Descrição de chapéu genética

Tipo mais comum de nanismo causa dores e afeta saúde mental

Maior pesquisa da América Latina sobre condição genética analisou o impacto da acondroplasia na qualidade de vida das pessoas

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São Paulo

O nanismo é um tipo de deficiência que se manifesta por diversas causas, sendo a acondroplasia a responsável pela maioria dos casos. E o maior estudo sobre uma doença genética já feito na América Latina analisou a qualidade de vida das pessoas com essa condição.

A acondroplasia é uma síndrome que afeta o desenvolvimento dos ossos, levando ao encurtamento dos membros e o crescimento aumentado do crânio. Estima-se que a cada 25 mil nascidos vivos, um seja acometido por ela. Hoje, o diagnóstico pode ser feito já no útero.

Isabela César Soares (25 anos), é uma ex-atleta paraolímpica com acondroplasia; hoje, ela trabalha como assistente administrativa em Alphaville, na Grande São Paulo - Adriano Vizoni/Folhapress

Apesar da possibilidade de a síndrome ser passada de pais para filhos, em 80% das vezes ela surge por uma mutação genética.

A publicação da pesquisa está prevista para o fim de 2022, mas dados preliminares já foram apresentados no 15º Congresso da Sociedade Internacional de Displasia Esquelética, que ocorreu recentemente no Chile. Ao todo, 172 pessoas de 3 a 41 anos em Brasil, Argentina e Colômbia participaram da pesquisa, que foi coordenada pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) e o Instituto da Criança e do Adolescente do Hospital das Clínicas da USP (Universidade de São Paulo) no país.

"O mesmo tipo de estudo foi tentado na Europa, mas houve uma menor adesão dos pacientes. A representatividade das diferentes faixas etárias no nosso grupo foi muito boa comparada a outros", conta o geneticista Juan Llerena Júnior, coordenador do Centro de Genética Médica do Instituto Fernandes Figueira da Fiocruz e líder do estudo no Brasil.

A pesquisa mostrou que o principal impacto na qualidade de vida das pessoas com acondroplasia é a dor. Foi o que relataram 53% dos participantes menores de 17 anos. Já entre os adultos, 73,4% sentem dor diariamente.

É o caso de Gabriel Fortunato Pereira, 8, de São Paulo. O garoto conta que as pernas são o principal local afetado. "A gente tem a preocupação de ele não engordar porque, com o peso elevado, as dores são piores. Mas ele está dentro do peso para a idade e o tamanho dele", conta a psicóloga Fernanda Souza, 45, mãe de Gabriel.

A assistente administrativa Isabela César Soares, 25, de Pirapora do Bom Jesus (SP), relata que seu quadro foi agravado há dois anos, quando surgiu uma hérnia de disco. "Sinto muitas dores na lombar. Se fico muito tempo em pé ou dependendo do jeito que ando, não aguento e preciso deitar. Fico assim por uns quatro ou cinco dias", diz.

De acordo com o geneticista Marco Antônio Ramos, coordenador do Centro de Genética da Escola Paulista de Medicina da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), a dor crônica é resultado de deformidades na coluna vertebral característica da acondroplasia, que atrapalham as saídas nervosas de dentro da coluna.

O impacto na saúde mental

Dos adultos entrevistados, 26,6% relatam sofrer com ansiedade ou depressão e 17,8% afirmam enfrentar problemas ou não ter condições de realizar atividades simples e rotineiras.

O assistente bancário Luiz Numeriano Santiago, 37, de São José dos Campos (SP), diz que viveu isso mais intensamente quando era criança porque seu pai simulava as dificuldades que ele enfrentaria em um mundo onde não havia preocupação com acessibilidade.

Ele conta que precisava de um banco para ficar na altura da pia do banheiro. Em uma noite, durante sua semana de provas na escola, o pai sumiu com o móvel. "Quando acordei, tive que pensar numa solução rápida, se não perderia o dia de prova. Usei um rodo como martelo para abrir o registro e escovei os dentes do chuveiro", relata.

Antes de trabalhar na área administrativa, Isabela foi paratleta de 2010 a 2018, iniciando na natação e depois indo para o halterofilismo. O esporte foi fundamental para ajudar a manter sua saúde mental.

"A forma que eu consigo lidar, principalmente com preconceito, foi o esporte que me ajudou porque eu conheci outras pessoas e via outras histórias, até de gente com mais dificuldade do que eu, e comecei a aprender com eles", afirma.

Avanços na medicina e na sociedade

No final de 2021, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aprovou o primeiro medicamento para acondroplasia no Brasil. Segundo Ramos, o Voxzogo, do laboratório BioMarin, age regulando parcialmente o fator de crescimento. As primeiras pesquisas mostraram que ele promove um aumento na estatura de até nove centímetros. Por enquanto, só é possível acessá-lo por judicialização.

Para além desse avanço, é importante pensar na qualidade de vida das pessoas com essa deficiência. Llerena acredita que o trabalho do qual participou é importante justamente por trazer um olhar mais amplo.

"Nós precisamos avançar nessa questão da visibilidade das pessoas com doenças genéticas e raras. Quanto mais estudarmos questões como essa, mais ampla é a nossa sensibilidade e humanização do acolhimento dessas pessoas na sociedade", finaliza.

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