De esquerda, Klopp tenta chegar ao topo após quase virar jornalista

Técnico do Liverpool foi estagiário em TV e depois comentarista na Copa de 2006

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São Paulo

Finalista da Champions League pela terceira vez na carreira, Jürgen Klopp, 51, comanda neste sábado (1º) o Liverpool na decisão europeia contra o ​Tottenham, em Madri, às 16h, com transmissão da TNT e do Facebook do Esporte Interativo.

Na atual função, a de técnico, o alemão tem uma imagem de prestígio que nem de longe conseguiu alcançar como jogador.

O técnico Jürgen Klopp, do Liverpool, após a vitória sobre o Barcelona na semifinal da Champions
O técnico Jürgen Klopp, do Liverpool, após a vitória sobre o Barcelona na semifinal da Champions - Paul Ellis/AFP

Atleta medíocre, algo que o próprio reconhece, teve longa carreira na segunda divisão de seu país. Foi o ápice que o atacante transformado em zagueiro alcançou com as chuteiras no pé.

Não tivesse seguido com sucesso a carreira de treinador no Mainz e no Borussia Dortmund, o atual comandante do Liverpool poderia ter enveredado para uma carreira no jornalismo esportivo. E não foi por falta de oportunidade ou aptidão para encarar a tarefa, como mostra o livro "Klopp", de Raphael Honigstein, lançado recentemente em português pela Editora Grande Área.

O contato inicial com o ambiente jornalístico aconteceu no início da década de 1990, pouco tempo após sua chegada ao Mainz 05, clube que defendeu de 1990 a 2001 em mais de 300 partidas até se aposentar.

Primeiro canal de televisão estatal da Alemanha a se tornar propriedade privada, o SAT1, que cobria a Bundesliga, tinha um escritório regional no estado da Renânia-Palatinado, que tem a cidade de Mainz como capital.

Contando com uma equipe formada basicamente por freelancers e jornalistas recém-formados, a editoria de esportes da seção regional contratou Klopp para um período de três meses de estágio.

O zagueiro-repórter sabia que a segunda divisão alemã poderia não lhe garantir um grande futuro. Paralelamente ao estágio e aos treinos e jogos no Mainz, Klopp ainda estudava Ciências do Esporte na Universidade de Frankfurt, um trajeto de aproximadamente 40 minutos de carro todos os dias.

Logo no começo da experiência no SAT1, conseguiu emplacar uma reportagem sobre as irmãs Röschinger, as duas mais bem-sucedidas atletas de snowboard da região. Além da entrevista, fez também a narração e a edição do material que foi ao ar.

A segunda matéria de destaque do talentoso estagiário foi na reta decisiva da Bundesliga de 1991/1992.

O Eintracht Frankfurt brigava pelo título com o Stuttgart e o Borussia Dortmund. Os três estavam empatados na liderança da competição faltando apenas uma rodada. Mas o Eintracht, dono de futebol vistoso em uma época na qual a liga alemã não estava acostumada a isso, era a grande sensação.

O desafio do jovem repórter? Entrevistar o técnico da equipe, Dragoslav Stepanovic, que recusara todos os pedidos de entrevista prévios ao jogo.

Jürgen Klopp havia sido atleta de Stepanovic no pequeno Rot-Weiss Frankfurt. Mas seu contato para conseguir a entrevista foi um companheiro de Mainz, Hendrik Weiss, cuja mãe era assessora de imprensa do aeroporto de Frankfurt.

Antes de o Eintracht partir para o nordeste do país, onde enfrentaria o Hansa Rostok, ela deixou Klopp passar pela segurança e facilitou sua ida até as portas do avião. Ali, ele parou Stepanovic e fez algumas perguntas. Foi o único em todo o país a tirar do treinador um par de declarações às vésperas do jogo decisivo.

Amigo do hoje treinador, Martin Quast lembra ao livro de Honigstein que o CEO do canal televisivo, Jürgen Doetz, garantiu a ele um emprego no SAT1 se a carreira no Mainz não decolasse. "Kloppo, se esse negócio com o futebol não der certo para você, vou transformá-lo em diretor de comunicação da SAT1. Não tem erro", disse Doetz.

Com o fim do estágio, o zagueiro voltou suas atenções ao Mainz 05 e aos estudos na Universidade de Frankfurt. Jogou por 11 anos no clube até pendurar as chuteiras em 2001 e prontamente aceitar o convite da diretoria para assumir o comando do time.

Em 2005, a emissora ZDF, dona dos direitos de transmissão da Copa das Confederações daquele ano e da Copa do Mundo no ano seguinte, ambas na Alemanha, tinha o ídolo alemão Franz Beckenbauer como principal nome no time de comentaristas para a cobertura dos torneios.

Mas como Beckenbauer era o chefe do comitê organizador do Mundial, ele não estaria disponível para todas as transmissões. Dieter Gruschwitz, editor de esportes do canal, decidiu inovar.

A ZDF colocou em prática o uso de um painel interativo que combinava imagens de vídeo e a possibilidade de desenhar e brincar com as imagens das partidas. Hoje o recurso é amplamente utilizado, mas na época era novidade.

E para uma ferramenta ousada como aquela, Gruschwitz pensou em alguém igualmente irreverente para utiliza-la: Jürgen Klopp, com quem compartilhava alguns copos de cerveja durante a semana para falar sobre futebol. Só havia uma preocupação.

"Sabia que ele podia analisar uma partida, mas será que os telespectadores acreditariam em um treinador da segunda divisão falando sobre futebol internacional em seu mais alto nível? A diferença entre o Mainz e a seleção brasileira não era grande demais?", pensou o editor.

No início, Beckenbauer também pensou o mesmo, mas rapidamente mudou de ideia. "Depois de duas ou três vezes ele falou: 'Uau, o modo como ele explica o jogo é ótimo'. Após algumas partidas da Copa das Confederações, Beckenbauer estava absolutamente surpreso com Jürgen", conta Gruschwitz.

Segundo o livro, Klopp também usou seu carisma para conquistar Pelé, convidado pela ZDF para algumas participações no canal e que também se encantou com o alemão.

Klopp comanda treino do Liverpool nesta sexta-feira (31), véspera da decisão da Champions
Klopp comanda treino do Liverpool nesta sexta-feira (31), véspera da decisão da Champions - Pierre-Philippe Marcou/AFP

Apesar do aparente talento para os comentários, a carreira do treinador decolou. No Mainz, levou o clube à primeira divisão da Alemanha pela primeira vez na história, além de uma classificação à Copa da Uefa (hoje Liga Europa).

No Borussia Dortmund, foi bicampeão da Bundesliga e carregou a equipe à final da Champions League da temporada 2012/2013, que acabou com o vice diante do Bayern de Munique.

À frente do Liverpool, também foi vice da Champions —em 2018, contra o Real Madrid. Uma escrita que ele tentará mudar na decisão com o Tottenham, em Madri.

No momento em que achar que não há mais energia para seguir com a carreira de técnico, o alemão sabe que não faltarão convites de emprego.

"Ele tinha talento e havia se divertido fazendo aquilo [jornalismo]. Tempos depois, Klopp disse: 'Se não tivesse dado certo no futebol, eu provavelmente teria acabado sendo repórter esportivo'", revela Martin Quast, amigo do zagueiro-técnico-comentarista.

Klopp parece ter demonstrado mais interesse pelo jornalismo ao longo da vida do que pela política, por exemplo. O que não impediu o alemão de falar sobre o tema em algumas ocasiões.

"Não diria que sou muito ligado à política, mas sou de esquerda, claro. Meu entendimento de política é o seguinte: se estou bem de vida, quero que os outros também estejam. Se há algo que jamais vou fazer na vida é votar na direita", disse ele, que é contra o brexit, em entrevista ao jornal Die Tageszeitung, em 2009.

Klopp - O técnico heavy metal que transformou Borussia Dortmund e Liverpool

  • Preço 59,90
  • Autor Raphael Honigstein
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