Um dia após a Caixa Econômica Federal informar que os repasses oriundos das verbas das loterias ao Comitê Olímpico do Brasil (COB) estavam suspensos por conta de uma dívida de R$ 191 milhões da entidade, o governo federal e a estatal voltaram atrás. Na noite desta terça (8), foi confirmado que o COB poderá voltar a receber as verbas.
Primeiro foi o Ministério da Cidadania, por meio da Secretaria Especial do Esporte, que enviou ofício à Caixa posicionando-se acerca da liberação dos repasses. Segundo o órgão, "os requisitos constantes dos artigos 18 e 18-A da Lei Pelé não são exigíveis para esse tipo de transferência".
Esses dois artigos dizem respeito às exigências necessárias para que uma entidade esportiva receba repasses de recursos públicos federais da administração direta e indireta.
Dessa forma, o governo federal e a Caixa entenderam que o fato de o comitê ter débitos tributários no valor de quase R$ 200 milhões não o impede de receber os recursos previstos na Lei Agnelo/Piva.
"A Caixa informa que recebeu nesta terça (9) ofício do Ministério da Cidadania posicionando-se sobre a liberação do repasse de recursos das loterias", afirmou a estatal.
Segundo a Caixa, os repasses deverão ser retomados até que a área jurídica da pasta se manifeste sobre o assunto.
O COB sempre sustentou a tese de que o fato de não ter a Certidão Negativa de Débito expedida pela Receita Federal não deveria ser motivo para ficar sem o repasse das verbas da Lei Piva, por essas se tratarem de um recurso previsto na legislação, e não decorrente de convênios com órgãos públicos, os chamados repasses voluntários.
Na avaliação do governo federal, pelo menos por ora foi essa visão que prevaleceu.
O COB encontra-se atualmente no polo passivo de uma dívida tributária de R$ 191 milhões da extinta Confederação Brasileira de Vela e Motor.
Atolada em dívidas, essa entidade passou por uma intervenção do COB de 2007 a 2012, antes de uma nova confederação de vela, a CBVela, ser criada do zero e assumir a gestão do esporte no Brasil.
Tanto o COB quanto a CBVela são apontados pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional como os responsáveis pelas dívidas da extinta confederação.
A reversão do bloqueio representa um alívio para as entidades do esporte nacional, já que os repasses da Caixa ao COB são a principal fonte de recursos de quase todas as modalidades que fazem parte do programa olímpico.
O comitê distribui as verbas de loterias federais –este ano a previsão de arrecadação chega a R$ 250 milhões– para 34 confederações, que em sua maioria não têm outra fonte de receita significativa.
Até mesmo para as que possuem patrocínios de grandes empresas estatais ou privadas, o dinheiro previsto pela Lei Piva é fundamental na manutenção dos treinamentos, viagens para competições e despesas com pessoal.
Caso não fosse revertida, a suspensão poderia causar um apagão no esporte brasileiro. Isso a três meses e meio dos Jogos Pan-Americanos de Lima, onde o Brasil deve ser representado por quase 500 atletas, e a pouco mais de um ano da Olimpíada de Tóquio.
Entenda a Lei Piva
O que é a Lei Piva? Sancionada em 2001, a Lei Agnelo/Piva fez crescer o investimento público no esporte ao direcionar inicialmente 2% da arrecadação bruta das loterias federais, descontadas as premiações, ao Comitê Olímpico do Brasil (COB) e ao Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB). Ao longo dos anos, esse percentual cresceu, assim como o número de entidades beneficiadas diretamente. A divisão do bolo também mudou a partir de leis regulamentadoras.
Como são divididos os recursos? Em 2018, a aprovação de medida provisória durante o governo Michel Temer (MDB) definiu a distribuição dos recursos que está em vigor. O COB tem direito a 1,71% do total arrecadado, e o CPB, a 0,95%. Outros 4,33% são divididos entre o antigo Ministério do Esporte, atualmente secretaria especial (3,5%), o Comitê Brasileiro de Clubes (0,5%), a Confederação Brasileira do Desporto Escolar (0,22%) e a Confederação Brasileira do Desporto Universitário (0,11%).
Por que o COB e as confederações dependem dessas verbas? À exceção do futebol, os recursos da Lei Piva são a principal forma de financiamento do esporte de alto rendimento no país. O repasse representa aproximadamente 90% das verbas do COB. A maioria das confederações não tem patrocínios significativos e por isso também depende exclusivamente do repasse. Com estimativa de arrecadação de R$ 250 milhões com a lei em 2019, o comitê prevê repassar a 34 confederações R$ 109 milhões e investir diretamente em atletas e equipes R$ 85,3 milhões.
Como é feita a divisão entre as confederações? Vários critérios definem a parte de cada uma no bolo. Os que mais pesam são número de medalhistas nos últimos campeonatos mundiais adulto (17,4%), Jogos Olímpicos (15,2%) e mundiais sub-21 (15,2%), além da prestação de contas (10,9%).
Quais confederações ganham mais? Em valores anuais: Voleibol (R$ 7,1 milhões), Judô (R$ 6,7 milhões), Atletismo (R$ 5,4 milhões) Vela (R$ 4,6 milhões) e Boxe (R$ 4,5 mi).
Como o COB investe o restante que recebe da lei? Diretamente em projetos de preparação olímpica; no centro de treinamento do Time Brasil, no Rio de Janeiro; no laboratório olímpico; em missões internacionais; em capacitações pelo Instituto Olímpico Brasileiro; em projetos de desenvolvimento de jovens talentos e Jogos Escolares da Juventude; em corpo técnico para preparação de equipes.
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