Argentinos esperam clássico contra México como se fosse final de Copa

Seleções têm rivalidade histórica, marcada por eliminações e naturalização de jogador

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Buenos Aires

No Brasil, é menos conhecida a rivalidade entre Argentina e México. A partida deste sábado (26), pelo Grupo C da Copa do Mundo, é motivo de grande tensão devido a uma longa história em comum entre os países, que passa pela disputa de terras ao sul da Patagônia desde tempos coloniais e pós-independentistas.

A distância geográfica e a disparidade técnica entre os dois fariam supor que o jogo não teria tanta importância para os torcedores. A quantidade de história envolvida, porém, não pode ser desprezada.

O México, apesar de adorar disputas com a Argentina e considerar a partida uma final antecipada, está acostumado a ser o freguês.

Imagem de Messi projetada no Obelisco de Buenos Aires, nesta sexta (15)
Imagem de Messi projetada no Obelisco de Buenos Aires, nesta sexta (15) - Agustin Marcarian/Reuters

"Com a Argentina, sempre jogamos como nunca e perdemos como sempre", diz à Folha o escritor mexicano Juan Villoro, que ainda assim guarda esperanças com relação ao dia de hoje.

Se perder, a seleção liderada por Messi será eliminada do torneio.

Num passado mais sangrento, o México foi um dos países de acolhida, assim como a Venezuela, a perseguidos pela Triple A —esquadrão da morte a serviço do peronismo— e, posteriormente, pela repressão da ditadura argentina (1976-1983).

A gratidão dos argentinos que buscaram exílio no México, e muito deles jamais voltaram, é enorme.

Estes exílios foram em parte breves, mas figuras estelares da vida intelectual argentina acabaram fincando raízes no México mesmo depois que a ditadura acabou, como Néstor García Canclini.

O antropólogo, que fugiu dos anos de chumbo argentinos, transformou-se em importante professor, acadêmicos e crítico, residindo no México a partir de 1976.

Como ele, há centenas de professores nas universidades mexicanas que ali encontraram refúgio e trabalho, os levando a querer e fincar raízes no país, depois de anos de ditadura.

A vida cultural pujante do México é um dos principais legados da Revolução de 1910. Festivais, espaços culturais, editais e iniciativas do Estado são alguns exemplos.

Mas a fricção e o intercâmbio culturais nem sempre se mostram nas quatro linhas do campo. A Argentina eliminou o México em duas Copas do Mundo —2006, na Alemanha, e 2010, na África do Sul.

"Fazemos festa para a seleção brasileira quando é campeã ou joga bem por aqui. Com a Argentina é diferente, nos tiraram do Mundial duas vezes, e mesmo assim somos muito receptivos a ter um técnico argentino, como é o caso de Tata Martino, desta vez, e Funes Mori, o argentino que se naturalizou mexicano para estar em campo hoje", diz o escritor e crítico literário mexicano Rafael Toriz.

O atacante Funes Mori, que nasceu e começar a jogar na Argentina, decidiu fazer a mudança para defender, hoje, a "tricolor".

Os argentinos só falam deste jogo há dias, mesmo com o dólar clandestino extrapolando os 314 pesos (R$ 10,26), e os turistas sem acesso ao raro "dólar turista", que recentemente entrou em vigência, mas não está operativo.

Na simbólica esquina das avenidas do Libertator e Sarmiento, está montada a Fan Fest, já cheia no começo da tarde deste sábado. "Uma partida que encararíamos meio que suavemente em outras ocasiões, mas que agora virou um drama", comenta o locutor esportivo argentino Andrés Burgo.

A temperatura esperada em Buenos Aires para o horário do jogo é de 29oC. Muitos já estão disputando as poucas sombras que há no espaço, e equipes de televisão, tentando a melhor imagem do telão que transmitirá a partida. Há opções para comer, com food trucks de choripán, empanadas e sorvetes.

"Não gostei da ideia de vir aqui, porque, da outra vez, a Argentina perdeu, mas os meninos estão encantados", conta Valerio Ugaz, 24, sobre seus filhos. A ideia de que algo supostamente deu azar, deu "mufa", é fortíssima por esses lados.

Às 14h, não havia vivalma nas ruas do microcentro, e os bares com telão estavam apinhados. Ninguém ousava ir ao banheiro e perder o lugar. Tata Martino recebe carinho dos torcedores, mas o mesmo não ocorre com Funes Mori.

O escritor mexicano Juan Pablo Villalobos, apaixonado por futebol que tem um livro sobre o Brasil, disse: "Por favor, não nos esqueçamos de que se trata de apenas uma partida de futebol. Amor eterno a meus amigos e amigas argentinas, a seus escritores e músicos maravilhosos, a seus poetas e cineastas. Tudo isso sem deixar de acrescentar: tomara que metamos três gols neles e os eliminemos!".

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