Defesa do século, feita por Banks em cabeçada de Pelé, completa 50 anos

Goleiro inglês, morto em 2019, ficou marcado por barrar brasileiro na Copa de 1970

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São Paulo

Com o passo lento e aparente cansaço, Gordon Banks, então com 79 anos, caminhava pelos corredores do Grande Palácio do Kremlin em 30 de novembro de 2017, em Moscou. No dia seguinte, ele participaria do sorteio dos grupos para a Copa do Mundo de 2018, que começaria sete meses depois.

Seria o torneio em que a Inglaterra enfim teria uma boa campanha, depois de 28 anos. Chegou à semifinal e foi derrotada pela Croácia num jogo em que criou chances para vencer. Antes do torneio, a equipe era zebra, e Banks concordou.

A explicação oficial da Fifa para o convite ao goleiro foi que ele representaria uma seleção campeã mundial: a Inglaterra de 1966. Mas ele não estava ali por causa disso.

Banks, que morreu em 2019, foi chamado por causa de uma jogada há 50 anos, na Copa do Mundo do México. A mesma que o tornou conhecido para sempre a partir de 7 de junho de 1970. Ele é o autor da "defesa do século".

"Eu até hoje não sei como aconteceu. Foi apenas reflexo. Eu vi a cabeçada, a bola foi para o chão e saltei. Ouvi o grito de gol e acho que Pelé também berrou. Mas, de algum jeito, consegui desviar para fora", disse ele à Folha antes do sorteio.

O Brasil venceu por 1 a 0 pela fase de grupos do Mundial, mas a defesa de Banks é mais lembrada do que o gol de Jairzinho. Pelé subiu mais do que todos e se posicionou na área. A cabeçada foi forte, para baixo e no canto esquerdo. Deveria ser indefensável.

"Perdemos o jogo por causa de uma falha defensiva. Foi uma partida inesquecível para todos. Enfrentamos aquele maravilhoso time do Brasil de igual para igual e poderíamos ter vencido. Se nos encontrássemos de novo, isso poderia acontecer", relembrou.

Ao falar com a imprensa há pouco mais de dois anos e meio, Banks comentou sobre as chances da Inglaterra, quem seria o titular do gol da seleção e até sobre a defesa de Marcelo Grohe pelo Grêmio contra o Barcelona-EQU pela Libertadores daquele ano ("foi muito boa", definiu o inglês).

As perguntas tinham idas e vindas, mas sempre voltavam para o lance com Pelé. Isso pareceu começar a incomodá-lo, como o artista que se cansa de falar sobre sua obra-prima e até prefere outras.

"Foi minha defesa mais difícil, mas fiz outras muito boas na minha carreira também. Fui campeão do mundo com a Inglaterra e por isso que fui convidado pela Fifa", explicou.

Ele abriu um sorriso apenas ao seu lembrado da história que entrou para o folclore do futebol inglês. O zagueiro Bobby Moore teria lhe perguntado, após o desvio com as pontas dos dedos, por que o goleiro não havia segurado a bola.

"Foi Allan [Mullery], não Bobby Moore. Ele falou de brincadeira, mas o xinguei mesmo assim."

Gordon Banks faz defesa histórica em cabeçada de Pelé
Gordon Banks faz defesa histórica em cabeçada de Pelé - 7.jun.70/Action Images/Sporting Pictures

Em outras entrevistas, talvez cansado com a insistência no assunto, chegou a dizer que aquela não havia sido a defesa mais bonita que fez em sua trajetória no futebol profissional, que durou 19 anos. Começou em 1958, no Chesterfield, e terminou em 1977, aos 40 anos, no St.Patricks Athletic, da Irlanda.

"O mais importante para mim teria sido ganhar aquela partida contra o Brasil, que foi fantástica. Se tivéssemos vencido, tudo seria muito diferente. Se o gol de Pelé acontece no primeiro tempo, teríamos mais tempo para reagir", especula, insinuando que abriria mão do lance que definiu sua carreira pela oportunidade de traçar um caminho diferente no Mundial e, quem sabe, conquistar o segundo título consecutivo.

O gol de Jairzinho, que definiu o confronto, aconteceu aos 14 minutos do segundo tempo. Foi o único sofrido por Banks naquela Copa do Mundo. Nas duas outras partidas da fase de grupos, contra Romênia e Tchecoslováquia, a Inglaterra venceu por 1 a 0.

Um dia antes das quartas de final diante da Alemanha, ele sentiu fortes dores estomacais e teve intoxicação alimentar diagnosticada. Foi substituído por Peter Bonetti. Os alemães venceram de virada por 3 a 2.

"Foi uma pena, porque acho que chegaríamos à final", acredita. Isso poderia significar o reencontro com o Brasil.

Banks se lembra de ter ficado no hotel, ainda sentindo cólicas, e assistiu ao jogo pela televisão, mas em VT. Não foi mostrado ao vivo no México. Viu os companheiros chegando cabisbaixos e não entendeu, porque pelas imagens transmitidas até aquele momento a Inglaterra vencia por 2 a 0 e controlava a partida.

"Quando Bobby [Charlton] me disse que havíamos perdido, não acreditei. Achei que estava tentando me pregar uma peça", contou.

Na mesma noite, no restaurante do hotel, Banks encontrou o técnico Alf Ramsey sentado em um canto, desolado.

"Ele me perguntou: 'entre todos os jogadores que poderíamos perder, por que você, Gordon?'. Foi bem triste", se recordou o goleiro que não foi campeão, mas naquele 7 de junho fez a defesa mais lembrada da história do futebol.

Gordon Banks morreu em 2019, aos 81 anos, vítima de câncer. Ele tem uma estátua próxima ao estádio do Stoke City, onde jogou de 1967 a 1973.

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