Ativistas e indígenas são cercados e hostilizados em Rondônia

Polícia Federal investiga denúncia de emboscada por 50 homens que cercaram o grupo em uma reserva indígena por três horas alegando invasão de propriedade

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São Paulo (SP)

Um grupo de 16 pessoas, formado por indígenas, ativistas e jornalistas, foi cercado e hostilizado neste domingo (14) na Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, na região de PAD (Projeto de Assentamento Dirigido) Burareiro, em Rondônia.

Segundo as vítimas, cerca de 50 homens mantiveram o grupo sob vigilância por mais de três horas. Alguns deles estavam armados.

A foto mostra um sobrado grande de cor branca e telhado marrom; o local é usado como base da Funai em Rondônia; à frente do imóvel o piso é de terra batida; há algumas plantas na fachada; o céu está azul; há algumas pessoas à frente da base e um carro ao fundo
Posto da Funai em Rondônia; a base receberia uma pintura do artista plástico Mundano, mas a obra não pode ser executada devido à investida sofrida pelo grupo no qual o artista e Neidinha estavam - Arquivo pessoal

Entre as pessoas cercadas estavam a empreendedora social e ativista de direitos humanos Neidinha Surui, a filha dela, também ativista e colunista da Folha, Txai Surui, e o artista plástico Mundano, além de cinco indígenas.

O episódio ocorreu após o grupo tentar iniciar uma obra artística com pintura do solo. A ideia era chamar a atenção para o combate ao desmatamento e à necessidade de demarcação de terras indígenas.

"Fomos cercados por aproximadamente 50 homens. Eles ficavam dizendo que lá era propriedade privada. Fecharam a estrada de um lado e de outro. Não tinha como a gente sair", conta Neidinha. "Eu não tinha me tocado que era uma emboscada."

Neidinha explica que o local é Terra Indígena. Segundo ela, quatro dos homens portavam armas na cintura. Apesar de não terem sido apontadas para o grupo, os homens teriam abordaram os ativistas de forma hostil.

Tinha um que ficava fazendo gracinha, dizendo que estava me dando de presente de Dia das Mães me prender ali

Neidinha Suruí

Indigenista relatou a hostilidade da abordagem

Neidinha classifica o episódio como tentativa de "cárcere privado" e afirma que a investida só terminou depois que ela e Txai citaram leis federais. Ela foi liberada após mais de três horas de discussão com os integrantes do assentamento.

Já Mundano, o jornalista inglês Heydon Prowse, e outros membros da produção foram impelidos a permanecer no local até a chegada de um criador de vídeos, apoiador do grupo.

Localizada a cerca de 250 quilômetros da capital, a Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau é alvo de disputa há décadas.

A ativista dos direitos humanos e do meio ambiente Ivaneide Bandeira, conhecida como Neidinha Suruí, trabalha há mais de 40 anos em defesa dos direitos dos povos originários - BBC

A região foi reconhecida por decreto presidencial em 1991, mas a legislação não é acatada por integrantes do assentamento criado pelo Incra na mesma área.

Produtores rurais atuam na TI há mais de 40 anos sob a alegação de que a Terra Indígena foi demarcada com erros e contestam o direito da Funai sobre o território.

Para Neidinha, muitos dos homens que tentaram intimidar o grupo neste domingo são invasores de terras. Ela diz que um deles reconheceu que não possui título de propriedade emitido pelo Incra.

No Brasil, as ocorrências de invasões a terras indígenas bateram recorde segundo o relatório da CMI (Conselho Indigenista Missionário). Em 2021 foram 305 registros, o maior número em 20 anos.

O cacique do povo Tembé foi alvo de atentado e acabou baleado na cabeça no domingo (14). Lúcio Tembé é uma das principais lideranças do movimento indígena e foi internado em estado grave em um hospital na Grande Belém, segundo a Federação dos Povos Indígenas do Estado do Pará (Fepipa). Credito: Reproduçao GloboNews

Após o ocorrido, o grupo ameaçado em Rondônia registrou ocorrência na Polícia Federal.

A Folha não conseguiu contato com integrantes do cerco aos ativistas. Em nota, a a Polícia Federal afirmou que serão adotadas as medidas de polícia judiciária cabíveis e que o caso tramita sob sigilo.

Apesar do susto, Neidinha diz que não pretende parar a luta em defesa dos povos originários. "A gente está pedindo medida protetiva e que eles coloquem policiamento no posto da Funai, porque a situação dos indígenas que estão lá é de perigo. É urgente."

Também no Dia das Mães, mesma data da denúncia de intimidação em Rondônia, um líder do povo indígena Tembé, foi baleado na cabeça no município de Tomé-Açu, no Pará.

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