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Senador bolsonarista convoca debate e ignora especialistas contra PL Antiaborto por Estupro

Presidente da Febrasgo, que mora no Rio Grande do Sul, foi convidada na véspera

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Brasília

O Senado ignorou especialistas contrários ao PL Antiaborto por Estupro na sessão de debates desta segunda-feira (17) e convidou apenas na véspera a presidente da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia).

O debate foi organizado a pedido do senador Eduardo Girão (Novo-CE) para discutir a chamada assistolia fetal, procedimento recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para a interrupção da gestação acima de 20 semanas.

Dos 17 convidados para a audiência realizada no plenário da Casa, 15 se posicionam contra o procedimento. Completam a lista a ministra da Saúde, Nísia Trindade, e a presidente da Febrasgo, Maria Celeste Wender (que não participaram).

Mulheres protestam contra o PL Antiaborto por Estupro, em Brasília - Pedro Ladeira-13.jun.2024/Folhapress

A assistolia fetal entrou no foco das discussões depois de uma resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina) para proibir a realização do procedimento em grávidas com mais de 22 semanas de gestação, mesmo em casos de estupro.

A resolução foi suspensa pelo STF (Supremo Tribunal Federal), mas ganhou tração a partir do PL Antiaborto por Estupro. Na quarta (13), o plenário da Câmara dos Deputados aprovou a votação do PL em regime de urgência —mecanismo que dispensa a avaliação das comissões.

Ao longo da sessão desta segunda, convidados discursaram a favor da resolução do CFM e da proposição. Ao falar sobre a situação de adolescentes estupradas, uma das participantes disse que "a natureza é sábia" e "prepara" o corpo de meninas e mulheres.

Girão ressaltou a ausência da ministra da Saúde e disse que ela teria "o tempo que quiser", se fosse ao Senado até o encerramento da sessão. O senador também reconheceu que Wender foi convidada "em cima da hora".

"Outra convidada foi a dra. Maria Celeste, presidente da Febrasgo, e chefe do serviço no hospital universitário. Só que, neste caso, a gente compreende que ela não pôde vir, porque foi realmente convidada neste final de semana. Então, foi em cima da hora mesmo", disse.

A reportagem apurou que a presidente da Febrasgo foi convidada neste domingo (16). Além de ter sido chamada com menos de 24 horas de antecedência, Wender estava no Rio Grande do Sul —estado que enfrenta restrição de voos devido ao fechamento do aeroporto de Porto Alegre.

Durante a sessão, a contadora de história Nyedja Gennari, 50, encenou um feto gritando durante um aborto feito com assistolia fetal.

Gennari foi convidada pelos organizadores do evento. Na sessão, ela gritou: "Não! Quero continuar vivo".

Na sexta-feira (14), a Febrasgo divulgou nota em que afirma que é contra o projeto de lei. A federação disse que "um tema de tamanha importância necessita de uma ampla discussão prévia" e que "e se posiciona contra a criminalização da mulher nessa situação de vulnerabilidade".

A ministra da Saúde afirmou que não pôde comparecer devido a incompatibilidades na agenda. Segundo ela, a ausência foi informada ao Senado na quinta (13). Nísia acrescentou que a assessoria especial de assuntos parlamentares acompanhou o debate "dada a relevância do tema para a pasta".

Em nota, Girão disse que a lista de convidados foi "cuidadosamente elaborada", que está à disposição em seu gabinete para receber qualquer instituição que queira opinar sobre o tema, e que outros senadores poderiam ter sugerido convidados.

"A busca pela pluralidade de opiniões foi evidente no convite feito à Ministra da Saúde, Nísia Trindade, com a devida antecedência para que ela pudesse se programar para participar da sessão ou enviar um representante", diz trecho da nota.

A sessão também teve uma encenação teatral e a exibição de bonecos de borracha. A TV Senado barrou a transmissão de vídeo levado pelo ex-secretário de Atenção à Saúde Primária do governo de Jair Bolsonaro (PL) Raphael Câmara devido à classificação indicativa.

Segundo relatos, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), assistiu ao debate pela TV e demonstrou irritação. Pacheco ficou contrariado com a dramatização e a falta de especialistas críticos ao projeto de lei da Câmara.

O senador avalia que o tema deve ser discutido a partir de critérios técnicos e científicos, considerando a lei vigente e a opinião das senadoras. Apenas Damares Alves (Republicanos-DF), ex-ministra da Mulher de Bolsonaro, participou da sessão.

O deputado bolsonarista Zacharias Calil (União Brasil-GO) repetiu a encenação que havia feito durante a sessão de vetos do Congresso de 28 de maio, com uma seringa cenográfica e bonecos. Pacheco presidia a sessão do Congresso; ele não se manifestou na ocasião.

Girão tenta se viabilizar para concorrer à prefeitura de Fortaleza nas eleições de outubro. No ano passado, o senador tentou entregar um feto de borracha ao ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, durante uma audiência no Senado.

"Com todo respeito, é uma exploração inaceitável de um problema muito sério que nós temos no país", respondeu o ministro ao recusar o boneco de borracha.

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