúde para questionar acerca do embasamento técnico da nota, mas não obteve resposta.

Na semana passada, a pasta havia dito que a preferência pela Pfizer decorria do fato de que o imunizante será o mais disponível para o Programa Nacional de Imunização: haverá 44 milhões de doses em setembro e outras 100 milhões, em outubro.

Gabbardo diz que não há explicação senão a de disputa política para a exclusão liminar da vacina paulista-chinesa. Horas depois do anúncio federal, no dia 25, o governo Doria afirmou que iria aplicar a Coronavac na sua própria programação de terceira dose.

Ela deverá ter sua data prevista de início, dia 6, antecipada nesta quarta (1º). Além disso, São Paulo informou na segunda (30) que iria segurar a entrega dos últimos lotes do contrato de 100 milhões de doses da Coronavac, que deveria ter sido finalizado na terça (31), justamente porque o governo federal não se mostra interessado na vacina.

A terceira dose é uma realidade, atestada pela queda da imunidade em pessoas mais velhas, as primeiras a serem vacinadas, e por causa da circulação da perigosa variante delta do Sars-CoV-2.

Mas, seguindo o raciocínio de Gabbardo, ela acabou virando mais um item na encarniçada briga entre Bolsonaro e Doria centrada no combate à pandemia.

Ao longo de todo 2020, o presidente adotou uma posição negacionista e trabalhou contra a credibilidade das vacinas, principalmente da Coronavac promovida por Doria —o tucano trabalhou em cima de um contato existente entre o Butantan e a farmacêutica chinesa Sinovac, estabelecido em 2019 visando vacinas contra o vírus da zika.

Bolsonaro chegou a vetar a compra da Coronavac, mas acabou voltando atrás. O primeiro round da guerra da vacina foi vencido por Doria, que ao trazer a Coronavac e anunciar um programa próprio de imunização, obrigou Bolsonaro a acelerar a ação do Ministério da Saúde.

Mesmo assim, as trocas de farpas seguiram constantes, culminando no atrito entre Doria e o ministro Marcelo Queiroga (Saúde) acerca do fornecimento de vacinas para São Paulo, que parou no Supremo Tribunal Federal.

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