Esporte foi ferramenta de autoaceitação para Raíssa Machado

Atleta do lançamento do dardo nas Paralimpíadas conta como o atletismo a ajudou a amar o próprio corpo

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Júlia Belas
São Paulo

“Tudo começa pelo esporte.”

Raíssa Machado é uma das atletas paralímpicas com mais seguidores nas redes sociais. Ela compartilha detalhes da própria rotina, fala sobre moda e beleza, dá dicas de maquiagem e cabelo e comenta o processo de autoaceitação.

Aos 25 anos, ela está em Tóquio para disputar a sua segunda edição das Paralimpíadas. Depois de um sexto lugar nos Jogos do Rio, em 2016, ela passou por momentos difíceis, quando ainda lutava para aceitar o próprio corpo como pessoa com deficiência. O esporte ajudou nesse processo.

Raíssa Machado foi uma das modelos dos novos uniformes do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB)
Raíssa Machado foi uma das modelos dos novos uniformes do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) - Alexandre Urch/Divulgação

“Foi fundamental para eu quebrar o meu próprio preconceito e começar a me aceitar do jeito que eu sou, com a minha deficiência”, contou ela, em entrevista à Folha.

Raíssa diz que poder ver outras pessoas com deficiência praticando esportes mudou sua percepção. “Foi quando percebi que o que tinha de errado era a minha cabeça.”

E, como ela mesma fala, tudo começa com o esporte. Raíssa nasceu com uma má-formação nas pernas. Aos 12 anos, começou a praticar o atletismo. Anos depois, ela criou contas nas redes sociais para aumentar a visibilidade do lançamento do dardo, mas o foco mudou.

“Quando abri essas portas, várias outras se abriram. Tanto para moda, para cabelo cacheado, para maquiagem, e eu comecei a mostrar um pouco mais da minha vida”, diz. Isso incluía falar mais sobre a deficiência. “Eu moro sozinha, então comecei a mostrar que eu limpo a casa, faço comida, lavo roupa, e as pessoas gostaram”, conta.

Para Raíssa, foi importante entender as suas origens e passar a se admirar da cabeça aos pés. E isso a ajuda também no trabalho.

“Hoje eu me olho no espelho e gosto do que eu vejo. Gosto do meu corpo, do meu cabelo, das minhas pernas. Eu me aceito e hoje posto fotos de corpo inteiro, antes não postava.”

Ela é natural de Ibipeba, cidade com menos de 20 mil habitantes a 520 km de Salvador, no interior da Bahia. Só no Instagram, a atleta tem 100 mil pessoas a mais como seguidores.

Raíssa faz questão de deixar claro que, apesar de viver boa parte da vida fora do estado, quer orgulhar o povo nordestino. “Eu levo não só o nome da cidadezinha onde eu nasci, mas o sangue baiano, e espero representar bem a Bahia e dar muita alegria ao meu Nordeste”, garante.

Hoje em dia, Raíssa enxerga a medalha em Tóquio como um sonho a ser realizado. Apesar das dificuldades da pandemia da Covid-19, que a forçou a adaptar os treinos em casa, ela garante que fez o melhor para manter o nível da preparação. “Tive que tentar manter a performance física, até porque treinar em casa é diferente de treinar em um ambiente que tem uma estrutura”, explica.

A atleta, que já sentiu vergonha do próprio corpo, hoje em dia o entende como objeto de admiração. “Eu comecei a realmente amar o esporte e a me aceitar. Eu não gostava da minha deficiência, eu me achava feia por conta dos meus pés tortos, eu me achava estranha, um monstro diferente.”

Atleta sentada na cadeira faz o movimento de lançamento
Raissa Rocha Machado, que compete na classe F56 do lançamento de dardo, treina em Hamamatsu - Ale Cabral - 13.ago.21/CPB

Segundo ela, é importante que as pessoas a vejam como alguém que está correndo atrás dos próprios sonhos. “Independentemente da minha deficiência, de eu estar em cima de uma cadeira de rodas, eu sou igual a todos”, afirma.

Depois de alcançar o objetivo inicial com a vaga em Tóquio, Raíssa garante que agora o foco é trazer a medalha para coroar esse trabalho. “Vou lutar para obter o melhor resultado e, se Deus quiser, subir no pódio, independentemente da cor da medalha."

Raíssa compete no lançamento do dardo a partir das 22h12 de segunda-feira (30), horário de Brasília. Os torneios de atletismo das Paralimpíadas são realizados no Estádio Olímpico de Tóquio.

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